Lie

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AVISO
Este capítulo contém alusão à violência sexual. Caso não se sinta confortável, recomendo que pule o capítulo, ou pelo menos evite o segundo bloco, marcado por *** no início e no fim.


"Encontre o eu que costumava ser puro"

JIMIN

Eu havia rompido em lágrimas no meio da aula de educação física, eu não movi um músculo quando um garoto duas vezes mais alto que eu jogou uma bola com violência desnecessária em minha direção. "Professor, ele está fazendo outra vez." alguém falou. O professor tomou meus pulsos nas mãos, sentiu meus batimentos acelerados e a tremedeira de meus braços. Alarmado, ele me tentou me levar à enfermaria, mas eu convulsionei antes de sair da quadra.
Mamãe veio me buscar pouco tempo depois disso. Ela passou muito tempo trancada com a enfermeira e a diretora dentro de uma sala que eu não podia entrar. Então eu esperei sentado na maca da enfermaria, que tinha um cheiro familiar de álcool e gaze, chupando o pirulito que a enfermeira havia me dado.
Quando finalmente mamãe deixou a sala, ela me olhou como se eu tivesse quebrado algum móvel outra vez. A diretora sorriu amavelmente e afagou meu cabelo.
— Até mais, Jimin — ela disse, mas eu não a vi outra vez.
Já em casa, eu podia ouvir meus pais discutindo minha situação outra vez, como se eu não estivesse no cômodo ao lado. Papai dizia que minha mãe deveria escolher entre continuar o tratamento no hospital ou me transferir para uma escola particular, os dois não era possível. Mamãe dizia que ele era um encostado egoísta que deixava tudo nas costas dela, fazendo parecer que ela não se importava com a saúde do "menino". Papai disse que então ela podia fazer o que quisesse. Ela disse que ele era inútil, por isso o "garoto" era fraco desse jeito, se ao menos ele conversasse com o "menino" e lhe ensinasse a ser um homem...
Papai deve ter se sentido desafiado, pois irrompeu em meu quarto como um trovão, fazendo com que eu descolasse a orelha da parede assustado. Ele curvou-se sobre mim, apertando meus ombros com firmeza e olhando dentro de meus olhos.
— Jimin — eu me encolhi ao som do meu próprio nome — Olhe para mim — Eu olhava meus pés descalços.
— Olhe para mim. — Ele apertou meus braços um pouco mais, eu ergui os olhos já cheios de lágrimas para olhá-lo.
— Sem chorar. Olhe para mim SEM chorar. — Eu pisquei libertando as lágrimas e prendendo a respiração. Suas mãos apertavam meus ombros com ainda mais força.
— O que aconteceu naquele parque? — Ele perguntou. Eu sentia os olhos de minha mãe nas minhas costas, ela estava parada na porta do meu quarto em silêncio.
Minha respiração acelerou, eu sentia que ia chorar de novo, mas não podia. Os dedos de papai pareciam entrar nas minhas omoplatas.
— Eu estou falando com você.
Eu estava tremendo como na quadra da escola, tinha medo do que papai faria comigo se eu chorasse.
— RESPONDA — ele gritou e chacoalhou meus ombros trêmulos.
— E-eu... E-eu... Tá doendo — eu falei, já chorando.
— Você vai falar. Se não falar por bem, vai falar por mal. O tanto de hospital caro que você já passou, garoto, pra ficar com essa FRESCURA.
Ele sentou na cama e me puxou para o seu colo, pela primeira vez eu ofereci resistência, gritei, me debati e tentei escapar.
— Mãaaaaae — eu gritei em puro terror, ela não se moveu.
Meu pai me alcançou pela barra da camiseta, puxou com violência me fazendo deitar sobre suas pernas, quando ele puxou minhas calças para baixo, eu vomitei. Papai me soltou do jeito que eu estava, sacudindo o líquido escuro das mãos, ele gritou algo para minha mãe que eu não ouvi. Eu me encolhi na cama, inexpressivo, já não tinha vontade de chorar, mas meu corpo todo tremia.
Eu fiquei ali na mesma posição pelo o que me pareceram horas, enquanto eles discutiam outra vez. Eu já não ouvia. Mais tarde, minha mãe entrou no quarto, torcendo o nariz para poça de vômito no chão.
— Coloca logo essa roupa, escova os dentes e vai dormir — Lentamente, eu vesti minhas calças e segui até o banheiro, quando voltei o chão do quarto estava limpo.
No dia seguinte, outra terapeuta me aguardava na sala de casa. Depois de me assistir montar quebra-cabeças e pedir para eu desenhar coisas variadas, ela tentou conversar comigo. Ela era bem legal, mas eu não disse nada.
Ela me visitava todos os dias, durante um tempo eu não fui à escola. Ela dizia sempre que eu podia dizer qualquer coisa, ela não contaria nada a meus pais. Um dia ela me perguntou se meu pai já havia me batido, eu disse que não, mas contei o episódio do vômito, ela ouviu calmamente e fez algumas anotações.
— Jimin, você se lembra do que aconteceu no parque?
— Não — eu menti calmamente porque não tinha medo dela.
Na semana seguinte, meus pais me levaram a um hospital psiquiátrico sob recomendação da terapeuta. Eu conversei com um time de médicos, que me fizeram inúmeras perguntas. Um deles repetiu a pergunta que a terapeuta havia feito, eu respondi apenas que não, meu pai nunca havia me batido. Ele assentiu, mas chamou meus pais mesmo assim, repreendendo-os na minha frente. Acho que a moça mentiu quando disse que não contaria nada que eu dissesse para os meus pais.
Deste dia em diante, meu pai nunca mais encostou em mim.

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