The Truth Untold

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"Eu não posso mostrar a parte quebrada de mim
Então eu visto essa máscara outra vez e vou te encontrar"

JIMIN

Dançando eu sou livre.
Todas as amarras que prendem Park Jimin somem quando meu corpo se mexe conforme a música. Eu me torno finalmente eu. Não existem fantasmas do passado, traumas familiares ou inseguranças que me façam criar máscaras para sobreviver. Dançando eu estou só, ainda que alguém me acompanhe.
Vestir-se de si mesmo é muito mais difícil que criar personagens. É necessário conhecer e mostrar suas vulnerabilidades. E eu sou cheio delas.
Dançando eu me tornava mais vulnerável, mas mais parecido comigo mesmo, o que de certo modo me deixava mais forte. Pode não fazer sentido algum, mas é como me sinto.
Com esse pensamento em mente, aceitei a ideia de me apresentar no Grass Flower Arboretum. Não mentiria dizendo que este não era o principal motivo de minhas insônias, mas eu estava convencido de que me faria bem. Uma pequena vitória para Park Jimin.
As últimas semanas foram marcadas por treino pesado e, agora, finalmente teríamos tempo livre para ver nossos amigos. Hoseok hyung, Hyejin noona e eu estávamos a caminho do Dionysus, onde encontraríamos os outros.
— Você faz de propósito, Jimin — Hyejin noona acusou — Você flerta com ela sem intenção nenhuma de ficar.
— EU? Não, eu só a ajudei com a bolsa pesada.
— E depois conversou olhando em seus olhos, ouviu todas as histórias sobre a família dela, sorriu para ela durante o ensaio... — Hyejin enumerava com os dedos.
— E isso é flertar? — levantei a sobrancelha. Hoseok hyung riu alto ao seu lado.
— Tá vendo? — ela me apontou para Hoseok hyung— Por isso toda garota e todo garoto daquele lugar é gamado nele! E ele ainda se faz de sonso!
— Jiminie não é besta, é claro que ele sabe que é carismático e usa isso...
— Ser carismático ou gentil é bem diferente de querer dormir alguém, infelizmente as pessoas confundem — eu dei os ombros.
Hoseok hyung concordou com um menear de cabeça, ele também passava por isso.
— Então você realmente não quer ficar com ela? — Hyejin sondou pela décima vez naquele dia.
— Não, não quero. Ela é legal e tudo mais, mas não a vejo dessa forma. E também depois do que aconteceu com a Jeongyeon, eu não quero me relacionar com mais ninguém da companhia...
— Ah sim, você faz bem — hyung concordou.
— Ela ainda fala em você, sabia? Mas está brava...
— É, eu sei. Ela é uma garota incrível, espero que encontre alguém a sua altura — disse um pouco desconfortável.
Jeongyeon e eu não tivemos nada muito sério, saímos algumas vezes e foi bem divertido. Acho que teria evoluído, se eu tivesse permitido, mas eu não sou terreno seguro para envolvimento emocional. Existe muito sobre mim que eu ainda não entendo, trazer Jeongyeon para a minha bagunça me pareceu muito irresponsável. Justo quando ela pareceu mais feliz com os nossos encontros, eu disse que deveríamos nos afastar. E, bom, ela não reagiu bem. Eu não a culpo, eu só gostaria que Jeongyeon entendesse que o problema estava em mim, mas esse clichê "o problema sou eu e não você" é uma desculpa batida.
Quando chegamos ao Dionysus, o bar começava a encher. Comprimentamos Yoongi e Hyun-min no balcão e subimos para a mesa de sempre.
Dionysus era como a Bangtan Room da vida adulta, a antiga sala-de-aula-que-virou-depósito onde nos encontrávamos no tempo de escola. Como hyung, Sora e Hyun-Min trabalhavam aqui, conhecíamos todos os funcionários.
A segunda mesa do canto direito, manchada de vinho desde que Namjoon hyung derrubou há quase um ano, pichada "Jimin é um idiota" por Taehyung em vários lugares diferentes, decorada por um adesivo de iluminação de trânsito roubado por Yoongi hyung, era a nossa mesa. Tinha até nosso nome nela.
Os frequentadores mais antigos sabiam disso e até a evitavam.
Sentados na nossa mesa estavam Taehyung, Taeyeon noona e três figuras, que reconheci como o ex-namorado de Taeyeon e seus amigos. Eu revirei os olhos para Hoseok hyung.
— Hoje vai ser interessante — ele disse.
Taehyung me recebeu com um sorriso largo e um abraço meloso, que eu correspondi com entusiasmo, afinal os ensaios tinham me privado de ver meu melhor amigo por um tempo. Taeyeon noona nos cumprimentou animada, Baekhyun acenou ao seu lado e seus amigos, Chanyeol e Jongin, repetiram o aceno.
— Quanto tempo, Jimin — Jongin falou recostado na cadeira, seus olhos me medindo com interesse e, ao mesmo tempo, com certa arrogância.
Em suas roupas caras, relógios milionários, rosto e corpo perfeitos, Jongin acreditava que o mundo girava em suas mãos. E girava, infelizmente. Kim Jongin tinha o que queria, era herdeiro de uma fortuna milionária, assim como seus melhores amigos.
O que pessoas como essas faziam num lugar como o Dionysus? Bom, eles gostavam disso. Era muito comum ver playboyzinhos universitários como eles fazendo arruaça nesses cantos da cidade.
Rico acha descolado fazer cosplay de pobre.
Minha família não era pobre, também nunca foi rica, mas certamente tive privilégios durante a infância que alguém como Hoseok hyung não teve crescendo num orfanato. Por isso, me irritava muito alguém agir como se fosse melhor só por ter mais dinheiro.
— Realmente, Jongin — eu respondi mecanicamente.
Taehyung não gostava de Baekhyun, o clima na mesa não era dos melhores. Apesar do esforço de Hoseok e de Taeyeon em integrarem os dois grupos, existia tensão no ar. Senti uma onda de alívio ao ver Jin, Namjoon, uma garota e Jungkook subindo as escadas.
A expressão de Jin hyung mudou completamente ao olhar para a mesa, ele também não gostava de Baekhyun. A noite prometia ser desconfortável.
Namjoon nos apresentou sua amiga Jangmi e cumprimentou Baekhyun e os amigos com educação. Seokjin repetiu o gesto sem muito entusiasmo.
Jungkook, por outro lado, estava muito animado. A presença de pessoas estranhas e o clima pesado da mesa não o impediram de tagarelar sobre a experiência que tinha tido naquela tarde cantando com uma desconhecida. Considerando a timidez habitual de Jungkook, foi engraçado vê-lo agir assim.
— Depois noona me pagou um café. Ela é bem legal, quer morar numa ecovila em...
— Numa o quê? — Taehyung interrompeu, confuso.
— Uma ecovila é um local... — Namjoon hyung surgiu com uma explicação técnica que eu não prestei atenção, apesar do interesse, porque um par de olhos me examinava do outro lado da mesa. Era Jongin.
Nenhum deles ouvia Jungkook. Chanyeol mexia no celular entediado, Baekhyun chamava a atenção de Taeyeon para si próprio o tempo todo e Jongin me encarava sem pudor algum.
Tentei me manter focado no episódio que Jungkook contava, que agora havia se transformado em uma discussão sobre as plantações de Okinawa, mas era impossível.
Eu senti minhas bochechas esquentarem, eu não estava fazendo nada de errado, mas, de repente, estava envergonhado. Jongin faz tudo parecer excessivamente sexual, seu olhar parece despir as pessoas. Era como se eu estivesse sendo cúmplice de uma depravação e todos na mesa estivessem vendo, mesmo que ninguém prestasse atenção.
Quando nossos olhares se encontraram, ele sorriu, completamente consciente de meu desconforto. Eu senti um arrepio estranho percorrer meu corpo, como um choque a baixos volts. À contragosto, ele me atraia.
Na mesa, uma frase me chamou atenção.
— Eu saí com uma garota esses dias — disse Seokjin.
— Ohhh, Jin hyung! — Namjoon brincou.
Todos olhavam Jin com expectativa, Taeyeon se esforçava para prestar atenção apesar de ter Baekhyun pendurado em seu pescoço de forma possessiva.
— Aconteceu de um jeito engraçado. Nós trabalhamos na mesma rua, sempre nos cruzamos no horário do almoço, mas nunca tínhamos nos falado, até que ela deixou cair uma agenda...
— Em que dorama você viu isso, hyung? — Hoseok interrompeu Seokjin.
— Ah, é romântico, Jin — Taeyeon falou, enquanto Baekhyun beijava incessantemente seu maxilar — Baek, para, por favor.
Após uma troca de olhares constrangedora entre os presentes, Jin hyung pigarreou e continuou o relato.
— Daí, eu a encontrei no dia seguinte e disse que havia ficado com agenda, que poderíamos marcar um café para eu devolver, ela topou e no dia seguinte nos encontramos. — as orelhas de hyung começavam a ficar vermelhas com toda a atenção que estava recebendo — Acontece que eu esqueci a agenda, mas nós conversamos bastante mesmo assim. Ela é bem legal, bem bonita também, acho que vamos nos ver de novo.
— Esqueceu a agenda de propósito, não é? Boa jogada, hyung — Hoseok falou rindo.
— Lógico que não!
— Ah, hyung, por favor...
— Jangmi, como você pode ver Jin hyung é um galã experiente, a cara de ator de dorama não engana... — Namjoon fazia questão de explicar cada detalhe à amiga, que participava passivamente da conversa.
Seokjin revirou os olhos.
— Fazer o que se eu sou bonito? — ele brincou, mas suas orelhas vermelhas não escondiam o embaraço.
— No ensino médio tinha aquela garota que o Jin hyung ficou... — Taehyung lembrou — A que fechou a lanchonete pra ele, lembram?
— Ah não... — Seokjin reclamou.
— Puts, essa história é ótima! Jangmi, imagina que um dia eu e hyung fomos almoçar e...
Namjoon continuou a história animado, auxiliado por Jungkook e Taehyung que aumentavam ou distorciam os fatos da história provocando Jin e arrancando risadas de todos na mesa. Eu me distraí com a conversa, só quando Yoongi hyung ocupou a cadeira de Jongin que notei sua ausência.
Hyun-min também se juntou a nós logo depois. O clima pesado do início da noite se dissipou, em poucas horas a mesa estava cheia de copos e garrafas vazias, todos riam e falavam alto.
Sora noona era nossa garçonete,por isso não perdíamos a oportunidade de começar uma algazarra desnecessária todas às vezes que ela aparecia.
— PUTA QUE PARIU! É a mulher da minha vida — eu gritei ao vê-la subir as escadas com a garrafa de tequila que Seokjin hyung pediu.
— Será que eu tô num museu, porque é essa mulher é uma OBRA DE ARTE — Hyejin noona balançava o copo semi cheio, visivelmente alterada.
— LINDAAA — Tae gritou.
— Cala a boca, porra — noona falava entre os dentes, Yoongi hyung gargalhava assistindo a cena.
— LINDA! LINDA! LINDA! — Tae levantou puxando um coro numa dança desajeitada. E todos o acompanharam.
Taehyung a puxou para o centro da roda fazendo noona gargalhar.
— E o Parabéns? — gritou Namjoon hyung.
— PARABÉNS PRA VOCÊEEEE — um coro completamente desorganizado começou.
— Vocês são loucos, eu preciso trabalhar!!!
A verdade é que todo mês alguém fazia aniversário na nossa mesa.
Taeyeon noona olhava a cena com carinho, enquanto Baekhyun parecia entediado e desconfortável.
Seokjin hyung serviu nossos copos com a tequila e brindamos à noite mais uma vez.
Algumas doses depois, eu deixei a mesa bagunçada para ir ao banheiro. Desci com cuidado as escadas que separavam a área das mesas da pista de dança.
Uma pequena multidão se aglomerava em frente da a mesa do DJ, as caixas de som tocavam o mesmo reggeaton pela terceira vez e as pessoas ainda dançavam entusiasmadas. Apesar de toda a tequila no sangue, meus olhos varreram a multidão clinicamente e não demoraram para achar Hoseok e Hyejin encostados na parede, colados num beijo quase obsceno, balançando no ritmo da música.
Era esperado.
Eu mesmo incentivei hyung a tomar iniciativa, já que ele não dava sinais de que faria isso mesmo que deixasse óbvio o quanto gostava dela.
No entanto, algo se mexeu no fundo do meu estômago me deixando enjoado, como se aquela mistura de suor, mãos e língua me fosse particularmente ofensiva. Acelerei o passo até o banheiro do outro lado do salão, esbarrando em algumas pessoas no caminho, tentando ignorar o nó que se formava em minha garganta.
O banheiro apertado e escuro tinha todas as cabines ocupadas, o que me obrigou a encarar meu reflexo no espelho sujo, um Park Jimin visivelmente bêbado tentando segurar o vômito me encarava de volta.
— Jimin-ah! — o reflexo de Jong-in sorriu para mim no espelho.
— Ah, você...— respondi decepcionado — Achei que tivesse ido embora.
— Tá muito cedo ainda — ele disse colando os lábios em minha orelha — A noite só começou.
Meu reflexo exibiu uma careta.
— Sério, esse tipo de cantada não vai... — disse desviando de seu toque.
Suas mãos me empurraram contra a parede pichada.
— Qual é, Jimin — ele disse, pressionando seu corpo contra o meu — Acha que eu não percebo como você me olha?
Seu toque brusco despertou minha mente da névoa do álcool, então pude vê-lo de verdade. Jongin era alto e se colocava em cima de mim de modo ameaçador. Seu sorriso obsceno tinha um brilho quase lunático, suas pupilas enormes brilhavam e ele fungava repetidamente.
Cocaína.
Eu tentei empurrá-lo, mas seu peso se forçava contra o meu.
Suas mãos desceram até minha cintura, meu corpo contraiu ao seu toque. Eu o desejava quase na mesma medida em que o temia.
Engoli seco, quando senti seus lábios se aproximarem de minha orelha outra vez. De repente, eu não era mais Park Jimin adulto e alcoolizado preso na parede por um homem drogado e extremamente bonito, era Park Jimin criança que sentia a espinha gelar com o toque estranho.
No fundo da memória infantil, quase irreal, uma imagem sem foco se montava. Um homem sem rosto me tocava. Minhas mãos suaram frio e o coração pareceu querer sair do peito.
Sua língua tocou meu lóbulo suavemente e eu tremi de desespero.
— Promete pra mim que quando sair do armário, eu serei o primeiro a te comer. — Meu coração deu um salto. Ele sussurrou: — Eu vou te foder tão gostoso, amor.
Sua voz arrastada, cheia de malícia, me despertou do transe. Como um choque cardiogênico, eu voltei à realidade.
— Não fode, Jongin — eu o empurrei com força, seu corpo se chocou contra a pia e ele riu pateticamente — Eu até poderia me atrair por você, mas você é nojento. Nunca mais encoste em mim outra vez — Minha voz desceu três tons, fazendo ele parar de rir para me olhar.
— Amooor... — ele chamou com a voz arrastada, quando dei as costas para ele.
A multidão agora balançava ao som de um EDM enjoado. Rostos, corpos, cheiro forte de álcool e a música repetitiva embrulharam meu estômago outra vez. Eu queria sumir. Atravessei o salão a passos largos, sem me importar muito com as pessoas que cruzavam meu caminho.
Até que finalmente avistei o rosto que eu procurava, Taehyung.
Antes que eu dissesse qualquer coisa, Taehyung me atropelou com palavras.
— JIMIN-AH , onde você estava? Yoongi hyung socou um cara, o cara quebrou a garrafa nele e Jungkook o nocauteou com UM ÚNICO soco e-
— Quê? — eu perguntei sem realmente querer entender aquela merda toda, Taehyung se preparava para começar a história outra vez, até que parou subitamente.
— O que houve? — Tentei imaginar qual era o meu estado para que Taehyung me encarasse daquele jeito.
— Nada. — Ele deitou a cabeça, como um cachorrinho confuso — Quer dizer, eu explico no caminho. Vamos sair daqui, Taehyung. Yoongi hyung vai sobreviver?
— Vai... Foi um corte superficial. Ele foi expulso do bar, quer dizer, talvez ele até tenha sido demitido. Eu estava indo até lá quando você apareceu.
— Quem está com ele?
— Jungkook e Seokjin hyung. Namjoon hyung foi pedir um uber para Jangmi.
— Ele vai ficar bem... — eu disse tentando me convencer — Por favor, vamos sair daqui, Taehyung-ah.
Em qualquer situação normal, eu ficaria com Yoongi hyung, tentaria entender a situação, socaria o cara que Jungkook nocauteou outra vez, se preciso. Eu não deixava meus amigos sozinhos. Taehyung sabia disso, por isso não questionou quando pedi para ir embora.
— Hoseok hyung? — eu perguntei entredentes quando chegamos á porta do local.
— Não sei, acho que Namjoon hyung o avisou, talvez estejam juntos.
Eu assenti em resposta, me perguntando quando aquela noite tinha passado de constrangedora para divertida até chegar no fracasso completo.

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