Encaro o sol, que já esta coberto até sua metade pela linha fina entre mar e céu. E o céu fica lilás e laranja ao mesmo tempo.
– Realmente lindo. – finalmente digo.
Ele arruma a postura, reparando que estou ao seu lado.
–Eu não faço o tipo de “cachorro” que late e não morde. - sua voz esta mais suave que o costume, apesar do sarcasmo.
Encaro Hatchi – a primeira estrela que aparece quando esta anoitecendo, a apelidei assim algum tempo atrás e ela vem me acompanhando desde então como uma excelente ouvinte.
Sorriu por um breve segundo.
– Eu tive um cachorro assim. Digamos que ele foi... inesquecível para mim. Me marcou profundamente. – ele me encarou, pela primeira vez. Pude ver que estava confuso. – o nome dele era Castiel. Só Deus sabe por que minha mãe o apelidou desta forma. – percebi que ele me encarava mas fixei meus olhos no horizonte, que já era de um tom lilás escuro e roxo. – Ele tinha um porte grande. Sempre me derrubava de costas no chão porque eu simplesmente não agüentava o peso dele quando ele se jogava em cima de mim para brincar. Ele tinha o pelo mais liso e sedoso que eu já senti – acariciei a borda do murinho, inconscientemente. – e era muito preto. Um tipo de preto azulado. Parecia um lobo.
Eu não sabia ao certo porque estava falando tudo aquilo a ele, mas ele mantia-se quieto, então eu continuei.
– Ele era um cachorro extremamente normal e carinhoso. Mas sempre me perguntei porque ele nunca latia. Jamais escutei um latido dele antes do que aconteceu. Sempre encarei isso como um bom sinal, que ele era manso e inofensivo.
0 céu rendia-se a escuridão azulada, junto de estrelas e a imponente Lua cheia. O vento estava mais forte e tive que aumentar o tom de voz para que ele escutasse.
– Até a noite que ele começou a latir. Passou a noite toda latindo e uivando para o vento. Eu tinha uma apresentação de Jazz no outro dia e ele não parava. Umas 4 da manha eu fui até o quintal e chamei por ele varias vezes. Mas Cast estava hipnotizado. Ele encarava Lua e a Lua tornava os olhos azuis claro dele completamente brancos. Na quarta vez que mandei ele se calar ele finalmente parou e me olhou. – podia sentir os olhos do ruivo me encarando- E me atacou.
Não vi sua expressão, mas sei que o ruivo se surpreendeu. Seu corpo moveu alguns centímetros.
– Antes que eu pudesse pensar... ele já estava com os dentes fincados na minha panturrilha.
– Tem cicatriz? – ele finalmente disse. E me surpreendi um pouco por ser interrompida. O encarei.
Enquanto ele falava pude ver seus dentes. Aqueles dentes pontiagudos... Estremeci um pouco.
– Sim. – levantei a calça jeans até o joelho e o expus ao luar. Ele encarou a arcaria dentaria do meu cachorro.
– Ele era realmente grande. – admirou-se.
Eu sorri, apesar da cicatriz não me provocar ânimo algum.
– E então? Alguém te ajudou? – ele perguntou, com a voz rouca.
– Não imediatamente. Eu desmaio quando vejo sangue. Ele mordeu duas vezes a mesma região da panturrilha, por isso o sangue jorrou no mesmo instante. Eu até gritei, mas Cast voltou a uivar e abafou meus gritos. Desmaiei e só acordei de tarde, no hospital. Meu pai ficou com tanto ódio do Cast que mandou sacrificá-lo.
Ele se encolheu um pouco.
A lua cheia já reinava no céu. Olhei para meu celular.
– Já são 7:30?! – disse para o celular. – Preciso ir.
Olhei para ele e ele encarava o horizonte, pensativo. Olhei para a paisagem. E senti meu coração apertar-se. Uma sensação dolorosa, mas boa. Esforcei-me para memorizar este momento.
– É um lugar muito bonito. Obrigada por ter me mostrado.
Ele respirou fundo, virando-se, tirando a chave do bolso e andando em direção a porta.
– Não pense que te mostrarei novamente. – seu tom grosseiro estava de volta.
Sorri.
– Nunca diga nunca.
Ele abriu a porta - que fez um barulho estranho.
– Vai continuar aqui? – pergunto parando em sua frente.
– Sim.
– Bem, estou indo para os apartamentos e se quiser posso te esperar para irmos junt...
– Ei, lembre-se de que só não fui de ônibus justamente para não voltar com você do meu lado. - ele me interrompeu.
Levei as mãos para o alto, como gesto de rendição.
– Esta bem; Esta bem. – reviro os olhos. – mas mesmo assim, obrigada por ter feito o sacrifício de me agüentar por todo esse tempo e me mostrar este lugar.
– Você não tem noção de como foi difícil. – ele diz de mau humor, mas pude ver um sorrisinho em seus lábios.
– Receio que sim. – digo sorrindo.
Ultrapasso o batente da porta e encaro o horizonte atrás dele por uma ultima vez. Dou um passo para trás e viro-me no primeiro degrau.
– Bem... Boa noite.
– Boa noite novata. – ele esta fechando a porta.
– Me chamo Melissa. – corrijo-o, quase certa de que ele não escutou.
Ele responde enquanto ouço o som da chave girando:
– Me chamo Castiel.
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Fanfiction"Olhando para trás percebo como as coisas simples são as mais gostosas. Como os detalhes, embora pouco observados, são o que mudam vidas. Como o tempo não esta a nosso favor mas mesmo assim trata de amenizar feridas. Sutilezas e ironias da vida...q...