Parte 4-3 • Changkyun

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Changkyun

Ainda acho que Hyunwoo ficou maluco quando olho pela quarta vez para o espelho no banheiro. Eu tinha sentido tonturas ao acordar e precisei me esgueirar até ali com medo de que fosse atacado pela vontade de vomitar como nas manhãs anteriores. Fiquei parado perto da pia, cabeça abaixada, respiração controlada. Achei que se tomasse um banho me sentiria melhor e já estava me preparando para encarar a água fria do chuveiro improvisado quando vi o recado deixado por Hyunwoo.

Na minha pele.

Apenas ele teria a brilhante ideia de compor uma mensagem ao contrário para ser vista através do espelho e escreveria na pele sobre meu estômago, no intuito de que apenas eu pudesse visualizá-la. "Não tome nada que Hyungwon lhe deixou", parece um aviso. Parece perigoso.

Leio novamente e levo um susto quando escuto a voz de Minyuk chamar por meu nome. Respondo, dizendo que sairei em um minuto e trato de esfregar a tinta, deixando um pequeno borrão em minha pele. Jogo água no rosto e respiro fundo antes de abrir a porta e voltar ao quarto.

Minhyuk está sentado na ponta da cama, as mãos brincando com seu colar. Quando me vê, imediatamente pergunta se eu me sinto bem e minha resposta é positiva, apesar de não ser verdadeira. Seus olhos me acompanham enquanto eu me sento ao seu lado, mantendo certa distância. Nós já tínhamos conversado diversas vezes desde que eu o encontrei, mas é a primeira vez que estamos totalmente sozinhos no apartamento. De certo modo, eu me sinto um pouco mais corajoso e a vontade que tenho de desmentir Hyunwoo e despejar tudo o que está entalado em minha garganta sobre suas mentiras é realmente grande. Mas a mensagem que ele havia deixado ainda paira em minha mente e eu sei que devo levá-la a sério: apesar de tudo, Hyunwoo se importa e eu consigo sentir isso, exatamente como acontecia quando estávamos em Soul. Eu ainda confio nele.

- Hyungwon deixou alguns comprimidos para você - Minhyuk avisa e eu sorrio, agradecendo. Quero perguntar várias coisas para ele, mas sou interrompido pelo som emitido por minha barriga. - Eu preparei comida, quer que eu traga pra você?

- Não, quero sair um pouco do quarto - eu respondo e ele concorda, acompanhando-me até o corredor.

Nós vamos até a cozinha que não tem exatamente um bom cheiro, porque a comida disponível não é nem um pouco atrativa e o aroma se mistura ao cheiro dos remédios ministrados por Hyungwon na varanda e em seu laboratório. Mas qualquer odor é delicioso perto daquele que senti quando abri os olhos pela primeira vez em 20785. O corpo de Rainbow deve estar em uma condição terrível agora e tento me esquecer disso, embora seja difícil não relembrar. Minhyuk puxa uma cadeira para mim e, cuidadoso, serve-me um prato com alguma sopa esquisita. Serve a si mesmo também e o vejo dar uma colherada sem sequer fazer careta. Ao provar, percebo que apenas a aparência do alimento é ruim: o gosto é bom e, surpreso, agradeço mentalmente pelos enjoos estarem passando.

Resolvo perguntar a ele sobre Hyunwoo e Hyungwon e ele me diz que eles haviam saído há algumas horas.

- Talvez passem a noite fora, eu não sei - ele está visivelmente preocupada. - Ainda não entendi essa enorme curiosidade que Hyungwon tem com o corpo de uma máquina...

- Talvez porque não existam máquinas aqui? - eu sugiro e ele dá de ombros. - Hyungwon é muito inteligente, certo? Talvez seja por isso que ele queira sempre aprender sobre coisas novas...

- Soul é um assunto antigo, mas o desconhecido o deixa animado - ele diz e sopra a colher com um pouco de sopa antes de tomar o líquido. Seus cabelos bagunçados e o rosto com expressão sonolenta me fazem recordar nossas manhãs juntos... Eu o encaro por tempo demais, porque, de repente, ele ficou visivelmente embaraçado.

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