Acordei escutando um certo barulho persistente. Me levantei devagarinho e percebi que Gizelly dormia do meu lado, no chão da sala. Reconheci o toque e notei que era o meu celular. Me levantei devagar e encontrei o aparelho jogado por baixo do sofá, olhei o visor e senti culpa. Era o Fábio. Pensei em não atender, mas provavelmente ele iria ligar novamente até conseguir me fazer atender. A casa da Gizelly tinha uma área no fundo, peguei o celular e andei até lá.
- Alô. – atendi, percebi que ainda era bem cedo, 06h:50 marcava o relógio.
- Oi, amor. – ele respondeu, com um ânimo da voz. – Tive alguns problemas por aqui, vou ter que voltar. Te mandei uma mensagem mais cedo, mas eu imaginei que você não ia ver. Estou chegando em mais ou menos uma hora, ok? Desculpa te acordar, mas estou morrendo de saudades. – falou, carinhoso.
- Ah... Sim, ok. Estou te esperando. – respondi.
- Tô morrendo de saudade, sério. – riu. – Até daqui a pouco, meu bem. Vou voltar para a estrada.
- Te amo, cuidado. – respondi, desligando o telefone.
Certo, ele chegaria em uma hora. Eu precisava ir embora, mas não queria acordar Gizelly. Voltei pra sala e percebi que ela dormia tranquilamente, com um semblante tão leve. Eu definitivamente não iria acordá-la. Coloquei minha roupa rapidamente, chamei um uber e deixei um bilhete escrito perto da sua estante de livros:
"Obrigada pela noite maravilhosa. O jantar, a companhia....
Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura.
- Marcela."
Eu sabia que ela reconheceria aquela frase. E, principalmente, entenderia a mensagem. Fechei a porta e entrei no meu uber. Fiquei durante todo o percurso pensando no que faria. Era nítido que eu estava gostando dela e que o sentimento era recíproco. Só que essa situação não era justa comigo e com ela, muito menos com o Fábio. Eu nunca havia traído nenhum homem com quem me relacionei, nem as mulheres com quem eu tinha me relacionado também. Isso era errado, eu me sentia culpada. Faltavam 4 meses para o meu casamento, ainda tinha a minha família no meio disso tudo. Jogar tudo para o alto para viver uma loucura, uma aventura... Seria isso justo? Eu não poderia me arriscar, arriscar o lugar que eu ocupava naquele hospital. Eu tinha uma vida montada, planejada, um emprego perfeito e provavelmente teria o casamento perfeito. O Fábio tinha defeitos, claro. Só que eu não poderia deixá-lo assim, eu o amava... amava? Eu já não sabia mais. Eu sei que eu não poderia jogar tudo assim. Eu precisava me afastar dela. Eu não poderia me entregar.
Cheguei em casa em menos de 40 minutos, ainda bem. Tomei um banho rápido e coloquei uma roupa leve. Decidi comer uma fruta e aguardar a chegada do meu noivo. Meu coração acelerou quando olhei a mensagem que acabava de chegar no meu celular:
"A gente só sabe bem aquilo que não entende!"
Era ela. Gizelly. Ela tinha entendido a referência direta que eu fiz à Guimarães Rosa. Ela amava literatura e essa era a única obra que eu conhecia. Eu sabia que ela entenderia. Sorri com a frase. Realmente, nesse momento eu não entendia. Só que o meu coração continuava me dizendo que era ela. Que eu precisava dela. Eu só saí dos meus devaneios quando escutei a porta abrir.
- Oi, meu amor. – Fábio falou, entrando. – Pensei que tinha voltado a dormir.
- Não, tomei um banho pra te esperar. – falei, me levantando e abraçando meu noivo.
- Eu estava morrendo de saudades, sabia? – ele disse, segurando minha cintura.
- Eu também. – falei, lhe dando um beijo.

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RomanceDoutora Marcela Mc Gowan diante do seu novo desafio profissional: orientar e ajudar novos médicos. Será que ela vai conseguir? E se o destino resolver apresentar os detalhes que até então eram imperceptíveis para Marcela? Os detalhes...