CAPÍTULO V

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Saulo e eu seguimos em direção à Cabana rapidamente. Ele ia na frente, mudo. Eu estava assustado com a sua reação repentina e apenas o seguia, igualmente em silêncio. Concordava que o sonho tinha sido um pouco estranho, mas até aí, quem nunca teve uma experiência assim? Eu devia ter ficado impressionado com o início do meu tratamento e com a informação que a Fonte era mesmo uma fonte de água "normal". Nada mais do que isso. Contudo, Saulo não parecia disposto a ouvir qualquer explicação que eu pudesse oferecer.

Enquanto seguíamos até o nosso destino, passávamos por vários colaboradores da Chácara que realizavam suas respectivas funções. O café da manhã tinha sido devidamente retirado e eu achava incrível como praticamente não sobravam alimentos. Quase nada era descartado e, sempre que podiam, eram reutilizados. O trabalho dos cozinheiros era impecável. Além de que, como estávamos entre a natureza, as sobras poderiam virar adubo, se necessário. A localização era mesmo estratégica, havia a paz e tranquilidade de um lugar afastado e, também, toda essa outra questão que já comentei.

Dei vazão para todos aqueles pensamentos para não focar no que estava prestes a acontecer. Estava começando a ficar com medo de que tivesse acontecido algo de fato muito sério, e que eu poderia ter meu tratamento interrompido ou algo assim. Não suportaria ter que ir embora daquele lugar justamente quando as coisas começavam, finalmente, a dar certo. Por conta disso, nem percebi quando a figura de Amaro surgiu na nossa frente. Escutei mais ou menos Saulo falando com ele, provavelmente contando o que tinha acontecido comigo. Amaro respondeu alguma coisa, que eu também não entendi.

— Davi! Davi! - quando notei, Saulo chacoalhava meu braço com um pouco de força, como se eu estivesse mesmo em um estado de transe.

Queria responder, mas não consegui, senti minhas pernas perdendo força e tudo ficou preto.

— Saulo, sua atitude foi sim imprudente! - escutei uma voz feminina que eu reconhecia, e devo ter balbuciado alguma coisa, porque ela se virou para mim. - Davi! Que bom que acordou!

A imagem na minha frente foi ficando mais nítida e meu foco foi se ajustando devagar. A mulher de cabelos grisalhos os levava presos num coque naquela manhã. Elis sorriu para mim, me ajudando a sentar. Percebi que estava em uma cama que não era minha, em um quarto igualmente diferente. A luz que entrava da janela era abundante, o que fez meus olhos arderem. Prontamente, alguém fechou as cortinas. Outra pessoa me estendeu um copo de água, que eu aceitei no mesmo instante, sorvendo o líquido com vontade. Aos poucos, reconheci que as duas outras pessoas naquele recinto eram Saulo e Amaro, respectivamente.

— Davi, pode nos contar o que aconteceu? - a voz grave do líder me perguntou, sob o olhar atento dos outros dois.

— Eu fiquei... fiquei um pouco nervoso... tive medo de... de... ser mandado embora daqui... - contei, com mais vergonha do que qualquer outra coisa.

Estava me sentindo patético em ter desmaiado por algo que era apenas uma suposição, o que demonstrava meu quase inexistente controle emocional.

— Céus, por que achou que alguém faria isso? - tornou Elis, com a voz preocupada.

— Por causa do sonho... eu não entendi direito o que aconteceu, mas parece que foi sério... - não olhei Saulo, não queria culpá-lo, mas se ele tivesse, ao menos, conversado comigo... essa situação poderia ter sido evitada.

— Uma tempestade em copo d'água por um mísero sonho! - Amaro se virou para Saulo - Não sei o que deu em você! - a expressão dele era assustadora, não havia outra palavra para descrever.

— Mas... - Saulo fitava o chão, mas subiu o olhar para o outro homem, que permanecia impassível.

— Chega de mas - ele decretou - Davi teve uma crise nervosa por SUA causa! Ele agora deve descansar.

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