TWO

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Assim que meus pés atravessam os grandes portões do Cemitério de West Norwood, as memórias do pior dia da minha vida vem a tona, me fazendo lembrar o que tento dia após dia esquecer. Mas o fato é, essas memórias nunca irão me deixar, a culpa e o medo nunca irão me deixar.

Flashback On

- Mas que droga! - Reclamo sentindo as gotas grossas de chuvas molharem meus cabelos, estava na porta da Universidade,e a essa altura, eu estava encharcada. Decido ligar pra meu pai, aliás, por sorte, esse é o horário que ele sai de seu escritório.

- Oi Papai - Digo procurando algum lugar pra me esconder da chuva, o que foi em vão já que não havia nenhuma cobertura naquele recinto, apenas o grande prédio a minha frente, que Universidade não tem cobertura?

- Oi pequena, ta tudo bem? - Diz preocupado.

- Está tudo ótimo, eu estou a pé, e está chovendo muito aqui, teria como você me buscar? - digo mordendo o lábio, na tentativa de camuflar o frio.

- Claro - diz risonho - Se você adivinhar quem veio me trazer torta de limão no escritório, te levo pra jantar naquele seu restaurante favorito - diz ainda rindo. Ah, claro

- Deixe-me adivinhar - digo fingindo estar pensanso - Senhora Elisa Fort Jhonson? - sorri

- Oi filhota - ouço a voz de minha mãe - já estamos a caminho, e pode deixar que hoje iremos naquele restaurante que serve uma comida brasileira incrível. Não é Kennedy? - o questiona com o ar engraçado.

- Tudo por vocês - diz o homem - Estamos chegando, te amo- desliga.

Meu pai é advogado assim como minha mãe, que sem sombra de duvidas eu me espelho, e muito. Não são aqueles tipo de pais que escolhem sua profissão apenas para continuar a linhagem na família, no meu caso, foi diferente, foi o amor que eles emanam por suas profissão que me fez querer senti-lo. Eu não poderia ter pais melhores, não poderia ter uma família melhor, e olhando pra eles, mesmo depois de 25 anos de casados, a chama nunca se apagou, a forma que os dois se olham, a forma que demonstram que são completamente apaixonados um pelo outro, esse ato, me faz almejar um amor, um amor como o de meus pais. Eu tive um amor, mas não foi o amor que sonhei, foi um amor que ia de contramão daquilo que havia formulado, um amor árduo, um amor que mentia, um amor que me machucava e me fazia sentir culpada.

- Ana, filha, entra - dizia minha mãe me tirando dos meus pensamentos - Anda, está a chover muito forte - Caminho em direção ao mesmo.

- Está toda molhada, precisa de um banho e de roupas quentes - dizia minha mãe no banco do passageiro me olhando

- Tem razão - digo tentando secar minha roupa com uma blusa minha que havia deixado ali, que era uma mania minha caso evento como esse acontecese, embora eu tivesse meu carro, eu não costumava dirigir, um trauma causado por volta dos meus 17 anos, quando sofri um acidente, o que originou meu medo por volante.

- concordo com sua mãe - dizia tentando enxergar a estrada a sua frente - A pista está ficando perigosa - dizia meu pai com seu olhar atento a pista, realmente, não dava pra ver muito, a chuva estava piorando.

E foi nesse momento que uma luz muito forte pairou a nossa frente.

- Amor, o caminhão! - minha mãe grita exasperada. Na tentativa de evitar a colisão entre ambos, meu pai desvia o carro pra fora da pista, e foi tudo muito rápido como um raio, o carro saltou a pista caindo em um lago, um imenso lago. Eu tentava tirar os cintos de segurança, mas não conseguia, o peso da agua fazia todos movimentos ficarem limitados. Eu não estava pronta, seria esse o fim? Eu não conseguia falar, não conseguia gritar, estava submersa, olho a minha frente, minha visão estava turva, mas tinha certeza que minha mãe estava a me olhar e seu olhar me pedia calma, olhei do outro lado e meu pai não estava em seu lugar. E foi com meus pulmões entrando em colapso que eu senti meu corpo ser puxado pra fora daquele carro, era meu pai, era ele, estavamos sendo resgatados? Cadê a mamãe?

- Eu vou buscar sua mãe, vá buscar ajuda - Meu pai me coloca numa espécie de beira e submergi naquele imenso lago. Eu estava desesperada, ele não voltava, cadê eles.

E foi com esses pensamentos, que eu pulei novamente no lago, eu os procurei, mas não havia nada, apenas o carro submerso, mas eles não estavam ali, não havia corpo, não havia nada.

Três dias de buscas e os corpos foram encontrados. Meu pai estava abraçado a minha mãe, os peritos disseram que na tentativa de voltar a superfície os dois acabaram por se prender numa espécie de mato aquático. Os dois morreram, e a culpa foi minha, eu sou a culpada. E eu sabia disso.

Flashback Off

Caminho entre os túmulos, e encontro o de meus pais.
- Oi mãe, oi pai. Eu... eu consegui entrar naquela empresa de advogados que vocês tanto me disseram - enxugo uma lagrima teimosa - O meu chefe é um chato - Ri sem humor - Mas o importante é que estou lá - sento no chão - Eu sinto tanto a falta de vocês - choro - Me perdoe, por favor, a culpa foi toda minha, era pra eu estar aí, não vocês - acabo por me desmontar em lágrimas.

Esses dois últimos anos foram os piores. Passei por terapia para tentar superar o fim de meus pais, a culpa, o medo, eles eram menores, mas ainda estão guardados dentro de mim. A família de meu pai e de minha mãe moram muito longe, o que consequentemente faz com que eu não tenha nenhum tipo de laço familiar, e isso era horrível. Por sorte, ou acaso do destino eu tenho uma amiga de infância que acompanhou todo meu drama vivido, que me apoiou e fez com que eu não desistisse de mim. Cheryl, era o nome dela, foi ela quem me sustentou, segurou minha mão e me ergueu no momento mais caótico da minha vida.




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