CAPÍTULO QUATRO

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ELAIN DONOVAN

Uma semana depois, estou na arena atrás quartel. "Arena" é uma descrição generosa, porque o local se trata de uma parte do gramado onde a terra foi batida em um circulo deformado e os soldados arrastaram bancos e engradados velhos para se sentar e assistir as lutas.

Os combates não fazem parte do treinamento formal, mas a violência gratuita é uma das poucas formas de entretenimento entre os soldados e o Chefe da Guarda não implica por isso.

Andrew e James estão na arena, o primeiro com um corte nos lábios e no alto da maçã do rosto. O segundo rindo como uma criança com doces. Ambos estão armados apenas com os punhos, que estão erguidos. Não há uma regra para o uso ou desuso de armas, restando aos lutadores entrarem em acordo.

A plateia solta um urro quando James derruba Andrew no chão e a pancadaria de verdade começa. Demora alguns minutos para que os soldados percebam que Andrew não vai conseguir reagir e se unem para tirar um James muito relutante de cima de seu corpo. Com o resultado mais que obvio, James se joga no banco de madeira mais próximo, esperando que alguém o desafie. Não acontece, é claro. Não quando ele está com uma sede de sangue tão visível.

Poucos murmúrios preenchem o silêncio do entardecer, os homens se olhando e perguntando se haverá outra luta.

Geralmente não me sinto confortável no meio deles, mas a arena é o um dos poucos momentos que a violência os atrai mais que a minha presença. Antes de James chegar no regimento, eu costumava lutar. O assédio não era menor, mas com certeza era menos descarado. James parece o tipo de presença que encoraja o pior nas pessoas.

Caminho por entre os soldados, torcendo o nariz por causa do odor do gim aguado que servem no quartel. Meus olhos percorrem o local, minhas mãos não conseguem ficar paradas.

Alguma coisa parece prestes a acontecer e eu espero. Detesto a sensação e detesto como o dia está se encerrando calmamente.

Os homens estão se dispersando, parecendo desapontados com o fim do evento. Por alguma razão, também estou desapontada. Olho ao redor. Nada aconteceu. Caminho um pouco e meus pés tocam a borda da arena.

— Eu quero lutar. – Alguém diz isso com a minha voz. Sou eu.

Ergo os olhos, surpresa, o coração agitado. Todos se voltam para o campo, parando sua caminhada de volta aos alojamentos.

— Vai me desafiar hoje, gatinha? – A voz de James me causa asco, mas eu o encaro. Sua sobrancelha está erguida, deformando seu rosto hediondo.

— Eu a desafio! – É o grito de Haddon. Ele se aproxima com passos rápidos, me olhando com algo próximo de irritação.

— Eu acho que a garota quer a mim hoje, camarada. – James se levanta e caminha até a arena. Seus olhos estão chispados com humor.

— Você já teve sua luta hoje. Deixe alguns de nós se divertirem. — Haddon cruza os braços e se coloca entre James e eu.

— É verdade, cara. Estamos cansados de ver só você no ringue todas as noites. – Jeb fomenta a defesa do companheiro. Fico confusa, mas o sentimento se vai rapidamente. Sei o que eles estão fazendo, quem eles estão tentando proteger.

— Haddon... – Começo, mas sou interrompida pela voz do asno.

— Se é uma luta que você quer, então quem sou eu para impedir? – Ele sorri e eu sinto meu estômago se revirar. — Cuidado com o rosto, gatinha. Não queremos que nada aconteça, certo?

Ele cospe e vai se sentar de novo.

— O que pensa que está fazendo? – Pergunto enquanto ele tira a casaca e entra na arena.

— Lutando. Não era isso que você queria? – Seu rosto está sério e eu não consigo sondar suas emoções. Haddon nunca dava pistas do que estava pensando.

Estou com raiva, então retiro a casaca e entro também. Olho ao redor, todos os soldados se acomodando, preparados para assistir mais uma luta. Haddon pega duas espadas na lateral da arena e estende uma para mim.

— Vamos usar as mãos. – É o que eu digo.

— Eu quero espadas.

— Mãos. – Praticamente rosno a palavra. — Ou eu vou ser obrigada a aceitar o desafio de James.

Haddon dá de ombros e vai deixar as armas. Ele volta e ergue os punhos em uma pose defensiva, dançando na ponta dos pés. Faço o mesmo, mas me preparo para atacar, pois sei que ele não o fará.

Meu golpe é amortecido pelo seu antebraço, mas eu não paro. Soco, soco, chute. Tudo o que ele faz é se defender. Eu estou com tanta raiva que não paro. Continuo usando-o como escape. Não tenho mais o sentimento de que algo vai acontecer.

Eu estou acontecendo.

— Revide! – Eu grito, sem me importar com a plateia. ­— Lute, seu imbecil!

Haddon mantém a guarda e continua dançando. Ele deve achar que eu sou uma piada. Saio da posição de luta e empurro seus ombros.

— Você acha que vai conseguir me humilhar? Você não me conhece. Vai ficar parado aí enquanto eu me exibo? Para me proteger? – Digo num tom para que só ele escute. Meu companheiro demonstra surpresa por um instante e eu aproveito o desvio e acerto um soco em seu olho direito.

Os nós da minha mão latejam, mas vejo Haddon cambalear como uma recompensa. Não perco tempo e continuo acertando golpes e mais golpes. A arena não é lugar para regras de cavalheiros.

— Você. Não. Deve. Me. Proteger. – Cada palavra arranca uma arfada de dor.

Haddon está no chão, como Andrew esteve antes. Eu estou por cima, acertando seu rosto várias vezes, como James também estava.

Quando os homens vêm me tirar, encaro James. Ele sorri com perversidade, como se fizéssemos parte da mesma teia de maldade.

Quero vomitar.

Acima da FraquezaOnde histórias criam vida. Descubra agora