CAPÍTULO XXIII

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DIA 61

Era hoje. O dia que precisávamos descobrir as conexões que faltavam. Caso fossemos pegos, não imaginava o que poderia acontecer. Ser expulso era o mínimo e isso significava dar adeus ao único tratamento que, apesar de todos os poréns, dera algum resultado.

Meu corpo doía menos nesta manhã, parecia saber o que estava por vir. Precisava dele alerta, pronto para correr, me esconder, se fosse necessário. Não poderia jogar para Saulo a responsabilidade sob a minha proteção, tinha que dar conta de mim mesmo.

Enquanto lavava meu rosto na pia, repassava mentalmente os nossos passos. Fixei na minha imagem refletida, constatando que, apesar de cansado, ainda havia um brilho no meu olhar. Apertei essa sensação forte contra meu peito, para impedir que se dissipasse no ar.

Rumei até o pátio principal com o coração aos pulos, tentando controlar a ansiedade na caminhada. Olhei ao entorno. A maioria dos presentes não fazia a menor ideia do que estava acontecendo. Engoli seco. Ao mesmo tempo que deveria ter conversado mais com outros membros, procurado entender como elas se sentiam em relação à Chácara, sabia que era arriscado ficar fazendo perguntas. Isso ficou claro com aquela reação desproporcional de Amaro, quando ele chamou a mim e Laura para conversar sobre as alfaces, não sabia até que ponto aquilo tinha acontecido com mais alguém, além, claro, daquela pessoa que trabalhava na cozinha.

Saulo, Yoko, Edite, Laura e Duda já se acomodavam em uma mesa. Suspirei, era impressionante como eu sempre parecia atrasado de alguma forma. Arrumei uma bandeja para mim e me juntei a eles. Mais de perto, percebi nos semblantes tensos o indicativo de que tinham dormido pouco naquela noite, como eu.

— Estão todos prontos? — perguntei, dando um gole na minha xícara de café.

— Pronta eu acho que é forte, mas animada pra resolver isso: com certeza! — Laura tentou sorrir, demonstrando aquela leveza que conhecíamos tão bem.

A chave reserva da gerência tinha ficado com Saulo, achamos que seria o mais seguro. Olhei para ele, notando os olhos verdes distantes, remexendo uns pedaços de queijo gouda no prato. Estiquei minha mão até tocar na dele, que piscou rápido, levemente assustado com o gesto. Suavizei minha expressão.

— Tudo bem?

— Ah você sabe, daquele jeito — suspirou, fazendo um carinho suave na palma da minha mão. — Vou ficar mais quando estivermos em segurança.

— Vai dar tudo certo — tentei soar o mais esperançoso possível, mesmo que esse não fosse o sentimento naquele momento.

Ele me direcionou um sorriso preocupado, mas respirou fundo. Um breve silêncio recaiu sobre nós novamente.

— Pessoal, tenho algo pra falar, acho que vale o alerta — Edite pigarreou, chamando a nossa atenção. — Tive um daqueles pesadelos esquisitos essa noite... Não sei se isso quer dizer algo ou se foi coisa da minha cabeça...

— Acho que não podemos mais pensar que essas situações são coisas da nossa cabeça — Yoko tinha aquela expressão calma, mas seus olhos estavam mais atentos do que nunca.

— Certo, vamos ficar de olho nos arredores o tempo todo, Amaro não é idiota, mesmo tendo ficado em silêncio por esses dias, ele deve pensar que estamos planejando algo — Edite cruzou os braços, enquanto dava uma olhada ao redor de maneira discreta.

Todos nós assentimos.

— Bom, está na hora, — Laura se levantou, esticando os braços acima da cabeça — será que vou encontrar nosso querido amigo Roberto?

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