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- Desculpa...- Murmuro, levantando a minha cabeça do seu peito. Limpo as lágrimas que molhavam o meu rosto com as duas mãos e, nesse instante, encaro Samaris que desvia alguns fios de cabelo da minha face.

Não sabia o que dizer. Nunca deixei que as minhas fragilidades me fizessem perder o controlo. Até hoje. E logo com ele.

- Não tens de pedir desculpa... Luz, seja o que for que se esteja a passar, irá resolver-se. E apesar de não sermos os melhores amigos, podes contar comigo. Podes pedir-me ajuda.

Esboço um sorriso fraco ao ouvir as palavras do grego. Por incrível que pareça, eu não duvidava nem um bocadinho daquilo que o moreno dissera. Sentia uma segurança difícil de explicar ao tê-lo por perto.

Deixo escapar um suspiro e sento-me no relvado. O jogador repete o meu gesto, sentando-se ao meu lado. Ficamos em silêncio durante alguns instantes.

- Não precisas de ficar aqui...- Profiro, observando toda a extensão do campo de futebol.

- Há algo que me faz querer ficar.- Samaris responde, fazendo com que eu o encare. Os nossos olhares não descolavam um do outro. Tinha a estranha sensação de que havia como que uma ligação especial. Tão especial que eu própria tenho dificuldades em explicar.

- Normalmente, eu costumo afastar as pessoas... não fazer com que elas queiram ficar.

- Por incrível que pareça, eu quero ficar.- Deixo escapar um sorriso fraco com a sua afirmação.- Apesar de seres uma chata e uma arrogante, eu não te quero deixar sozinha.- Exibo um revirar de olhos e o grego emite uma gargalhada.

- Vejam só... o Samaris versão irritante voltou.- Respondo, num tom irónico, provocando um sorriso no jogador. Sorriso esse que, pela primeira vez, me deixou com um friozinho no estômago. O que é que se está a passar contigo, Luz?!

- Luz...- O seu tom de voz mostra-se apreensivo e eu praticamente prevejo qual o assunto que Samaris pretende começar.- O que é que foi aquilo de à pouco? Olhaste para o relógio e começaste a chorar...

- É complicado...- Murmuro. Volto a deixar de o encarar. Respiro fundo e tento conter as lágrimas que, novamente, já se começavam a formar. Inexplicavelmente, eu sentia-me confortável ao seu lado. Não tinha o medo que me acompanha  desde aquele dia.- Eu não era assim... não era uma pessoa fria, não me afastava de quem queria estar comigo... eu era tão feliz...- A cada palavra que proferia, vivia cada momento na minha memória e isso tornava tudo ainda mais doloroso.

- E o que é que te fez mudar?

- A vida. A merda da vida.- Respondo, deixando escapar uma fraca risada repleta de ironia.- Nós lutamos por aquilo que queremos... e, de um momento para o outro, tudo desaparece. E somos obrigados a começar de novo... qual é a lógica disso?

- Às vezes faz-nos bem começar de novo... os recomeços têm sempre algo de bom.

- E quando estamos sozinhos nesses recomeços? Achas que continuam a ter algo de bom?- O atleta benfiquista não responde, apenas me observa como se estivesse a tentar decifrar aquilo que eu tenho guardado, apenas através do olhar.- Nós vivemos constantemente iludidos, sabes? Não temos a mínima noção do que passa à nossa volta. Nem estamos minimamente preparados para o momento em que essa ilusão acaba. Eu só me pergunto é porque é que a vida, o destino ou Deus... seja lá o que for... porque é que me tiraram tudo tão cedo. Será que eu não tinha o direito de...- Antes de poder proferir o que quer que fosse, as emoções já tomavam conta de mim.

Sentia o coração tão apertado e tão angustiado. No entanto, eu sentia uma enorme vontade de falar. De expulsar um bocadinho desta revolta que tenho dentro de mim há tanto tempo.

- Tem calma...- Samaris profere, colocando a sua mão sobre a minha.- Não precisas de falar se não te sentires à vontade... chora, se for isso que te apetece. Chorar também faz bem. E eu fico ao teu lado.

- Obrigada.- Falo, no meio das muitas lágrimas que já abundavam no meu rosto. Respiro fundo e levo a mão ao colar que adorna o meu pescoço. O mesmo tem dois pendentes. Duas estrelas.- Lembras-te da fotografia que viste no meu telemóvel?- Samaris assente.- Aqueles bebés são os meus filhos. Eram os meus filhos.- Revelo, com uma voz frágil, devido ao facto de não ter a capacidade de parar de chorar.

O grego não proferia qualquer palavra. Apenas me ouvia. Evitava ao máximo este assunto até com os meus familiares mais próximos... mas com ele é diferente. Ele não dá palpites. Apenas está aqui. E eu sinto-me incrivelmente segura.

- Eram gémeos.- Afirmo, soltando um sorriso ao relembrar o quão bonitos eles eram.- O Rodrigo e o Miguel. Eram a minha vida. Foram a minha maior alegria. Eu vivia para eles... dava-lhes o mundo. E de repente, fico sem eles. De repente, os meus dois filhos morrem. Que merda de vida é esta? Bebés de nove meses a morrerem? Uma mãe nunca devia passar pela morte de um filho... não é suposto isso acontecer!

Inesperadamente, Samaris envolve-me no seu abraço, deixando um beijo nos meus cabelos logo de seguida. Chorei durante longos momentos. Ficamos abraçados, sem nada dizer. Eu apenas chorava e ele apenas recebia cada lágrima minha.

Afastamo-nos ligeiramente, apenas para nos olharmos. O grego tenta limpar as lágrimas que percorriam o meu rosto, num gesto que me transmitiu o carinho de que eu necessitava.

- Não consigo sequer imaginar o que é perder dois filhos...- O moreno começa por dizer, mostrando estar a pensar muito bem em cada palavra que irá dizer.- Mas não penses que o mundo está contra ti. Não acredites que o futuro apenas te reserva coisas más. Podes estar a sofrer como nunca imaginaste ser possível... mas acredita que, um dia, a vida te irá proporcionar a felicidade que mereces.

- Eu era feliz com os meus filhos... a partir do dia em que eles foram embora, eu soube que nunca mais iria ser feliz. A minha felicidade era ser mãe deles.

- E se eu te quiser provar o contrário? Deixa-me mostrar-te que ainda tens muito para viver... viver e não sobreviver. Deixa-me ajudar-te, Luz.

Rapidamente me afasto do jogador e levanto-me do relvado. Samaris repete o meu gesto, também de forma rápida, tentando perceber o porquê da minha atitude. A verdade é que eu não posso ser egoísta ao ponto de deixar que ele se envolva nesta história. E, sinceramente, acho que contar-lhe tudo isto... já foi demasiado.

E ainda tinha tanto para lhe dizer.

- Se eu o fizesse, estaria a impedir-te de viveres aquilo que de bom te espera. Não posso deixar que... te envolvas demasiado.

- Mas porquê? Eu apenas te quero mostrar que as coisas são muito fáceis se não estiveres sozinha.

- Porque tu não irias aguentar... ninguém aguenta. Agora tenta esquecer tudo isto... nunca te devia ter dito nada.- Estava prestes a virar costas, quando o atleta benfiquista agarra no meu pulso, puxando-me para junto dele.

O seu peito estava encostado ao meu e estávamos, de novo, a escassos milímetros de distância.

- Eu não sou como os outros. Não vou embora quando me dizes para o fazer.- Ele confessa, num tom de voz baixo, mas ao mesmo tempo, intenso.

- Os meus filhos morreram por causa do meu ex-marido.- Acabo por revelar numa voz frágil, fazendo o grego engolir em seco.- Não queiras fazer parte da minha vida. Por muito que eu precise de alguém ao meu lado... não te posso fazer isto.

Espero que tenham gostado!

E boom... 💥💥 finalmente, a Luz revelou todo (ou quase todo) o sofrimento que a acompanha todos os dias. Estará o Samaris preparado para tudo isto??

Até ao próximo capítulo!
Beijinhos ❤

(P.S.: E aquele jogo de nervos?? 😱)

Luz ||SAMARIS||Onde histórias criam vida. Descubra agora