Capítulo 10 - Jonathan

11 2 1
                                    




Eu mereço tudo que está acontecendo. Fui falho como amigo, como pessoa e acima de tudo como homem. Mas qual o homem que não falha? Quem nunca mergulhou fundo em uma tentação? Quem nunca disse sim, quando deveria dizer não aos seus impulsos? Mas ela não merecia... não merecia. Já não bastava toda dor e sofrimento pelo que passou, eu ainda tinha que colocar mais uma desgraça em sua vida. E isso não era justo. Nada justifica uma traição! Mas estou com raiva. Como pode me obrigar a deixar de cuidar dela? Eu não posso fazer isso. Simplesmente ir embora sabendo que ela não está bem. Se eu fizesse isso não conseguiria sequer me olhar no espelho. Sei que ela não tem ninguém. Sei que mente para me afastar. Impossível existir alguém e deixá-la naquela situação. Essa possibilidade estava descartada. Talvez eu esteja tentando amenizar minha dor na consciência. Talvez eu queira somente me sentir útil. Nunca vou conseguir desfazer o dano que a causei. Mas quero tentar. Vou tentar ser teimoso como ela.

Ela disse que não precisa mais de mim, mas não consigo seguir mais do que 20 metros de distância. É onde está meu carro. Ir embora, não é uma opção. Ficarei aqui, como um protetor, um segurança observando o movimento. Ficarei esta noite e quantas forem necessárias, até que a veja completamente bem.

Abaixo o banco do motorista, para ficar um pouco mais confortável. Ele será minha cama por essa noite. Está frio e só tenho meu casaco para me esquentar... relaxo, mas os pensamentos a mil por hora não me permitem ficar tranquilo.

Lembro bem quando bati a porta da cabana, eu já havia perdido as esperanças ao passar pela porteira e não ver fumaça saindo pela chaminé. Tudo estava escuro lá dentro. Todas as janelas fechadas nenhuma movimentação. Mas vi o carro do pai dela, o que me fez acreditar que ela poderia ter somente ido dar uma volta. Quando o barulho da chave começou a alertar que ela estava lá, apressado me recompus, era ela. Finalmente a veria.  Mesmo que me expulsasse dali, pelo menos teria sua imagem gravada em meus olhos nem que fosse pela última vez. Respirei fundo para controlar minha ansiedade aparente. Mas me assustei ao vê-la. Sua pele clara e rosada agora estava pálida, seus olhos verdes e brilhantes agora sem brilho, sua boca molhada e delicada agora ressecada. Uma ferida inflamada em sua testa denunciava uma queda ou agressão. Estava uns 10 kg mais magra. Não a reconheci. Seu corpo e contornos cobertos por um cobertor, mostravam suas mãos esqueléticas e machucadas. Imaginei instantaneamente que havia alguém ali, será que tinha sido sequestrada? Será que estava sendo mantida em cativeiro na sua própria casa? Tentei procurar com minha visão limitada através de sua imagem encurvada, algum vestígio que o indivíduo ainda pudesse estar presente. Mas quando ela desmaiou em meus braços, a única coisa que pensei foi em salvá-la. Tinha que procurar ajuda. A coloquei no banco de passageiro em meu carro e acelerei rapidamente. Gritei para que o Google me guiasse o caminho do hospital mais próximo. E prontamente me mostrou que ficava a aproximadamente uns 20 km dali, Hospital Genus.

Corri desesperadamente pedindo ajuda, a caminho da emergência com ela nos meus braços desfalecida. Não pesava mais que uma criança de 8 anos. As pessoas naquele local me acolheram com pressa e a vi sendo levada em uma maca. Tentavam me acalmar, dizendo que tudo ficaria bem. Ela seria atendida. 

Um quadro grave de "desnutrição e desidratação", foi o que a Dra Carla Sans, que a atendeu me disse. Não pude deixar de notar os olhares desconfiados em minha direção. Será que pensavam que eu tinha causado isso a ela? Me senti no dever de explicar toda a situação mesmo que não houvessem perguntas. Solicitei a polícia que fizesse uma busca no chalé e em toda redondeza atrás de algum sinal de que mais alguma pessoa pudesse estar ali, a machucando. Mas não havia nada. Nenhum vestígio. Tudo foi vasculhado. E o laudo do corpo de delito acusou que ela bateu a cabeça por uma provável queda. Suas mãos machucadas foram causadas por ela mesma, que deveria ter se debatido contra o chão e paredes. Eu me culpei. Na verdade, não havia ninguém a quem culpar e sim eu mesmo. Eu que com meu egoísmo deveria ter sido mais atento e cuidadoso. Nunca imaginei que meus instintos poderiam me levar a destruir a vida de alguém. Me disseram que o homem não pensa com a cabeça de cima e sim com a de baixo. Por um momento acreditei que isso era verdade, pois todas as vezes que fiquei com Samanta, só via Melanie. Era como uma ilusão de ótica, uma miragem. Eu a via, sentia seu corpo, seu cheiro e me descontrolava. Fazia com Samanta tudo o que eu queria fazer com Melanie e não podia. Confesso que a aventura foi boa por um tempo. A sensação de que estamos fazendo algo escondido, nos dar um prazer maior do que aquele real. Me sentia superior em saber que conseguia desfaçar e enganar. É fácil e gostoso ser imprudente. Mas o que custou meu erro? Somente o amor da minha vida.

EnvoltoOnde histórias criam vida. Descubra agora