Capítulo 4 - You're never gonna fit in much, kid

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Oi, gente. ♡
Esse ep é especial pra mim porque eu tive fortes influências pra escrevê-lo. Duas delas são um livro chamado Ordinary People, que é pouco conhecido e antiguinho, mas é muito bom (inclusive o Berger se chama assim em homenagem ao médico desse livro) e a outra é um livro chamado A terra inteira e o céu infinito. É claro que eu não quero me comparar a nenhum deles porque eles são beeem maiores e melhores, mas, sei lá, com certeza eles foram importantes aqui.
Além disso, tem uma situaçãozinha meio barra pesada de ansiedade, então se você se sentir mal não insista. Leia só as falas e você vai conseguir pegar a idéia geral da situação.
Isso, aliás, é outra coisa pra me testar mentalmente porque eu adoro escrever sobre pessoas surtando. Eu sou um... idiota? 😶👉👈
Enfim, é isso. Boa leitura pra todo mundo ♡

Gerard estava parado em frente a uma porta na qual uma placa prateada comunicava: "Sala do Dr. Berger Ferrat". Ele não desejava entrar lá, ainda não havia sequer se recuperado bem do ataque de pânico da sessão anterior. Fora que, graças a isso, ele havia fornecido material de sobra ao médico para que fizesse mais diagnósticos idiotas e tautológicos sobre ele, do tipo "você teve um ataque de pânico porque sofre de ansiedade". Gerard não sabia se era complexo de superioridade, mas se perguntava se era mesmo tão errado assim que esse tipo de terapia, que apenas nomeia características comportamentais óbvias com jargões médicos, não o consolasse nem o ajudasse. As pessoas tendem a achar que a presença da sua patologia da Classificação Internacional de Doenças é reconfortante porque ao menos existem opções de tratamento para elas e a segurança em não serem um evento único, abominações ambulantes da natureza. É engraçado como o ser humano encontra certo consolo na noção de que sofre de uma doença epidêmica e não de uma raridade infortuna da loteria genética, mas não era o tipo de coisa que costumava tranquilizar Gerard. O coletivismo não assegurava uma cura, apenas a especulava e esperançava. Além disso, a tara que terapeutas tinham por conversação aliada ao fato da sua condição incidir em outras pessoas acarretava sempre em seções de terapia em grupo e, sério, Gerard não estava nem um pouco afim de ouvir sobre a depressão pré-parto de Lucy ou sobre a fobia social da Betty que só não a aflige na Saks.

Além disso, as pessoas imaginam que ter acesso à lista de sintomas e ser capaz de percebê-los em seu dia a dia, em uma vigilância epidemiológica individual e sistemática, pode, de alguma maneira, traçar uma fronteira entre o seu estado atual e a insanidade. É uma raciocínio que replica outro muito presente no senso comum, o de que o homem se difere dos animais porque a consciência que ele tem da própria existência o afasta da selvageria. Em teoria, ter consciência das próprias merdas, se não as faz regredir, pelo menos as retém, e reconhecer sua existência é o laudo definitivo da sua sanidade. Mas Gerard tinha plena e absoluta certeza de que não era assim que funcionava. Essa ideia de que a loucura viria com algum tipo de tempestade imunológica, avançando e matando rapidamente, uma blitzkrieg febril e brutal contra cada órgão do corpo era uma idiotice. A loucura era mais como pequenas deleções ou inserções nucleotídicas: micro, progressiva e silenciosa (pelo menos até que chegasse ao estágio avançado, porque depois disso passaria a ser sintomática e aí já seria tarde demais). A questão é que de nada vale tentar promover sensos estatísticos do próprio estado porque jamais se pode prever uma transição da sanidade para a insanidade e imaginar que se pode é, no mínimo, ingênuo.

Bom, de qualquer jeito a questão era que, graças à sua ceninha na consulta anterior, Gerard havia prolongado o próprio tratamento em pelo menos mais alguns meses, o que era realmente uma grande merda. Ele tentou explicar ao reitor seus pontos (que, convenhamos, eram bastante válidos), mas é claro que, para variar, como suas opiniões contrariavam as dele, ele apenas reiterou que era imprescindível que o garoto se consultasse semanalmente e que essa foi uma decisão conjunta dele, reitor, com os pais de Gerard. Caso contrário, ele seria obrigado a comunicar a situação à família do menino e Gerard realmente não gostaria de ter que encarar novamente Donald. Em suma, ele estava sendo coagido a ir. Era isso ou Donald, uma chantagem baixa e muito pouco esforçada em questão de criatividade, mas bem efetiva, para a sua má sorte.

Drowning Lessons  -,' Frerard ,'-Onde histórias criam vida. Descubra agora