SEXAGÉSIMO

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N A R R A Ç Ã O J A C O B

Mãos geladas acariciam a minha face. Eu estava sonhando com ela mais uma vez. Só gostaria de receber um alerta se aquele seria um dos pesadelos em que acordo gritando, chorando ou ambos, era pedir demais?

Tudo havia virado de cabeça para baixo nos últimos dias. Perdê-la talvez fosse a pior experiência que já vivi, superando até mesmo a morte de Billy. Perder Billy foi como se um pedaço do meu coração fosse cortado e estraçalhado, perder ela foi sentir o meu coração inteiro ser arrancado do corpo, deixando um buraco escuro e vazio. Eu não aguentava. Desde o incidente no penhasco onde Edward me salvara andava evitando ainda mais a nossa casa. As minhas mudas de trapos - não podiam ser chamadas de roupa já que agora eram um pouco apertadas demais - ainda estavam no meu antigo guarda-roupas pequeno na cabana minúscula. Alice nunca se preocupou em levar nenhuma para lá, apenas comprou um guarda-roupas inteiro novinho. Então decidi que era mais fácil viver num passado apático do quê num presente doloroso. As vezes via roupas novas em algum canto do quarto ou sofá e tentava adivinhar se fora Esme, Bella ou Alice que teriam as deixado lá, mesmo depois que eu insistisse que não precisavam se preocupar comigo. Eles ainda me consideravam da família mesmo que a minha consciência colidisse com a ideia que a morte dela havia quebrado totalmente o nosso vínculo - o que não era verdade, os Cullen se mostraram minha família desde pouco antes do imprinting, desde que abandonei a matilha de Sam que há algum tempo era minha já que alguns dos garotos como Seth decidiram mudar de lado e outros apenas aceitaram a decisão de Sam de se aposentar meses depois que Emily lhe deu o seu herdeiro. Algum dia eu já havia odiado os Cullen com toda a essência da minha existência, mas não lembrava qual era essa sensação faz muito tempo.
A minha vida havia se transformado numa ferida aberta daquelas que não coagulam, com um fluxo de sangue contínuo, que ardem e queimam. Até você gritar. A maioria das noites eram assim, - isto quando eu não passava dias e mais dias como lobo, fingindo precisar manter o perímetro seguro mesmo que não houvesse nenhum risco e deixando os garotos da matilha atordoados e esgotados - agonizantes.
Seth era quem mais sentia a minha dor. Quando decidi não me transformar para me atirar do penhasco ele automaticamente se tornou o alfa já que era o segundo no comando, o meu Beta. Então quando nós nos vimos pela primeira vez após aquilo eu estava um caco, destruído pelo meu próprio coração. Ele me devolveu a liderança mesmo que eu não a quisesse, mas algo dentro de mim já sabia que Seth que sempre fora o meu fiel escudeiro, que idolatrava qualquer decisão minha e me apoiava totalmente na maioria delas, não estaria pronto para tomar a frente de um bando inteiro, com todas as responsabilidades sobre ele. O conselho da tribo recorreu. Alegaram que um lobo precisa de muito mais que apenas uns anos humanos para desistir sem justificativa, que eu deveria honrar o meu compromisso com a tribo e com o Beta e os Ômegas. Foi terrível.
Leah também reclamou. Apesar de não ser do bando desde que decidiu se afastar para procriar, ela achou que apenas sua opinião como membro do conselho não bastava e não seria suficiente para me pôr nas diretrizes, então tivemos uma conversa séria onde ela tocou na minha ferida não coagulada que sangrou ainda mais, inclusive derramando o sangue - metaforicamente falando - furioso sobre ela. Então fui obrigado a voltar a ser lobo e Alfa, arrastando dois terríveis dias com febre e dores pelo corpo inteiro como se minha transformação houvesse sido acelerada para questão de quarenta e oito horas, não lembrava que antes havia doído tanto assim.

A pele fria deslizava sobre a minha face com gentileza. O cheiro adocicado dela me envolve em um daqueles sonhos sombrios onde ela volta para mim numa manhã nublada e triste - os cabelos mais castanhos e o olhar mais profundo como uma vampira de verdade - tirando-me o sono e acariciando a minha face, distribuindo beijos pelo meu rosto e eu finalmente acordo de verdade aos gritos. Eu já havia decorado cada segundo dos sonhos miseráveis e quase idênticos que me assombravam sempre que pregava os olhos. Talvez eu nunca devesse ter desejado que ela fosse para sempre uma meia vampira e não se transformasse completamente nunca, afinal isso a arruinou. Ter a visto de olhos vermelhos e pele gelada seria melhor que ver o seu corpo estático numa maca no escritório de Carlisle - coisa que eu também me recusava a ver -. Eles insistiam em acreditar na ideia de que ela voltaria e decidiram guardar o corpo ao invés de fazer um funeral descente, eu duvidava da ideia deles.

-  𝐑 𝐄 𝐍 𝐀 𝐒 𝐂 𝐄 𝐑  -  A  SAGA CREPÚSCULOOnde histórias criam vida. Descubra agora