vamos fazer uma aposta, Cinderela

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 — Aqui. Toma. — Natália joga uma pilha de papéis em cima dos meus braços. — Preciso que faça o meu dever.

Eu vejo os papéis, levo meu olhar a eles e ao rosto sonso de Natália um par de vezes.

— Não vou fazer. Tenho que estudar pra uma prova.

— Ah, você vai, porque eu preciso de nota e sei que ano passado fazia parte do clube da Itália.

Só então noto sobre o que o dever, gramática pura da língua italiana. São mais de vinte questões.

— Natália, eu não tô brincando, eu preciso estudar pra essa prova.

Ela ri forçado.

— Querida, eu não me importo, se não fizer o que eu pedi, conto a mamãe que me agrediu.

— O quê? — Um olhar perdido toma conta da minha expressão, não entendendo aonde ela quer chegar. — Eu nunca agredi você.

Dando de ombros como se aquilo fosse apenas um detalhe, ela finca as unhas no próprio braço, com força, a pele ao redor começa a ficar vermelha.

— Natália! Para. Para com isso. — Tento puxar seu braço para não deixá-la fazer isso quando vejo a dor no seu rosto, mas ela só cede depois de certa insistência.

— Isso aqui vai sumir em algumas horas, mas posso fazer mais forte e durar até o encontro com a minha mãe. E você sabe o que ela pode fazer com você.

A ameaça é clara. A verdade, é que eu sei bem o que ela pode fazer. Diana não é burra de me ferir fisicamente, mas ela é mestre em fazer isso com meu emocional, ou afetando meu futuro. Perdi as contas das vezes que recebi punições e deixei de comparecer a eventos importantes na escola que contavam pontos para faculdade, ou perdi aulas com conteúdos relevantes, ou, talvez o menos pior, me matei de limpar aquela mansão inteira em um único dia, tendo pausa apenas para as refeições.

Suspiro derrotada, sabendo que não haverá nenhuma outra saída, a contragosto, digo:

— Até que horas você quer? — Controlo as lágrimas de puro ódio, mas sei que meus olhos estão marejados.

— Final do almoço. — Ela abre um sorriso largo e simpático depois de conseguir o que quer. — Eu sabia que compreenderia, Cass. Você sempre compreende.

Sem conseguir segurar, a lágrima cai, seguida de outra, e depois mais outra. O ritmo delas aumentam conforme a minha raiva. Natália bagunça os meus cabelos como se fosse um maldito cachorro obediente. Mas eu não estou muito longe disso, estou?

Mas como uma iluminação divina, uma chave gira na minha cabeça e uma porta se abre me entregando de bandeja uma ideia perfeita. Por sorte, a loira ainda está aqui quando a chamo:

— Ei, Natália!

Ela volta a me encarar, com os olhos azuis fuzilando-me.

— Diana também não sabe que faço suas lições, não é? E suponho que nem mesmo você queira que isso aconteça.

O rosto da minha meia-irmã se fecha ainda mais para mim.

— Aonde quer chegar?

Sei que por mais que eu tente usar argumentos ou cartas na manga, não vou me livrar de hoje, nada que eu possa jogar na mesa nunca vai superar os lances de Natália ou minha madrasta. Por isso, aposto baixo, lembrando instintivamente do meu encontro com Alec.

— Sexta eu tô livre. Não vou fazer nada, nem pela tarde ou pela noite. Inventa de pedir uma comida para a janta, sai com ela a tarde, eu não sei. Você se vira.

Até A Meia Noite [EM PAUSA]Onde histórias criam vida. Descubra agora