Capítulo 37

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Vestiu-se e saiu do quarto. Quando chegou à sala de estar, caiu sobre os joelhos, incapaz de encontrar forças para caminhar até a poltrona.

Um pranto selvagem sacudiu seu corpo, e o sal das lágrimas se misturou com o mel do sangue de Dulce.

Ele era um monstro!

Christopher deu vazão ao pranto dolorido e se levantou, obrigando-se a reagir. O copo e o decantador de uísque estavam no mesmo lugar em que ele havia deixado. Serviu-se de uma dose generosa e bebeu num só trago. O líquido queimou a língua e a garganta, mas não removeu o sabor adocicado de Dulce.

Ele caiu pesadamente sobre a poltrona e perdeu o olhar nas cinzas da lareira.

Como pudera ser tão tolo? Fora estúpido e ingênuo por acreditar que poderia mudar o passado. Era impossível voltar a ser o homem que ele fora. Dois séculos de existência não foram suficientes para lhe ensinar que não havia volta?

Ele encheu o copo, dessa vez, tomando somente um longo gole antes de colocá-lo sobre a mesa.

O homem no beco... Christian! A morte de Lilah.

De repente, tudo ficou claro, como uma cortina que se desvendasse para mostrar cenas de horror. Em meio ao choque e ao terror, ele compreendeu por que queria esquecer.

Mas, acima do terror, uma dor lancinante rasgava seu peito. O punhal pontiagudo da culpa se cravou em seu coração.

Como pudera deixar que Dulce se envolvesse em sua loucura?

Christopher apoiou a cabeça no espaldar da poltrona e fechou os olhos.

Dulce. Sim, ele a deixara no hotel naquela noite. Sabia que tinha de se afastar.

Mesmo assim, no momento em que ela entrou naquele bar, desejara-a mais do que tudo.

Como ela havia voltado? Ainda não conseguia se lembrar. E por que havia ficado no apartamento? Quem o encontrara depois do ataque de Christian?

Christopher endireitou a coluna e abriu os olhos. Sebastian, é claro!

Christopher não teve dificuldade em encontrar o irmão mais novo. Agora, que sua memória estava completamente restaurada, sabia que tipo de clube Sebastian e ele possuíam. Estava longe de ser o ambiente recatado para cavalheiros da era vitoriana.

Encontrou Sebastian na pista de dança do Carfax Abbey, rodeado por vampiros e aspirantes a vampiro. Simplesmente parou diante dele, até que o irmão pressentiu sua presença.

- Christopher! - Sebastian espichou o pescoço e estreitou os olhos para se ajustar à luz de néon avermelhada. - O que está fazendo aqui? Você já... já...

- Sim. Estou de volta. Temos de conversar.

Sebastian assentiu e virou sobre o ombro para avisar as mortais e imortais que ele tinha de sair. Diversas mulheres gemeram de desapontamento.

No entanto, ele não perdeu tempo em consolá-las. Seguiu Christopher para a porta que levava ao corredor interno. Quando entraram no elevador, a caminho do andar do apartamento, Christopher finalmente o encarou.

- Há alguma razão plausível para você ter decidido não me contar que eu estava agindo como o maior idiota do planeta?

- Eu não diria idiota... Embora pedir que o cocheiro aprontasse a carruagem tenha sido um tanto aborrecido.

- Por que você não me impediu? Por que não me obrigou a ouvir a verdade?

- Você não teria ouvido. Queria esquecer, e achei melhor não forçar.

Christopher abriu a porta gradeada quando o elevador parou. Empurrou-a com mais força do que necessário, e o som metálico ecoou no corredor.

- Por quê? - insistiu enquanto caminhava, mal conseguindo conter a irritação. - Por que, quando a verdade surgiria de uma forma ou de outra?

- Por que você queria Dulce.

Christopher estacou de repente.

- O quê?

- Sim, é isso mesmo que você ouviu. É por isso que reprimiu o que você é. Se tivesse consciência da sua condição, não se permitiria ficar com Dulce.

Christopher abriu a boca para dizer alguma coisa, mas mudou de ideia. Sebastian não era particularmente sensível. Em geral, era autocentrado demais para isso. Mesmo assim, havia captado seus anseios mais profundos.

No entanto, a constatação de que seu irmão mais novo era algo mais do que um hedonista narcísico não o deixou feliz.

- Então, você a convenceu a ficar?

Sebastian confirmou com um sorriso divertido no rosto.

- Esse sou eu! Sempre pronto a ajudar. E o que você disse a ela?

- Bem, tive de usar um pequeno artifício. Contei que o médico da família aconselhou a supervisionar você o tempo todo, e que eu estava ocupado demais com a boate.

- E ela se ofereceu espontaneamente?

- Não foi bem assim...

- O que você fez, Sebastian? Usou outra mentira?

- Digamos que se aproximou mais de uma chantagem - ele admitiu com um sorriso conciliador. - Lembrei Dulce que você havia salvado a vida dela. Acho que só isso teria bastado, mas reforcei meu argumento oferecendo-lhe dinheiro.

Dinheiro? Christopher nunca havia pensado em Dulce como uma mulher oportunista.

- É claro, ela não aceitou - Sebastian o tranqüilizou. - Dulce alegou que se sentiria vulgar se pegasse o dinheiro. - Ele balançou a cabeça, ainda espantado com a integridade de Dulce. - Vocês dois realmente foram feitos um para outro.

Christopher ignorou o último comentário.

- Por que ela ficou, afinal?

- Por você. - Sebastian fez uma careta com expressão abobalhada. - Bem, e eu ofereci um trabalho legítimo na boate, como nossa administradora. Mas ela só aceitou porque está desesperada por um emprego, e era exatamente o que eu contava.

Dulce, trabalhar na boate? De jeito nenhum! Christopher agarrou a lapela do casaco de Sebastian e o empurrou contra a parede.

- Vou entender como um não - Sebastian disse, com respiração ofegante.

- Você tem alguma idéia do que fez? Do que eu fiz?

Sebastian balançou a cabeça com veemência e se desvencilhou das mãos.

- Sim. Dei-lhe a chance de estar com a mulher que você ama, porque você não podia fazer isso por si. E é assim que me agradece? - Ele apontou para a gola amassada do casaco e ergueu a sobrancelha.

- Eu não amo Dulce.




O CHRISTOPHER DESSE SÉCULO ESTÁ DE VOLTA!! ❤

Memórias De Um Vampiro - Adaptada - Vondy. Onde histórias criam vida. Descubra agora