PRÓLOGO

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Eu fiz tudo certo. Durante minha vida inteira eu segui todos os caminhos que julguei serem corretos. Sempre fui um bom aluno, o melhor da classe até na faculdade. Praticava esportes, fui capitão do time de futebol durante todos os anos do ensino médio, dei o meu melhor para dar orgulho aos meus pais, até frequentava a igreja... talvez ai esteja o meu erro, todos os meus grandes feitos, os títulos e medalhas, foram por obrigações, por me sentir que era o mínimo que eu deveria fazer, não porque eu de fato gostava.
Menos a arte. Qualquer coisa que envolvia tinta, pincéis e uma tela em branco onde eu poderia deixar a minha alma ali, me deixava extremamente feliz... Deixava.
Minhas obras estavam começando a ser exibidas em grandes galerias de arte por todo país, eu estava ficando cada vez mais rico e famoso, meu nome circulava na boca dos maiores críticos e revistas... Eu fiz tudo certo!

Me lembro muito bem daquele dia. Eu estava atrasado para uma entrevista em uma rádio local, reflexo por ter passado a noite passada inteira comemorando em um pub, com pessoas que diziam ser meus amigos. Sempre gostei de velocidade, mas nunca pensei que ela teria acabado com a minha vida.
O sinal estava amarelo! Era a porra de um amarelo! Eu nunca podia imaginar que um outro infeliz como eu vinha na direção oposta, também em alta velocidade. O carro capotou, duas, três, quatro vezes. Perdi os sentidos antes mesmo dele chegar ao chão. A última coisa que eu lembro de ter visto foi o céu azul rodando em frente aos meus olhos.
Chegava a ser engraçado o fato do outro motorista ter saído apenas com uma perna quebrada e alguns arranhões. Já eu? Ah...

A sensação de ficar em coma por 1 mês não era tão estranho quanto parecia, arrisco dizer que foi meu melhor sono durante anos. Mas diferente das outras vezes, eu não consegui enxergar o céu azul quando acordei. Eu podia jurar que abri os olhos, mas tudo continuou... vazio. Como continua até hoje.
Passo a maior parte do meu dia em uma cadeira de rodas, não perdi o movimento de nenhum membro, mas fiquei tanto tempo parado que meu cérebro deu algum tipo de pane no sistema, o que dificulta a movimentação. A fisioterapia está me ajudando nisso. Agora a minha visão... eu provavelmente nunca mais a terei de volta. A pancada que levei foi tão forte que fez com que alguma coisa se descolasse lá dentro, eu sei lá. Parei de prestar atenção no que o médico dizia depois de ter dito que eu estava cego por um tempo indeterminado.

Vinte e quatro anos jogados no lixo. As pessoas diziam que eu estar vivo era um milagre, mas eu preferia ter morrido do que continuar o resto da minha vida preso nessa caixa preta.

Behind Blue Eyes || BeauanyOnde histórias criam vida. Descubra agora