[02 DE ABRIL DE 2019]
Uma vez terminada sua apresentação à turma, Max caminhou para uma carteira vazia atrás de mim — a última da minha fileira. Quando senti seu cheiro limpo passando pelo meu nariz no instante em que ele andou ao meu lado, meu coração palpitou forte o bastante para que os pelos dos meus braços acordassem. Eu não entendo... Mesmo estando gradativamente feliz, eu não entendo.
— C-Como... Como você se tornou real? — perguntei muito baixinho, ignorando as múltiplas visões que pairavam sobre nós dois. Na verdade, "nós dois" era um termo muito injusto para ser utilizado, eu constatei, pois, embora eu pudesse ver os jovens da sala pelo canto do olho esquerdo, vi que todo mundo olhava somente para o garoto surrealmente belo que acabou de entrar na sala.
Com um quê suave de confusão, as sobrancelhas de Max se uniram. Era difícil digerir a informação de que passei somente seis dias longe dele e, ainda assim, me abalava o fato de que ele era deslumbrante.
— Perdão? — murmurou, a atenção em mim.
Eu parei no tempo ao ouvir a única palavra — até mesmo o tom em que ele utilizou para anunciá-la indicou claramente um mau entendimento. Por que ele está agindo como se eu fosse um estranho?
— Real... — experimentei a palavra de novo, mas, temendo por tanta coisa fora do meu alcance, cancelei o término da frase. Max ainda me olhava com aquela expressão confusa, e, por conta disso, busquei um caminho diferente daquele que eu pretendia. — Espera... Você sabe quem eu sou?
Se por um lado eu estava grato pelo professor ter decidido conversar com alguns alunos a respeito do conteúdo que eles tiveram na aula anterior — o que, em outras palavras, indicava que eu teria alguns minutos com Max —, por outro eu não estava gostando muito do início da minha conversa com ele. Já era choque demais ter Max aqui, vivo, notável. Qualquer outra coisa acrescentada a isso facilmente me deixaria louco.
Com aquele seu maravilhoso sorriso torto efetuado com uma lentidão perfeitamente sincronizada com o tempo, Max lamentou-se:
— Não.
O quê?
Eu tive a mesma reação pasma de quando ele entrou na sala, todavia, divergindo-se do momento em que eu o vi passar pelos meus olhos, agora eu o examinava de forma incompreensível e triste — esta última feição ofuscava a primeira. Mas, mesmo assim, eu não conseguia descrever mentalmente o que eu estava sentindo nesse instante por saber que ele, de algum modo, não me conhecia. Porque todos os nossos afetos estavam soando como inexistentes agora: tudo o que tivemos parecia ter sido evaporado com a declaração.
Para ser franco comigo mesmo, nunca achei que um dia eu fosse rever Max em algum lugar que não fosse Mato Grosso. Mas, se por um milagre isso viesse a acontecer — bem como estava acontecendo agora —, jamais pensaria que ele fosse retornar sem se lembrar de mim. Com isso, pude perceber o quão complicado era de entender nossa relação; tudo que nos envolvia parecia ser complexo demais a ponto de me deixar fatigado.
— Eu deveria saber quem você é? — Max tentou, havendo um esforço evidente em sua face para tentar me compreender.
Balancei a cabeça, corando, e me recompus. A sensação foi a mesma de tropeçar na rua movimentada e levar uma queda inesperada.
Eu, claro, não poderia sequer cogitar falar a verdade para Max — de que ele foi uma ilusão da minha mente em Mato Grosso, ou seja, nunca existiu, e que nos apaixonamos lá. Ele discaria o número da primeira clínica psiquiátrica se eu trilhasse esse caminho. Então eu menti.
— Não. — Baixei minha visão para seu peitoral e encarei a coruja presa na corrente em seu pescoço com um aperto enorme no coração. Todas as memórias queimaram no meu cérebro. — Não deveria.
Eu não dei motivos para que ele me achasse estranho — se é que ele já não me achava. Eu apenas me ajeitei na cadeira, tendo total controle sobre as lágrimas que gritavam nas minhas pálpebras, e encarei meu caderno fechado para evitar ser visto pelos alunos. Como se já não bastasse passar pelo que passei em Horizonte D'Oeste, minha mente começou a arquitetar aquele fluxo crescente de quem não entendia nada do que estava acontecendo.
Olhei para frente e franzi o semblante enquanto pensava.
Ele agora está vivo..., assimilei para mim mesmo. Mais infeliz ainda, acrescentei: ... sem saber quem eu sou.
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CONTE-ME MAIS UMA VEZ
RomanceMais surreal do que ter um namorado imaginário é descobrir que ele, na verdade, existe. Após passar por essa situação, Tales Johnson precisa descobrir como reconquistar a pessoa que um dia já amou - Max - e que agora nem sabe quem ele é. Por medo de...