Welcome to my life - Simple Plan

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– Ken?

Eu estava realmente preocupada. Algo ruim deve ter acontecido.

Percorri todo o corredor e pude ouvir algo em uma das portas; aproximei-me até que minha orelha encostou-se a ela. Eram apenas gemidos baixos, mas pude escutar.

– Ken? É você? – outro gemido mas este foi um pouco mais algo.

Abri a porta no mesmo instante que reconheci sua voz

– Ken! Meu Deus...- levei a mão até a boca com a surpresa.

Ken estava amordaçado em meio aos materiais de limpeza. O pacote de biscoitos ainda estava em sua mão, mas muitos estavam espalhados pelo chão.

Quando encontrei seus olhos pude ver como ele estava apavorado. Estava sem os óculos por isso quase não enxergava, deveria estar tentando me reconhecer.

Ele gemeu algo parecido com meu nome. Me agachei e soltei o pano que tapava sua boca.

– Mel?! – ele quase gritou – Meu Deus Mel, pensei que ficaria aqui a noite toda. – sua voz era trêmula, o pavor era palpável.

– Calma Ken, está tudo bem. Respire fundo.

Ele começou a tatear o chão, a procura dos óculos. As suas mãos tremiam, as pontas de seus dedos magros e muito brancos estavam roxas.

“ Aquelas bruxas...” – pensei.

Segurei as mãos frias, muito frias, dele. Em baixo das minhas mãos na tentativa de abafar o tremor das mãos dele.

– Calma Ken. Eu estou aqui.- tentei tranqüilizá-lo.

Os olhos dele estavam lacrimosos e percorriam todos os cantos da sala , confuso e com medo.

– Não estou te vendo Mel. Elas fingiram ser você quando me trancaram aqui. Sem meus óculos não vejo nada além de vultos...- ele despejava as palavras tão rápido que eu mal compreendia.

Levei as mãos dele até meu rosto. As pontas de seus dedos frios percorriam meus olhos, nariz e boca tão delicadamente que se não fosse pelo frio de sua mão eu não seria capaz de detectar seus movimentos.

– Sou eu Ken. Está vendo? – seus olhos se fecharam. Seu rosto estava calmo novamente.

– Você é realmente linda, Mel. – ele manteve seus olhos fechados; mesmo assim, suas bochechas coraram.

A situação estava muito estanha...

– Obrigada Ken. Vem, deixe eu te levantar.

Tirei suas mãos do meu rosto e as segurei firme para levantá-lo. Ele estava meio tonto, por isso puxei um balde e o sentei nele.

– Vou procurar seus óculos. – eu disse.

– Obrigado Mel. Se você não estivesse aqui...

– Tudo bem Ken. Qualquer um teria feito o mesmo.

Seus olhos verdes geralmente brincalhões e até infantis ficaram rígidos, algo incomum em seu rosto.

“ De onde vem tanta amargura?” – me perguntei.

– Não. Se não fosse você ninguém teria notado minha ausência. – sua voz também era dura. Aquele não era o Ken...

– Bem... Talvez sim ou talvez não.  Afinal somos novos aqui.  Mas não precisa me agradecer, sei que teria feito o mesmo por mim. – me agachei e comecei a tatear o chão escuro.

– Eu faria qualquer coisa por você, Mel. – sua voz saiu suave e desengonçada, o Ken apaixonado tinha voltado. Mas algo naquela voz... era diferente. A forma com que ele disse encheu a salinha abafada de sentimentos, os sentimentos dele por mim.

Continuei olhando fixamente para o chão, incapaz de olhá-lo nos olhos. Alguns minutos depois ainda estávamos calados em meio a um silencio maçante.

– Encontrei!- gritei. Ken quase caiu do balde com o susto. – Pronto Ken, coloque seus óculos.

Entreguei os óculos nas mãos dele. Não estavam mais tremulas e as pontas de seus dedos já estavam rosadas.

Eu sorri, satisfeita por ter o ajudado. Mesmo não sendo o ideal de beleza, era sem duvida o garoto  mais amável que conheço.  E não é afinal isto o que  importa? 

Ele pôs os óculos e me olhou assim que conseguiu enxergar.

Antes que eu pudesse reagir ele já estava me abraçando forte.

– Obrigado Mel!

Demorei um segundo para entender a situação. Estava tudo realmente estranho...

Me soltei dele.

– Já disse que não precisa agradecer Ken. E ... você não disse quem fez isso.

Ele se afastou um pouco mais.

– Ambre e as amigas dela.

– Só a loira e as amigas dela?!

– Sim.- ele corou.

– E você não reagiu?!

– Eu... eu... – ele gaguejou – Eu fiquei nervoso. E elas pegaram meus óculos.

– Eu sei....mas é que... – continuei a frase em pensamento: - “elas são tão fracas. Como você não conseguiu impedir um bando de patricinhas?!”

Eu não disse, mas ele leu meus pensamentos.

– Você precisa saber se defender Ken. Não deixe elas fazerem isso novamente, okay?

Ele apenas me observou muito atentamente enquanto eu via sua expressão mudando, muito frustrado.

– Tudo bem Mel. Obrigada novamente.

Abriu a porta e saiu.

No escuro da sala me perguntei o quanto ele já sofreu e quanto eu tinha acabado de o magoar.

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