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Charlotte batia o pé no chão de forma ansiosa, olhava para todos os lados à procura de alguém que a tivesse vindo buscar. Havia acabado de chegar ao aeroporto de Swellview, era quase natal e queria chegar logo em casa para se preparar para a ceia que a família de Henry fazia todos os anos, tinha combinado em avisar assim que chegasse e ir direto para sua casa, mas seus grandes amigos a convenceram de que alguém iria buscá-la e esse era o motivo de sua crescente irritação. Deveria ter desconfiado de que iriam esquecê-la, sabia que não poderia contar com eles para assuntos tão simples como uma ida ao aeroporto.

Inspirou profundamente e pegou a alça de sua mala de rodinhas, levantou o queixo e se pôs a caminhar em direção à saída para procurar um táxi ou chamar algum carro. Vislumbrou famílias se abraçando, casais em uma clara saudade e crianças fazendo birra. Imaginou que a casa de seu amigo deveria estar uma loucura àquela hora e mal podia esperar para começar a comemorar com todos. Jasper havia vindo duas semanas antes junto com Piper e Henry tinha chegado no dia anterior. Só faltava ela para completar o grupo, como haviam lhe dito durante todo o dia, mas pelo visto não era uma falta tão grande assim já que ninguém tinha tido a disposição de ir pegá-la!

Afastou a irritação novamente e quando percebeu já estava na entrada do aeroporto, ia ser tão difícil encontrar um táxi por conta das inúmeras pessoas que preenchiam todo o local. Jogou a cabeça para trás em frustração e caminhou para se apoiar na parede enquanto ligava seu celular. Não poderia falar com seus pais, pois nenhum deles estava em casa e até pensou em ligar para algum de seus amigos, mas quem queria enganar? Estava completamente irritada com eles. E se um deles aparecesse à sua frente ela iria esgana-lo.

- Char?

E pelo visto seria o mais burro.

- Oh, olha quem lembrou da minha existência. - comentou sarcástica ao levantar a cabeça e dar de cara com um Henry envergonhado. - Me poupe. - o cortou antes dele começar suas explicações. - Estou exausta, me sentindo suja e faminta, tudo o que eu mais quero nesse momento é a minha cama.

Seu tom deixou mais do que claro que ele não deveria tentar convencê-la do contrário. Henry somente assentiu em silêncio e se prontificou a pegar a mala dela. Ainda sem conseguir encara-la, o Hart liderou o caminho em direção ao seu carro, abriu a porta do passageiro para Charlotte enquanto guardava a mala e a grande mochila que ela havia lhe entregado no bagageiro. Deu a volta e ao entrar continuou em silêncio.

Charlotte inspirou profundamente se sentindo péssima com o clima que havia se instaurado, esperou Henry ligar o carro e se distanciar um pouco do aeroporto para resolver pôr fim àquilo.

- Por que você veio me buscar?

A pergunta dela o assustou, ela percebeu quando ele pulou levemente no assento. Henry desviou um pouco a atenção da rua para a lançar um olhar confuso.

- Por que eu não deveria?

- Não é isso o que estou dizendo. Só quero saber por que você.

- Estavam todos ocupados.

- Sei. - resistiu ao desejo de revirar os olhos, estava cansada de mais.

- Sério. - afirmou ao notar a incredulidade dela. - Piper estava digitando as ordens pro grupo que ela está responsável, Jasper estava arrumando os quartos, Schwoz estava discutindo com meus pais por conta da ceia e eu definitivamente não ia deixar o Ray vim lhe buscar. Então, sim, todos estavam ocupados.

A forma como ele a respondeu fez Charlotte se sentir péssima, o que não fazia o menor sentido, mas eles sempre tiveram esse efeito sobre ela. Ignorou o amigo e passou a observar sua cidade da janela, era uma noite fria e pouco iluminada, os postes e letreiros davam um ar surreal à cidade. Charlotte percebeu que havia sentindo falta daquele lugar, de toda a vibe meio desconectada do mundo, é como se vivessem em seu próprio universo dentro de outro bem mais complexo e frustrante.

Passaram por ruas mal iluminadas, prédios decorados, praças pequenas vazias ou cheias de pessoas compartilhando uma festa, passaram direto pela rua de sua casa e da casa de Henry, foi quando percebeu que seu amigo estava indo por um caminho totalmente errado.

- Hum, Henry. - chamou cautelosa, virando-se para ele e notando o sorriso presunçoso em seu rosto. - Onde você pensa que está me levando?

- Em um lugar. - respondeu simples a fazendo soltar um bufo irritado. - Não se preocupe, só acho que a gente precisa dele um pouco.

- Eu sinceramente vou me arrepender de perguntar, mas que lugar é esse que você acha que a gente precisa? - tentou soar calma, porém estava muito cansada para ser cooperativa.

- Char. - a chamou enquanto estendia a mão à procura da dela. Charlotte facilitou seu trabalho para que ele não desviasse a atenção da rua e estendeu sua mão esquerda para Henry que prontamente entrelaçou seus dedos. - Você está irritada e com razão, sei que não devia ter demorado tanto, mas sabia que você ia precisar relaxar antes de embarcar na loucura que é o nosso natal.

- Vocês nunca facilitam. - afirmou se sentindo mais calma e virando-se um pouco para encarar o perfil de Henry.

- Mas você ama a gente.

- É, amo. - concordou, compartilhando uma risada com ele. - Mas não vou mentir que estou apreensiva com o que você planejou.

- Não precisa ficar assim, é somente um calmo e nostálgico passeio. - declarou, soltando suas mãos para virar o volante na próxima entrada.

- Nostálgico? - perguntou confusa, mas assim que eles começaram a entrar em uma rua conhecida que levava à um zoológico que estava aberto, ela não aguentou e caiu na gargalhada. - Você é muito idiota.

Henry somente riu da forma como Charlotte o olhava. Estacionou o carro e esperou que ela saísse para trancar. Caminharam de mãos dadas em direção ao local que quase os enlouqueceu anos antes, mas que agora era palco de memórias queridas. Pararam na plataforma acima da cova do Leão e observaram ele dormir tranquilo ao lado de sua companheira. Charlotte abraçou Henry pela cintura e levantou um pouco a cabeça para encara-lo, logo nesse dia havia decidido usar tênis, mas gostava da sensação de poder se esconder entre os abraços do Hart.

- Onde está a Frank?

- Ela me deu as chaves e está lá em casa.

- Você deixou esse lugar aberto enquanto ia me buscar? - perguntou em tom repressor o vendo revirar os olhos.

- Ninguém vai roubar um zoológico em pleno natal, Charlotte. E não precisa me olhar desse jeito, eu sou responsável. - garantiu, a apertando ainda mais em seus braços quando percebeu que ela escolheu não falar mais nada.

- Ok, vou aceitar essa mentira dessa vez.

- Ei!

- Considere este o seu presente de Natal, porque será somente isso que você irá ganhar. - declarou rindo assim que Henry abriu a boca indignado.

- Você não pode estar falando sério. Eu tive o maior trabalho pra conseguir um tempo com você essa noite, subornei a Frank prometendo um encontro com o Ray, tive que pular de uma-

Charlotte não aguentava mais o drama de Henry e não foi esforço algum fazer algo para que ele se calasse. Pegou o rosto dele com suas duas mãos e o puxou para baixo em um beijo, Henry ofegou surpreso porém logo se rendeu, a saudade no fim sempre seria maior. Após alguns segundos Charlotte se afastou um pouco e abriu um sorriso convencido quando notou que ele estava sem palavras.

- Você realmente fala de mais. - disse e iria continuar se ele não a tivesse impedido a puxando para mais um beijo.

Queriam aproveitar cada segundo ao lado do outro antes que estivessem rodeados por sua louca e estranha família, que por ser altamente invasiva não sabia de nada ainda sobre o relacionamento deles. Mas naquele instante, acima de uma cova de leões, com flocos finos de neve começando a cair, o jovem casal deixou o mundo em mudo e ignorou que já era quase meia-noite.

O natal chegou trazendo renovações em Swellview.

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