Capítulo 22

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- E capriche na dose dos condimentos! - pediu, voltando-se para Chris. - Sempre vejo filmes com pessoas comprando cachorros-quentes em carrinhos nas ruas de Nova Ior... digo, Londres.

Londres? O homem do carrinho elevou uma sobrancelha, intrigado. Porém, ergueu os ombros com indiferença. Estava acostumado a atender a todo tipo de malucos, inclusive aqueles que ficavam fascinados com um simples cachorro-quente.

- E para você, amigo? - perguntou para Chris.

Chris respirou fundo. O aroma não o atraiu, mas ele ordenou um lanche apenas por cavalheirismo.

Ele fez menção de apanhar a carteira no bolso da calça, mas Dulce o impediu.

- O jantar é por minha conta - avisou, entregou uma nota ao vendedor, sem esperar pelo troco.

Dulce olhou ao redor à procura de algum lugar para se sentarem e avistou o banco de madeira defronte uma loja. Levou Chris para lá e se acomodou ao lado dele, salivando ante o prazer de saborear o cachorro-quente nova-iorquino.

Chris observou-a morder o pão com apetite e fechar os olhos, deliciada. O olhar passeou da boca para a garganta. A veia azulada sob a pele alva e acetinada capturou sua atenção. De repente, ele sentiu um inexplicável desejo de mordê-la bem ali.

- Você não vai comer?

A voz o distraiu. Chris levou alguns segundos para acalmar o desejo selvagem que brotara dentro dele e olhou para o sanduíche sem nenhum entusiasmo. Relutante, desembrulhou o lanche e inspecionou a salsicha antes de mordiscá-la sem vontade. Ele fez careta ao sentir o gosto rançoso e se forçou a engolir.

- Bom Deus! - gemeu, enojado. - Isso é repugnante!

Dulce riu e balançou a cabeça, divertida.

- Você nunca tinha comido um cachorro-quente?

- Não. E nunca mais comerei!

Ela riu mais alto. De repente, os olhos dela se arregalaram.

- Oh, não! Você não pode comer! Sebastian disse que é alérgico a todos os tipos de alimentos sólidos!

- Sim, eu me lembro de você ter dito. Não sei de onde meu irmão tirou tamanho absurdo! Seguramente, eu me lembraria se tivesse alergias. Acho que simplesmente não gosto de cachorro-quente.

Dulce assentiu e olhou para o lanche na mão de Chris com cobiça.

- Nesse caso, posso ficar com o seu?

- É claro!

Chris assistiu com um sorriso nos lábios enquanto ela devorava a comida. Ele ainda estava com fome, mas, definitivamente, recusava-se a engolir aquela porcaria.

Quando Dulce acabou de comer, levantou-se para jogar as embalagens no lixo. Ao voltar, sentiu a familiar onda de frio e a sensação opressora que a aterrorizara na noite anterior.

Ela apressou o passo e parou ao lado de Chris, tremendo dos pés à cabeça.

- Você está bem? - Chris pousou as mãos nos ombros dela. - Por Deus, está tremendo de frio! Vamos procurar algum lugar aquecido.

- Oh, não! Estou adorando o passeio.

- Tem certeza de que não está com frio?

- Sim. A caminhada vai nos aquecer.

- Para onde quer ir? - ele perguntou, olhando ao redor.

- Que tal o Central Park?

- Você quer dizer o Hyde Park? - Ele sorriu com indulgência. - Esqueceu-se de que não estamos na América?

O sorriso de Dulce se desmanchou. Por um momento, ela se esquecera da farsa.

- Não preocupe - ele disse com simpatia. - Você vai se adaptar à nova realidade mais depressa do que imagina.

Dulce ergueu uma sobrancelha, pensando para si que não era ela quem tinha de se adaptar...

Chris tomou a mão de Dulce enquanto caminhavam pela Quinta Avenida. Ela ponderou se estariam seguindo pela direção certa, mas deixou o pensamento de lado. O passo decidido proporcionou-lhe a certeza de que ele sabia exatamente para onde estavam indo.

Pararam no cruzamento enquanto esperavam que o farol abrisse, quando o aroma rico de café penetrou nas narinas de Dulce. Ela olhou ao redor, notando um simpático bistrô na esquina. Os freqüentadores conversavam animadamente, segurando copos fumegantes nas mãos.

- Oh, eu adoraria tomar chá! E você?

- Eu não tomo chá, mas posso acompanhá-la. Vai ser bom para aquecê-la.

Ela sorriu, enternecida por Chris se preocupar com seu bem-estar. Não estava acostumada que se preocupassem com ela.

O interior do café estava lotado, com pessoas ocupando o balcão e as cadeiras e sofás de veludo vermelho, enquanto saboreavam capuccinos aromáticos. Muitos liam ou usavam laptops, e a animação do ambiente combinada com o delicioso aroma de café estimulou Dulce.

- Fique aqui - Chris sugeriu, indicando uma cadeira vazia. - Vou pedir o chá para você.

Ela relanceou o olhar para a fila de clientes esperando para fazer o pedido, e decidiu que seria melhor sentar-se para esperar.

- Está bem. Quero um chá de camomila, extra grande.

Chris repetiu o pedido e se afastou. Ela sorriu enquanto o observava entrar na longa fila. Ocupou a confortável cadeira e olhou ao redor do agradável ambiente. Os freqüentadores eram exatamente como ela imaginava que os nova-iorquinos fossem: sofisticados, mesmo com roupas casuais, interessantes e cultos.

Dulce se sentiu embaraçada ao avaliar a calça jeans, o suéter modesto e o casaco folgado que usava. Era uma típica moradora do Maine. Porém, muito em breve, conseguiria emprego e promoveria uma verdadeira transformação na aparência. Aquele seria o marco para deixar definitivamente o passado para trás.

Seu olhar encontrou o de Chris novamente. Não havia dúvida de que ele era de longe o homem mais elegante de Nova Iorque... Talvez, do planeta, ela decidiu. Usava preto da cabeça aos pés, e a cor era perfeita para ele, realçando os olhos cor de âmbar e a pele alva.

Notou a mulher na frente dele na fila. Alta, com exóticos olhos escuros e cabelos longos. Ela não escondia o interesse, e se virou para encarar Chris abertamente. Por fim, conseguiu chamar a atenção dele. Abriu um sorriso e disse alguma coisa.

Dulce não pôde ver a reação dele por estar de costas. No entanto, um sentimento incômodo apertou seu ventre. Ciúme?

Ela não tinha o direito de sentir ciúme. Bem, havia dormido com ele, mas ter mulheres em sua cama devia ser um fato comum na vida de Chris. Na certa, ele não confundia, sexo com amor, como ela estava correndo o risco de fazer.

O sentimento incômodo aumentou quando a mulher riu de algum comentário de Chris, Dulce se afundou na cadeia, sentindo-se miserável ao se comparada com a exuberante morena. Avaliou-se novamente, cada vez mais deprimida. Como se o casaco fora de moda não fosse o bastante, havia uma mancha de mostarda destacando-se na lã verde.

Ela se levantou e olhou ao redor. Avistou um porta-guardanapo numa mesa próxima e, depois de esperar que um homem colocasse infinitos sachês de açúcar no café, alcançou-o e tentou limpar a mancha. O resultado foi pior do que ela esperava. A mancha se alastrou, e os pigmentos amarelados da mostarda penetraram ainda mais no tecido.

Com um suspiro desolado, ela se virou e soltou um gemido de desgosto quando viu que o homem com o café melado havia ocupado sua cadeira. Olhou para Chris, pensando se deveria se juntar a ele, e
quase gritou quando viu que ainda conversava com a morena.

Ele procurou-a no lugar em que a deixara. Quando viu o homem sentado na cadeira dela, ele avançou dois passos e perscrutou o ambiente. Os olhos dele se iluminaram quando localizou Dulce. Então, ele sorriu e voltou para seu lugar na fila.

O sorriso enlevado de Dulce deu lugar a um esgar de desapontamento. Mas, o que ela esperava? Que Chris gritasse para todos que era namorada dele? Que clamasse para o mundo todo ouvir que a amava?

Memórias De Um Vampiro - Adaptada - Vondy. Onde histórias criam vida. Descubra agora