C. 17 - °Sincero°

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As sequências de pesadelos se seguiram ao longo da noite. Quando fechava os olhos sentia o peso do sono me dominando. Não conseguia, ainda que a sonolência fosse forte, sendo interrompidos por pensamentos ou sonhos — não acredito que dormia em poucos segundos e voltava — estranhos e assustadores. Em todos eles Lorenzo estava envolvido, ou morto ou atirando no meu coração ou arrancando ele mesmo com as mãos.

Decidi lutar indo orar na varanda do meu quarto. Cada célula do corpo denunciava que havia algo errado, que o que estava por vim não seria nada perto do que eu vivi algum dia.

A agonia dentro do peito esmoreceu a cada lágrima que escorreu até o chão diante da presença do Senhor. Ele estava comigo, envolvendo seus braços ao redor de mim.

Estive cercada por tragédias, primeiro meus pais biológicos, depois o sequestro do qual não recordo, agora essa sensação desesperadora.

Sentia todos os membros do corpo em pequenos solavancos em meio ao soluço. Uma mão repouso sobre meu coração, eu podia sentir, chorando ainda mais. Dessa vez era diferente, a dor morreu e uma paz inexplicável preencheu todo vazio que restou após o temor ter ido embora.

As bochechas se esticaram para ambos os lados, deixando visíveis meus dentes alinhados em um sorriso perfeito. Levantei do chão e ainda faltava alguns minutos antes dele chegar. Me belisquei certificando de que não estava sonhando de novo.

— Aí! — É, não era um sonho.

[...]

Diferente de ontem, Lorenzo não está um trapo velho. A calça jeans preta, e a blusa comprida verde estão perfeitamente adequadas em seu corpo. Os cabelos levemente bagunçados, como se com o pente ele tivesse tido a preocupação de deixar assim.

Nos seus olhos carregava um vazio tão grande capaz de fazer qualquer pessoa sentir compaixão por sua dor.

Ele caminhou até mim a passos calmos. Envolveu seus braços ao redor do meu pequeno corpo, com uma intimidade que me fez pensar que fazíamos isso durante anos.

— Cadê o seu pijama de algum vídeo game...

— Haha, oi, Lorenzo — disse a ele ao dar um passo de distância.

— Sério, estou acostumado com aqueles pijamas. — A todo custo tentou mostrar está bem humorado, mas seus olhos não o deixavam mentir.

— Precisamos conversar, não podemos perder tempo. Tive pesadelos à noite todo com você — confessei e ele que seguia atrás de mim, parou. — Anda, Lorenzo, vamos! — reclamei. Suspirou voltando a andar.

— Você não merece nada disso. Não quero te causar perturbação nem em seus sonhos — declarou. Pareceu sincero, busquei novamente a parte racional para não acreditar cem por cento nisso.

— Tarde de mais, meu caro. — Permanecemos em silêncio até chegar ao terraço. Agitado é a palavra que define Lorenzo. Olho para ele e parece que não está sentindo nada, mas consigo decifrar. Ótimo, muito clichê para a vida real.

Ficamos lado a lado olhando o céu mudando de cor. Seus olhos estavam brilhando ao voltar o rosto ao meu. Os brilhos eram lágrimas, lágrimas que foram como agulhas dentro dos meus.

— Eu não sou quem você pensa que sou. Nem o que você pensa sobre mim. Sei que não confiou ou acreditou em nada que eu disse desde que me conheceu. Estava certa em fazer isso. Completamente certa. — Meu coração rodou em todas as partes do meu corpo e depois voltou ao lugar. Não disse nada e esperei que continuasse.

Amanhecer 🥀Onde histórias criam vida. Descubra agora