PONTE AÉREA

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O grito esbaforido de Regina devido a queda da colher cheia de alimento no chão causou um susto no filho e na nora que aguardavam ansiosamente para que ela respondesse a pergunta que lhe foi feita. Regiane deixou a cadeira para pegar um pano qualquer que estava na pia e ajudar a sogra enquanto João mantinha uma feição de estranhamento pelo ato porquê embora a mãe carregasse a aura do desastre por todo lugar que passava, era difícil compreender que aquele nervosismo após a pergunta não era sinônimo de culpa, ou algo mais.

Regiane e Regina juntaram a pouca comida e a colher de pau que caíram fazendo sujeira no chão e lavaram as mãos, a sogra precisou de um copo de água e viu na taça de vinho uma saída mais prática para abandonar a tensão que fez morada em seu corpo como uma possessão durante uma sessão espírita.

— Eu sabia que a senhora era desastrada, mas não sabia que era tanto. - João disse após se servir e provar o vinho.

— Que isso, sogra, até eu me assustei. - Regiane disse após secar as mãos para depois de se sentar no lugar que anteriormente ocupava.

— Quem vê até pensa que tem haver com a pergunta que eu fiz. - João brincou com as sobrancelhas e cutucou a esposa com o cotovelo para que ela entrasse na brincadeira.

— Ele tem razão, dona Regina. Seu desastre de agora tem haver com a pergunta?

Regina revirou os olhos com tanta força que mais um pouco ficaria cega ou quem sabe seus olhos saltassem e orbitariam seu rosto. Segurou o pano de prato que estava em seu ombro e jogou na cara do filho mais novo.

— Você me irrita igual seu pai me irritava, sabia? - o rapaz riu. — E não, não tem haver com a sua pergunta indelicada, João Ricardo.

— Ah, é? Então tem haver com o que? Se eu me lembro bem teve um vídeo de vocês na semana passada que viralizou... onde vocês estavam?

— Em Ilhabela. - Regiane e João fizeram uma cara que dizia "hum, o que mais?" o que fez Regina ter vontade de jogar algo mais em cima dos dois. — E não, não houve nada demais. Nos encontramos lá por acaso até. - se lembrou de ter acordado com a mão dele sobre a sua e alisou a nuca tentando eliminar a tensão.

— E aquele clima todo pela chamada de vídeo hoje?

Regina se lembrou do beijo trocado no camarim e fechou os olhos tentando eliminar o pensamento impuro enquanto colocava a comida já pronta na bandeja de vidro.

— Que clima, João Ricardo?

— Coé, mãe! Todo mundo percebeu.

— Percebeu o que?

— A cara que o Fafá fez pra você, oras. Aquele clima todo...

— Qu-qu-qu-que clima? Você precisa ir ao oculista porquê está vendo o que não existe. - Segurou a bandeja de vidro com as duas mãos.

— Agora vamos deixar esse assunto desagradável de lado e vamos comer antes que esfrie.

Regina saiu da cozinha o mais rápido que conseguiu sobre o olhar de João e Regiane que se olharam e ergueram os ombros com a constatação de que havia muito mais assuntos e acontecimentos que eles ainda não estavam sabendo.

***

São Paulo, 21/07/2017 - Sexta Feira.

Regina correu o máximo que pode naquele dia, as gravações da novela a ocuparam até o fim da tarde o que apenas possibilitou que a atriz fizesse a ponte aérea Rio/São Paulo depois das dezoito horas e foi no tempo que esteve sentada na ala executiva do avião que ela pode respirar em paz e tentar pensar com clareza no rumo que a sua vida estava tomando nos últimos meses, principalmente, na última semana.

Teu corpo é meu textoOnde histórias criam vida. Descubra agora