Fiquei sem saber o que fazer. Não acho que Ray foi para o baile sem mim, considerando que ele nem queria ir. Então será que ele desistiu? Fui até a sala de convivência na esperança de que ele estivesse lá. Mas não. Também estava vazia. As luzes mal estavam acessas. Sentei num sofá, constrangida com isso. Não acredito que depois de tudo, Sam apareceu mais um vez e estragou tudo. Ou pelo menos, eu deixei ele estragar tudo. E o pior, eu não estava muito arrependida disso.
-Hyiana? - Ouvi a voz vindo de fora. A porta que dava para o jardim se abriu, e Ray surgiu terminando um cigarro. Ele parecia triste. Estava em blazer vinho, com a calça e a camisa - incluindo a gravata- pretas. Permaneceu em pé do lado de fora. Eu senti um alívio absurdo, mas também senti muita vergonha. Levantei e fui em sua direção me jogando em seus braços. Ele me segurou pra que eu não caísse e eu comecei a chorar. - O que aconteceu? - ele segurou meu rosto e limpou minhas lágrimas tentando não borrar minha maquiagem.
-Me desculpa. - eu cuspi as palavras ainda chorando e tentando não me desesperar mais. Ele não perguntou porque. Eu acho que Ray sabia que não queria saber. Sua expressão ficou um pouco mais triste, mas ele continuava me segurando firme. Eu não soltei ele até parar de soluçar e as lágrimas cessarem dos meus olhos.
-Eu quero saber o que aconteceu? - ele perguntou me levando até uma poltrona grande. Se sentou e me pôs no seu colo.
-Foi o Sam. - eu falei mas sem olhar diretamente pra ele. - Eu acho que eu e ele tínhamos alguma coisa. Eu não sei o que isso quer dizer.
-Isso era esperado. - Ray falou e ficou em silêncio um tempo.
-Ele me beijou. - eu falei depois de alguns segundos. - Ele disse que queria se lembrar como era, mas que eu tinha que esquecer isso. - Ray me olhou, mas não parecia irritado nem surpreso. - Eu não me lembro dele. Mas me lembro de algo relacionado a tudo isso. Eu só não sei o que.
-Entendi. - ele disse e suspirou. - Mas você deixou. - O tom que ele usou não foi acusativo; foi mais como se ele tivesse apenas confirmado pra si mesmo.
-Foi porque eu achei que isso ajudaria. Porque parece que alguma coisa dentro de mim reconhece ele, mas não a eu de agora. Entende?
-Eu esperava que uma hora ele fosse fazer isso, já que ele se aproxima de você pelas sombras. Mas pelo que você diz, ele nem poderia ter feito isso. - ele acariciou minhas mãos. - Eu não sei o que pensar.
Ray levantou me deixando sentada. Pegou mais um cigarro e foi até a porta. Eu o segui. Parei e encarei ele. Tentei ponderar. Eu não sei o que quero fazer. Eu quero me lembrar, mas tenho medo que com minhas lembranças venham os sentimentos e que eu passe a sentir algo por Sam enquanto estou com Ray. Só que agora eu quero estar bem aqui. A Hyiana de agora, quer ficar com o Ray. Como explicar isso? E como explicar que sempre vai ter uma parte de mim que sente algo por outra pessoa?
-Ray. - Eu falei e encostei a mão do braço dele. Senti o tecido macio nos meus dedos. O vento soprava forte e eu comecei a ficar com frio nos braços descobertos. Eu me sentia mais calma, mas não menos desamparada. - Por favor. Acredite em mim.
- O que? - ele perguntou voltando os olhos verdes na minha direção. Brilhavam mesmo em meio a desilusão. Minha garganta queimava, eu me sentia nervosa. Eu queria explodir e sentia que realmente poderia, a qualquer momento.
-Eu... Quero ficar com você. Eu realmente gosto de você. - Eu suspirei, peguei um ar. Percebi que ele parecia um pouco surpreso agora. - Eu sei que tudo é muito confuso, mas a eu de agora acredita que você é o ideal pra mim. Eu te juro que no atual momento, é a pura verdade.
-Hy... - Ele soltou seu cigarro e se enlaçou em mim. Não tive mais um segundo antes dos meus pulmões se encherem com seu ar. Foi um beijo apaixonado, cheio de ternura. Ele me acariciava e me acalmava com seu corpo inteiro. Nós estamos com mais tecido que o de costume, mas isso não impediu uma troca de calor muito satisfatória. Depois de mais alguns minutos só abraçados um no outro, ele levantou o rosto. - Eu acho que vamos conversar e resolver isso depois. Você só vai decidir tudo quando puder se lembrar de verdade. - Mal sabe ele que isso é o que mais temo. - Mas você acha que ainda dá tempo de irmos ao baile?
-Sim. - eu sorri. Ray pegou minha mão e fomos andando até a rua na frente do dormitório, lá tinha um carro esportivo, na cor grafite estacionado. - Isso é seu, é? Que presentinho bom que seu pai te dá hein?
-As vezes ele me mima um pouco, mas não muito. - Ele abriu a porta pra mim depois se acomodou no lado do motorista. Ligou o carro e assim, partimos em direção a festa. Fomos conversando e ele me contou que Layla foi o Cam. Michelle e Red também estavam em casal, mas que ele mal sabia de Ales.
-Ah, que bom que eles foram juntos. - eu falei me lembrando da conversa que tive com Red por telefone no dia anterior. Resolvi ligar pra ele e perguntar porque ele não convidava Michelle pro baile, e mesmo sendo bem encima, ele acabou fazendo. - Tive que argumentar um pouco com ele o que porque uma amiga de tempo, pode ser uma boa companhia.
-Ah, então você teve um dedo nisso né? - ele riu.- Não imaginava das suas capacidades de cupido.
-Algumas pessoas sensatas podem sair ganhando se me escutarem. Não é o caso de Layla.
-Eu só espero que aqueles dois não arranjem problemas hoje, porque Kaji vai estar lá de novo.
- Nossa, ainda tem isso. - Eu falei escorregando no banco um pouco.
-Ah não, mas hoje você não vai ter tempo de se ocupar com mais ninguém além de mim, tá legal? - Ray sorriu olhando de relance para mim enquanto pegava uma estrada que subia a costa de um morro.
Avistei de longe um salão de festas imponente. Era um casarão antigo na beira de um lago que estava muito bem iluminado, e mesmo de longe eu via a fila de carros estacionados na estrada. Já tinha muita gente na frente e dava pra ver que dentro tinha luzes e música. Para o lado do lago, a festa se estendia pelo gramado, com várias varandas abertas pra dentro, onde tinham mesas e sofás, seguidas de escadas que chegavam na grama e na água. Obviamente, Ray tinha uma vaga esperando por ele e depois de estacionarmos o carro, ele puxou uma mascara do porta luvas.
-Pra que isso? - perguntei assutada.
-Eles avisaram hoje cedo que resolveram fazer um baile de máscaras. - Ele amarrou a sua que combinava com as cores da roupa. - Não ficou sabendo né? - ele olhou pra mim com os olhos verdes sobressaltados nos tons escuros da máscara. - Tá tudo bem, eles vão distribuir. Fora que duvido todo mundo ficar com isso por muito tempo. - Ray terminou se aproximando de mim e me dando mais um beijo antes de descermos do carro e seguirmos em direção a entrada.
Logo de cara, Iukk me aguardava, e Putt Spears parecia inquieta do seu lado. Ele em um terno claro e de máscara branca, e ela em um vestido carmesim e detalhes dourados na máscara.
- Você ficou como imaginei nesse vestido. - ele falou me abraçando calorosamente. Apesar de não termos conversado direito desde a ultima discussão que tivemos, eu sinto falta de passar um tempo com ele e no fundo sei que posso confiar. - Eu trouxe isso, já que fiquei sabendo da mudança. - Ele me mostrou uma mascara que possuía as mesmas escamas do meu vestido e me ajudou a amarra-la sem desfazer meu cabelo.
-Obrigada. - eu falei pensando no quanto queria contar pra ele sobre Sam, mas achei melhor, pelo menos por hoje, deixar as coisas fluírem em paz. Percebi que Putt conversava com Ray, mas não parecia tensa ou irritada. Acho que essa instabilidade seja algo natural pra uma mulher que vive tentando evitar a corte e agora está num lugar cheio deles. Posso dizer o mesmo de mim. - -- Estou nervosa.
-Só não chamar atenção. - Putt se aproximou com o filho. - Por favor, vocês dois. - ela falou pausadamente alternando o olhar. - Não se metam em nenhuma confusão.
-Já foi o suficiente vocês dois irem atrás dela. - Iukk completou indicando a própria Putt pra mim. Nesse momento, Sam apareceu atrás de nós, também de mascara. Ele e mais alguns soldados da corte passaram, todos vestidos iguais, em direção a entrada. Na verdade eu só o reconheci porque ele olhou fixamente pra mim e percebi seus olhos azuis, que se não fosse por isso, ele passaria despercebido, já que a máscara de todos eles, cobrem boa parte do rosto. Não sei se mais alguém o notou ali. - Mantenham distância principalmente deles. Eu ficarei aqui até vocês irem embora, de olho em tudo. - Nos mantemos em silêncio mas sei que Ray levaria isso a sério. Por fim, demos as mãos e seguimos pra entrar na festa e encontrar outras pessoas.
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Sunshine
Adventure"O que você faria se acordasse em um lugar que não tem ideia de onde é? E se você só se lembrasse do seu nome? Isso foi o que aconteceu comigo. Acordei um dia e nada tinha lugar. Eu não sabia quanto tempo fiquei apagada, mas me disseram ser anos. E...