Changkyun
A casa térrea acolhe uma dezena de pessoas vestidas de preto, todas em torno de uma mesa onde, certamente, está a caixa com as cinzas de Hyunwoo. Eu não preciso chegar muito perto para saber, os vizinhos estão murmurando orações e lamentando a perda de um rapaz tão novo e tão inteligente. Ele trabalhava no laboratório da área norte e todos acreditam que deveria ter tido uma vida longa e feliz como os outros funcionários especiais do governo. Eu também acredito nisso, até compreender o que ele fez.
Fico parado na calçada por um longo tempo, assistindo os pais de Hyunwoo chorando em desespero por causa do filho. "Ele não nos revelou a carta de intimação", ouço dizerem, "nos aguardou e nos deu a notícia hoje de manhã".
Tenho a súbita vontade de ficar e presenciar o enterro da caixa com as cinzas - que geralmente é feito no quintal das próprias casas -, mas não consigo controlar o que eu sinto. Tenho medo de estragar esse momento triste, mas precioso da família, então recuo.
Ando por vários minutos até chegar à praça que fica em frente ao prédio da área norte, no mesmo lugar onde acompanhei Minhyuk meses antes para me despedir. Paro na calçada, do outro lado da rua, fitando o grande edifício acinzentado, com seus andares arranhando a paisagem, o aspecto bruto ferindo o entorno. Uma das intervenções impactantes erguidas para tirar vidas com a desculpa de estar recuperando o planeta. Lá dentro, Hyunwoo fez algo. E me deixou para fora, como sempre quis que fosse.
Não sei por quanto tempo permaneço sendo assistido por pessoas que me julgam um estranho, ouvindo murmúrios que divagam sobre eu estar prestes a morrer ou não... Acham que eu fui intimado e que não tenho coragem de seguir em frente, para dentro do grande prédio, para o meu fim. Enganadas quanto à isso, ao menos elas estão certas sobre uma coisa: neste momento, eu devo ser o próximo a morrer. Mas eu sou um indefinido, aquele que tem de esperar. Aquele que se tirasse a própria vida, seria apenas mais um a poluir as mentes pacíficas que adornam os moradores de Soul.
Se eu tirasse minha própria vida, eu jamais saberia os motivos que levaram Hyunwoo a forjar a própria morte através do sistema. Se ele não usou da própria força, significa que encontrou algo positivo em suas pesquisas, do contrário, ele teria me dito. Ou pelo menos me guiado para fora do seu caminho.
Se aquele lugar sobre o qual ele tanto falou não fosse real, eu teria sido o primeiro a ler a sua carta de intimação.
-x-
Escurece. Tão próximo do meu prédio, escuto passos que parecem estar me seguindo. Algumas ruas antes, as pessoas ainda encontravam-se em números altos, barulhentas, mas naquele instante não há mais ninguém e eu consigo ouvir com mais clareza. Não olho para trás, apenas sigo em frente até adentrar o portão e então sou abordado por aquele cara.
É mais alto do que eu. Usa uma jaqueta preta e calças jeans rasgadas, embora faça frio. Não porta armas ou qualquer outro objeto, apenas me encara como se me analisasse. A princípio, acho que pode ser uma máquina, pois seus olhos se mexem de forma controlada, assim como suas mãos. Mas sua respiração está levemente alterada, resultado, talvez, do longo caminho percorrido ao me seguir.
Não preciso me preocupar em perguntar quem ele é. Sua voz grossa e um pouco rouca toma meus ouvidos antes que eu possa formular qualquer questão.
- Meu nome é Hoseok e eu sei o que o seu amigo fez.
-x-
Em minha cabeça não para de martelar o pensamento de que não foi uma boa ideia permitir que um estranho entrasse em meu apartamento. Ele não diz nada até ter observado com atenção toda a mobília e o modo como as janelas e demais portas estão fechadas. Não precisa tecer nenhum comentário sobre isso, pois o modo como parece estar desenhando tudo dentro de sua mente de repente começa a me assustar. As pessoas sabem que estão seguras com todas as regras e punições severas relacionadas a crimes, mas, ainda assim, não é recomendável que se dê corda à qualquer um. O que eu estou fazendo pode custar a minha vida de tempo indefinido, mas aquele é Hoseok e, se bem me lembro, Hyunwoo o mencionou como sendo o rapaz que pesquisou sobre todo o mistério em torno dos sacrifícios. Por essa razão, não é difícil começar a me acostumar com sua aparência e comportamento. De certo, trabalhar no laboratório ao mesmo tempo em que busca informações proibidas é de deixar qualquer humano estressado.
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FanfictionO seu diagnóstico pode ser indefinido ou você pode ser sentenciado. Se a carta de intimação te leva à morte, o que seria este lugar onde os sacrifícios permanecem vivos? Os testes decidiram que Minhyuk deveria ser executado. Hyunwoo, porém, descobr...