Não acredito que estou aqui de novo, depois de tudo o que eu fiz por ele. Esse não era o nosso combinado, eu fiquei aquele tempo mas poderia sair se fizesse o que ele mandasse e ficasse a prontidão em relação a comida e higiene. Eu odeio ele mais do que qualquer coisa. Quanto mais eu penso no que eu passei mais a raiva me consome. Não pensava em nada e nem em ninguém, só em um jeito de dar fim aquele horror.
Mas eu precisava me acalmar, meu corpo estava quente e conseguia ver meu reflexo contorcido de raiva e angústia.
O menino estava apavorado também, fui um pouco grosseira reconheço, mas preciso ficar um pouco sozinha. Pelo menos por enquanto.
Os minutos foram passando e meu corpo foi relaxando, pensei em tudo de bom que já me aconteceu, lembrei das melhores coisas da vida real que tive antes disso e meus sinais vitais pareciam estar normalizados.
Levantei e sentei ao lado dele.
- Me desculpa - falo com a cabeça baixa.
- Por que? - ele diz confuso
- Me desculpa por ser grossa daquele jeito, eu só estava de cabeça quente.
- Ei está tudo bem, eu entendo que você passou por muita coisa okay? Não fica assim.
- Eu sei, mas não justifica, você sempre foi muito amável comigo, não merece ser desrespeitado dessa maneira.
- Vamos esquecer isso, agora precisamos nos concentrar em como vamos viver aqui, sem comida ou água - seu corpo estremece por inteiro
- Como assim?
- Essa caixa ou seja lá o que é isso não tem nem porta, ou seja, a gente vai morrer - suas feições me fazem dar boas gargalhadas
- Ele traz comida e água sim, bobo.
- Como?
- Você vai ver quando ele trouxer.
Ficamos ali parados por um tempo conversando e rindo
As horas foram se passando e provavelmente o dia escurecia. Estávamos deitados papeando sobre a vida e tentando não lembrar do horror que nos cercava. Os sons que antes podiam se ouvir vindo da madeira velha não eram mais perceptíveis, o rosto oval e barbudo já não nos transmitia tanto medo.
Ele descia as escadas meio desajeitado, mexia em alguns papéis, nos observava e depois desaparecia deixando questões sem respostas.
Dessa vez não era como antes. Ele conversava comigo na época em que estive aqui. Perguntava muita coisa e eu apenas respondia por medo.
- A propósito eu ainda não sei seu nome - falo enquanto me aprofundo em seus olhos azuis.
- Meu nome é Noen - ele diz envergonhado.
- Bonito.. o nome.
- Muito Obrigado, Alice - não olhava em meus olhos mas era visível o sorriso em seus lábios.
- Verdade, você já sabe o meu.
- Por que você deixa ele ter tanto poder sobre você?
- É difícil de explicar - as lembranças do passado me fazem suspirar cabisbaixa.
- Se você tentar me contar, quem sabe eu possa ajudar.
- Ele, de certa forma, é meu padrasto. - digo relutantemente.
Noen fica em choque, a boca entreaberta e os olhos esbugalhados me fazem repensar e arrependo-me imediatamente por contar o tal fato.
- Como?
- Bom, minha mãe namorou com ele por um bom tempo e ele se tornou meu padrasto.
- Isso eu entendi, mas então você sabe o nome dele e o conhece um pouco pelo menos. - ele diz intrigado.
- Na verdade não, quando ele esteve com a minha mãe, usava um nome diferente e trocou os documentos depois que viemos pra cá. Só sei disso porque enquanto arrumava uma gaveta da cozinha achei 6 identidades diferentes dele e quando o confrontei ele me explicou tudo.
- Eu não entendo o porque ele fez isso.
- Até hoje eu também não entendo. Não entendo as perguntas que ele fazia, as coisas que me mandava fazer. É como se eu fosse um jogo e o objetivo é abrir novas fases. Ele nos desafia.
- Ele vai fazer isso de novo?
- Acho que já está fazendo, talvez ficarmos juntos aqui, termos que nos conhecer e aprender a viver de forma drástica com os recursos que temos pode ser um desafio. Você não acha?
- Talvez sim.
Fiquei pensando sobre isso, se os dias forem assim talvez não seja o bicho de sete cabeças que eu pensava que seria. Mas se não for e ele implantar novas teorias malucas na nossa cabeça eu já espero o pior. Eu aguentei e fui forte a primeira vez, mas não sei se vou aguentar agora, não sei se Noen aguentará.
A pressão psicológica que alguém impõem em nós é significativa, pode mudar o mundo de qualquer um.
Estava cansada, minha cabeça rodava e queria uma cama quente e confortável pra dormir, infelizmente a realidade era outra.
Apenas o colchão fino e branco aos meus pés era o que me restava, me deitei sentindo o chão gelado e rezei para o sono me alcançar rapidamente.
Noen dormia tranquilamente enquanto minha mente pensava em tudo e todos.
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Rua Jardim de Monet
Misteri / ThrillerNa rua Jardim de Monet tudo parecia ser calmo, era como se tudo acontecesse em perfeita sintonia. Apesar da calmaria, no fim da rua em uma casa simples, um psiquiatra, que não aparentava ter boas intenções era motivo de desconfiança entre os vizinh...