Capítulo 10 - O deserto antropofágico

110 6 5
                                    

Enquanto avançavam por uma região desértica, com paisagens áridas tingidas de tons avermelhados, onde páginas de livros antigos voavam rente ao chão quente, depararam-se com uma criatura extraordinária. À sua frente, erguia-se um lagarto gigantesco, com escamas verdes, seis patas, um longo rabo e patas descomunalmente grandes.

Diante desse encontro imprevisto, decidiram desviar cautelosamente do imenso animal. Contudo, quando estavam prestes a concluir o desvio planejado, a criatura notou sua presença e lançou-se em um ataque sorrateiro por trás.

Com o grande lagarto se aproximando rapidamente, Guit tomou uma decisão rápida e conjurou um campo de força para proteger a si e seus companheiros.

Entretanto, o animal colossal não se deixou intimidar e investiu contra o campo de força, sua saliva ácida começando a corroer a barreira mágica que os envolvia.

O que ocorreria a seguir? Seria esse o seu fim?

Com sagacidade, Kauhan lançou uma magia poderosa que empurrou o enorme lagarto para longe, fazendo-o desabar ao solo e desmaiar.

Curiosos com o que havia acontecido, aproximaram-se do local onde a criatura jazia inconsciente.

O deserto, na verdade, era uma espécie de cárcere, e nas rochas avermelhadas, fragmentos de poemas da Ordem dos Poetas Modernistas tentavam criar um novo universo, baseado no princípio do antropofagismo. As inscrições traziam as assinaturas de diversos magos.

Em uma lápide majestosa, puderam ler as seguintes inscrições:

1912

Oswald de Andrade retorna da Europa, influenciado pelo futurismo de Marinetti, proclamando que "estamos cinquenta anos atrasados em termos de cultura, ainda imersos no parnasianismo".

1913

O pintor lituano Lasar Segall realiza a "primeira exposição de pintura não acadêmica em nosso país", conforme expressado por Mário de Andrade.

1914

Primeira exposição de pintura de Anita Malfatti após seu retorno da Europa, trazendo influências pós-impressionistas.

1917

Mário de Andrade e Oswald de Andrade, os proeminentes líderes da primeira geração do modernismo brasileiro, tornam-se amigos.

Publicação de "Há uma gota de sangue em cada poema", um livro de poemas de Mário de Andrade, que assina com o pseudônimo Mário Sobral em um ato pacifista de protesto contra a Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

Publicação de "Moisés e Juca Mulato", uma coleção de poemas regionalistas de Menotti Del Picchia que alcançou sucesso junto ao público.

Publicação de "A Cinza das Horas", de Manuel Bandeira.

O músico francês Darius Milhaud, radicado no Rio de Janeiro, se encanta com o maxixe, o samba e os chorinhos de Ernesto Nazareth, após uma visita a Stravinski, entra em contato com a moderna música francesa.

1919

Publicação de "Carnaval" por Manuel Bandeira, marcando sua transição para versos livres.

1921

Ocorre um banquete no Palácio Trianon em homenagem ao lançamento de "As Máscaras" de Menotti Del Picchia. Durante o evento, Oswald de Andrade pronuncia um discurso anunciando a revolução modernista no Brasil.

Exibições de quadros de Vicente do Rego Monteiro, em Recife e no Rio de Janeiro, explorando a temática indígena brasileira.

Di Cavalcanti realiza uma mostra de desenhos e caricaturas chamada "Fantoches da Meia-noite" em São Paulo.

Oswald de Andrade, Menotti Del Picchia, Cândido Mota Filho e Mário de Andrade propagam o modernismo por meio de revistas e jornais.

Mário de Andrade escreve uma série intitulada "Os Mestres do Passado", analisando esteticamente a poesia parnasiana que estava então no auge, enquanto destaca a necessidade de superá-la, já que sua missão estava cumprida.

Oswald de Andrade publica um artigo sobre os poemas de Mário de Andrade, intitulando-o "O Meu Poeta Futurista", o que leva a palavra "futurismo" a ser usada indiscriminadamente para designar qualquer manifestação modernista, mesmo que de forma pejorativa.

Essa série de inscrições detalhadas retratava os principais acontecimentos que moldaram o movimento modernista no Brasil, revelando sua evolução ao longo dos anos.

Em letras douradas, uma lápide adicional proclamava:

In Memoriam à Revista de Antropofagia

A Revista de Antropofagia teve duas fases distintas, ou "dentições".

Na primeira fase, de maio de 1928 a fevereiro de 1929, com 10 números, a revista era editada por Raul Bopp e Alcântara Machado. Nesse período, sua ideologia antropofágica ainda não estava totalmente definida. Autores com diferentes orientações contribuíram para a revista, incluindo Plínio Salgado, Mário de Andrade, Guilherme de Almeida, Jorge de Lima, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Menotti Del Picchia, Murilo Mendes, Augusto Meyer e Pedro Nava.

Na segunda fase, denominada de "segunda dentição", a revista passou a ser dirigida por Geraldo Ferraz e foi publicada no "Diário de São Paulo" de 17 de março de 1929 a 1 de agosto de 1929. Nesse período, os "antropófagos" incluíam Oswald de Andrade, Raul Bopp, Geraldo Ferraz, Tarsila do Amaral e Patrícia Galvão (Pagu).

A descoberta dessas inscrições históricas no deserto antropofágico levantou questões intrigantes sobre o que estaria por vir em sua jornada.

Poemas: Sociedade dos poetas uivantesOnde histórias criam vida. Descubra agora