Dupla de Criação

176 16 7
                                    


Eu em doze anos de carreira como publicitária, empresária e modelo achei que tinha conhecido todos os tipos e personalidades de pessoas que podia existir na indústria do entretenimento: tímidas, extravagantes, extrovertidas, antipáticas, corajosas, desbocadas e até mesmo com um poço de estresse que não a cabia, porém nunca conheci uma fotógrafa tão dispersa em toda minha vida. O problema não era exatamente esse, embora soubesse disfarçar tinha problemas pra focar nas coisas que precisava fazer, o problema era entender exatamente como ela conseguia ter coordenação motora suficiente para continuar conversando, sorrindo, bebendo e batucando a caneta no bloquinho de anotações. Ainda não tínhamos começado, ela apenas deixou sua mochila estilo carteiro em um dos armários com segredo e voltou com o caderninho de capa mole em mãos.

Talvez fosse um sinal de nervosismo, eu deveria relevar isso ou colocar no relatório? Acho que vou relevar apenas por ter me fornecido um dos melhores memes mentais pela manhã quando sua expressão ficou numa e sua cor saiu de seu corpo sabendo com quem falava. Mesmo que isso não fizesse muita diferença, era branca como leite desnatado de banana. Sorriu de lado quando abriu a garrafa verde e pôs em seu lado esquerdo, deixando espaço livre entre mim e ela; passou algumas páginas e acabei vendo alguns desenhos provavelmente feitos pela mesma. Eram realmente expressivos como a dona dos mesmos, tinham alguns que realmente chamavam atenção por serem feitos com carvão e aquarela; não era expert mas Wheein sempre frisava o quanto eram difíceis de controlar em questão de movimento, então, a mulher de fios roxos deveria ter habilidade com isso.

— Você que os desenhou? — Perguntei parando o movimento contínuo de passar as páginas e acabei parando num desenho de uma linha só que mostrava a silhueta de uma mulher. — Porque se sim, tem muito talento.

— Sim, sim. — Balançou a cabeça achando finalmente uma página em branco. Olhou-me com as orbes brilhantes, realmente parecia empolgada, mas não sorriu como antes. — É um hobby. Ainda não está muito aperfeiçoado. Me ajuda muito no processo criativo, sabe? — Escreveu meu nome no topo na folha enquanto falava e então vi o losângulo que se formou entre suas sobrancelhas quando sua expressão ficou séria. — Certo. Você tem um rosto muito simétrico, com alguns detalhes escondidos que eu quero aproveitar.

Fez um retângulo no papel e começou a rabiscar algumas coisas dentro a figura geométrica, eram linhas que partiam de um centro e que ao final, formavam meu rosto ou pelo menos o formato dele. Abri minha boca e inclinei minha cabeça em dúvida.

— Quais detalhes? — Ela tirou a atenção do papel e a voltou para mim, largou imediatamente a caneta preta. Parecia realmente me examinar como um enfermeiro que trabalhava firmemente em seu diagnóstico. Segurou meu queixo com seus dedos dobrados e virou cerca de noventa centímetros para a direita, sorriu e eu instantaneamente também o fiz. — Descobriu?

— Você tem um sinal bem aqui. Está escondido com maquiagem mas dá pra ver o formato dele. — Soltou-me e eu esmaguei meus lábios uns nos outros. Não era como se não gostasse dele, mas quando era fotografada aquilo era digitalmente tirado de mim, era como um ruído na foto. Era o que eu sempre ouvia. — Além das suas bochechas fofas fazerem todo o resto do trabalho duro.

Levantou seus indicadores e  com o auxílio dos mesmos tocou minhas covinhas de queixo o que me fez pequenas cócegas e, contando com o barulho sonoro de choque que seus lábios fizeram, acabei soltando uma gargalhada alta. Sim, eu tinha risada de golfinho. E agora todos nos olhavam. Ela riu junto porém, mais contida. Se bem que qualquer risada era mais contida do que a minha, então era irrelevante. Abanei seus dedos dali espreitando meus olhos para a mesma. Acho que ela me deu o troco pela situação desconfortável de hoje mais cedo.

— Agora estamos quites. — Tomou a caneta em mãos novamente. Pois é, eu estava correta.

— Você é bem folgada, não é? E além do mais eu posso vir a ser sua chefe daqui a dois dias. — Estiquei meu braço pegando a garrafa da leve cerveja na ponta da mesa e tomando um gole, apenas para que meu corpo esfriasse pelo calor de ter rido daquela forma. — Preciso de algum respeito.

— Não foi você que disse que não bebia no trabalho? Porque você acabou de beber agora...

Bufei, revirando os olhos, mas ao ver o quase sorriso que a mulher a minha frente acabei soltando uma curta risada logo após.

— Faça seu trabalho. — Voltei a garrafa a seu antigo lugar e logo passei minhas mãos em minhas coxas para que o tecido as limpasse.

— Ok, chubby cheeks. — Se eu revirasse meus olhos mais uma vez, acho que minhas lentes sairiam do lugar. Sua feição mudou tragicamente, agora estava séria como antes observando o papel que em um minuto de descuido meu, estava cheio de observações pontuados em tópicos. — Como eu dizia, você é muito expressiva e eu quero aproveitar isso. Eu estava pensando em algo meio blues, sabe? Em plano fechado que focasse em você sendo o mais natural possível dentro desse conceito. — Me mostrou suas anotações a cada coisa que ia explicando, além da boca usava as mãos. — Também quero que use as mãos pra frisar sua expressão, meio arte Vogue. Pensei de também usar um...

— Chapéu onda. — Dissemos juntas enquanto balançamos a cabeça juntas. Virei meu rosto a direção contrária apenas para tirar Wheein que estava entretida demais com a Jimin para ao menos se preocupar comigo. Mas eu diria que estávamos bem.

— Então eu acho que é isso mesmo. — Fechou o bloquinho largando a caneta dentro do arame que o encadernava, colocou as mãos nos bolsos da calça cinza larga com dobras que vestia, subindo minha visão estava uma camisa de manga longa listrada com uma gola alta, não até o fim de seu pescoço mas ainda era alta. — Vamos ter que esperar todos eles irem primeiro mesmo?

— Além de tudo é impaciente, tsc tsc — Levantei a deixando esparramada na cadeira como tinha gravado a minutos atrás. — Vou me arrumar, enquanto isso você pode ir jogar algum joguinho no computador. — Sorri em deboche fazendo alusão a nossa diferença de idade.

— Claro, vou preencher a tela com suas bochechas.

Ouvi longe por estar andando até a arara de roupas, a olhei por cima do ombro que ria pegando seu aparelho de celular.  Tínhamos disponibilizado tudo, absolutamente tudo o que os fotógrafos e modelos iriam precisar para esses dois dias e já muito além disso; deixá-los "mimados" com nossos produtos sempre acessíveis era também uma forma de observar como iriam se movimentar com o poder de decisão nas mãos e isso nem sempre era fácil, até porque exigia muito do cliente e da imagem que queria passar. Mas nós, estamos aqui para dificultar e julgar o melhor trabalho no final, era para isso que estávamos ali. Procurei um vestido decotado preto que realçaria meu busto, pra que os takes iriam ser focados desta área para cima, quando achei peguei o cabide com a peça ouvindo um suspiro atrás de mim realmente familiar.

— O que houve, puppy? — Virei-me para ela que remexeu com os dedos em casa cabide disponível ali, procurando algo, mas insatisfeita por estar fazendo-o.

— Ela quer fazer um ensaio sensual. Céus... Você consegue me imaginar fazendo algo assim? — Perguntou como se seu mundo estivesse caindo em seus pés e eu ri me esticando até pegar o chapéu no manequim. Dei de ombros. — Mas até que ela é legal sabe? Ficamos falando de tatuagens um tempão.

— Então eu entendi porque ela quer fazer um ensaio sensual. — Pisquei para a menor que pôs as mãos na cintura e bateu as pontas dos pés nervosa, bateu em meu ombro algumas vezes mas depois sorriu vencida. — Você devia relaxar um pouco. É linda e seu corpo é mais lindo ainda, não tem como dar errado.

Ela soltou algumas vezes um ar pesado, deixando seus ombros caírem em seu próprio eixo. Olhou a fotógrafa que mexia na caixa de lentes e quando sentiu-se pronta, pegou um dos vestidos com alça curta e fina.

— Mas e você? Está indo bem, nem preciso perguntar, julgando pela sua risada que ecoou por umas três horas na sala, eu posso dizer que está tudo realmente bem. — Soltou sua habitual risada enquanto falava e então tive que respirar fundo pra não surtar naquele momento.

— Ela é uma folgada isso sim. — Chutei o nada com meus saltos brancos, mas por certo motivo direcionei meu olhar até o dela que estava concentrada em seu bloquinho de anotações novamente, talvez, desenhando algo. — Você acredita que ela me confundiu com um estagiário mais cedo? E sobre a gargalhada, me pegou desprevenida, ok? Ficou cutucando minhas bochechas e fazendo uns sons estranhos só ri porque... Porque...

— Porque você é besta e ri de tudo e além disso sente cócegas nas covinhas. — Wheein tinha resumido tudo muito bem, mas eu não podia dar o braço a torcer e dizer isso.  Estava ali com um propósito e não eram minhas bochechas e os dedos quentes de uma fotógrafa que me desviaram disso. — Seja profissional, ok? Eu sei que você consegue superar a girl crush ali.

Girl crush. No máximo era simpática e talentosa, não tenho como negar isso. É uma folgada talentosa.

Me troquei com calma, afinal havia muito tempo para que eu fizesse isso e ainda diagramasse uma edição de e-book da Solarsido inteira, existiam nove candidatos a usar o cenário antes de nós e isso me dava todo tempo suficiente e mais do que isso. Minha maleta de maquiagem sempre ali perto, tinha me servido de bom grado; já que Byul-Yi queria frisar minha beleza natural, acabei passando comento uma base que se aproximasse da minha real cor de pele e com isso, o batom também foi escolhido dessa maneira. Prendi parcialmente meus fios para que pudesse acomodar o chapéu com mais facilidade, e para o mesmo não caísse no meio da sessão, peguei algumas presilhas nude e prendi alguns pontos essenciais para que aquele terrível imprevisto não acontecesse.  Nenhuma das outras modelos teria ajuda de maquiador ou figurinista, inclusive toda a nossa equipe voltada para esse fim tinha sido dispensada para melhor funcionamento da seleção. Este ponto era como líder com a pressão de mexer em cima trabalho que não é a ia área e ao meu ver, minha dupla de criação tinha o feito muito bem.

E sim, estou observando-a todo esse tempo, com imparcialidade, é claro. Mesmo que o conceito de imparcialidade estivesse um tanto deturbado em sua mente agora. Voltei ao andar do estúdio vendo ao longe uma das duplas já iniciando seus trabalhos, não havia muito o que se fazer a não ser esperar. Respirei fundo enquanto meu copo era levado inconscientemente até a lanchonete montada ali esperando que a água que tinha colocado em uma xícara esquentasse na chaleira elétrica, quando a mesma apitou peguei um sachê de camomila e o mergulhei no recipiente já em minhas mãos. Encostei meu quadril na bancada e soprei a água que tremeu com a pressão do vento em meus lábios, observei meu reflexo em meio a fumaça e sorri.

— Tá estressada? Porque camomila não acalma ninguém, segundos médios. — Ela vinha com as mãos nos bolsos e agora estava de óculos, provavelmente tinha pegado na área de acessórios. — Eu posso ficar com isso depois? Ficou bom em mim não acha?

Inclinou-se para frente até o nível do vidro do ar condicionado e formou um bico em seus lábios e o torceu algumas vezes. Rolei meus olhos até sua figura minimamente e neguei com a cabeça escondendo um sorriso com as palmas de minha não livre.

— Porque você é tão criança, Byul-Yi? — Soltei a xícara ao meu lado apenas para me apoiar com as mãos no mármore. — Lhe conheço a uma hora e já não aguento mais. E não, você não pode ficar com os óculos.

— Vai ter que aguentar por seis anos. — Ergueu seu corpo e caminhou até minha frente deixando sua risada morrer assim que seu olhar fotográfico passou por mim como o laser de um raio x, levou as mãos até as abas do chapéu arrumando as ondas para o lado contrário que eu estavam. — Hm... Assim está melhor. Todos os seus lados são bons então ele tem que estar bem aberto.

Ela tinha a postura perfeitamente ereta enquanto meu corpo continuava encostado na bancada, foi impossível não notar seu sussurro sobre minha fotogenia sem perceber que sua voz tinha ficado surpreendentemente rouca, familiar eu diria, mas de onde? Nunca havia lhe visto ou conversado antes deste dia em questão; talvez o nervosismo por ver as outras nervosas estava afetando minha memória, pois ela não tinha registro algum da mesma.  Afastou-se timidamente e então pude arrumar minha postura, cruzei os braços e me abanei pelo calor que todas as luzes faziam meu corpo sentir, não sabia em que pé estávamos mas eu não podia derreter logo agora.

E nem era de uma maneira agradável e prazerosa.

Foi o que me levou a pensar que meu prêmio por um dia totalmente diferente e intimidador era ter uma boa noite de porre, aonde, eu sabia muito bem. Esfreguei minhas têmporas  e fechei meus olhos por alguns momentos, uma voz gritou o número dez e enfim tive a certeza de que tudo isso estava prestes a acabar e eu poderia deitar na minha cama tranquila ou na poltrona da Fetish. Meu corpo acordou de pequenos sinais de cansaço da noite anterior que passei em claro e então, levei um susto por um som grave que englobou todo o estúdio.

Havia um motivo pelo qual não se podia ouvir música em estúdios de fotografia. Primeiro: Os cliques efetuados pela câmera tinham um tempo certo que era dado pelo bifurcador por isso o som que saia delas é tão importante, para saber que o tempo foi atingido e a qualidade também. Segundo: Poderia atrapalhar o foco da modelo (no caso essa que vos fala), de quem estava rebatendo a luz e até do cenário vaso fosse um bass muito alto que tremesse as paredes. Terceiro: Não tínhamos colocado isolamento acústico neste andar pelos motivos cotados anteriormente.

Byul-Yi estava descendo de uma das cadeiras giratórias que levou até ali para alcançar o soundbar acoplado a parede e então me perguntei quem tinha colocado aquilo ali. Se foi ela, estava realmente audaciosa, não tinha medo que eu a desclassificasse como todas as outras? Ao pular do móvel foi ao cenário minimalista que construiu com corres calmas, movimentando suas pernas e caminhar com a batida da música. Não parou quieta nem mesmo ao trocar a lente de sua câmera, estava dançando exatamente como mostrava o vídeo que pertencia a música e que se passava em um dos computadores. Os quadris e as pernas movendo-se em círculos que subiam até a cabeça que se movimentava com a batida que agia estava mudando.

— Kim Yongsun? Última chamada. — Rodeou a fita que envolvida a câmera em sua mão e então me olhou com um sorriso torto. Todos só redor estavam rindo e não era pra menos, seu show não parava e seus passos eram no mínimo desajeitados. — Baby, don’t stop Come on, come on, come on, come on, come on... — Chamou-me com o dedo sincronizadamente a música. A equipe e as outras que sobraram na sala ficaram um coro de Baby, don’t stop, completamento aquela parte em que cantou alto. Prendi um riso. — Isso aí, vocês já entraram no clima. Fique paradinha ali no meio.

— Odeio você. — O som estava tão alto que eu precisei falar um pouco mais alto enquanto a mesma assobiava e até sorriu enquanto eu me posicionava no ligar marcado com fita durex.

— Não quero que você me ame, oras. Olhe pra mim e não para a lente. Quero que seu olhar seja capaz de penetrar até o escudo da polícia tática de Nova Iorque. — Encaixou a câmera em seu rosto enquadrando-me aonde lentamente se aproximava do meu corpo. Acenou com a cabeça e enquanto ergui minha mãos para pôr em prática o que conversamos. — Isso, muito bom... Virei um pouco mais para a esquerda — Assim o fiz erguendo meus olhos até os dela que estavam animados, o que me deu um pouco mais de ânimo. Ela continuava assobiando a droga da música. — Junte mãos as mãos até seu rosto e olhe para frente,  chubby cheeks. Woah!

— Eu vou matar você depois disso. — Murmurei entre dentes o que a fez rir com a garganta travada.

— Minha família vai ganhar uma indenização e tanto. — Molhou os lábios e sem querer acabei rindo. — Preciso de uma fresta de luz no rosto dela. Diminua a iluminação quatro por cento. Obrigado.

Parecia deus, aonde tudo que saia de sua boca era ouvido por todos e como num encanto todos queria obedecer, inclusive eu.

— Temos o suficiente. — Fechei meus olhos com força quando a vi relaxar a câmera em sua mão e chegar até mim com o visor virado em minha direção. — São pares muito bem feitos. Vê como seu sinal deixou você mais charmosa? É até um sacrilégio não mostrá-lo. Não será preciso fazer muitas edições, só vou deixar uma colorida pra o caso de querer usar como capa.

— Sim sim, esta eu acho que ficaria legal colorida. — E não estava mentindo. Ela concordou com a cabeça mexendo em seus anéis. — No fim das contas, foi um bom trabalho.

— Vindo de alguém como você, eu realmente aprecio. — Ela não fez nenhuma piada a mais, pediu para cortarem o som e então salvou as fotos no cartão. Curvou-se formalmente para mim e sorriu logo após. — É uma honra, mesmo você tendo risada de golfinho.

Relevei segurando em um de seus ombros para retirar meus saltou e mesmo querendo crava-los nos miolos daquela mulher, seria um desperdício de talento.

 
Relevei segurando em um de seus ombros para retirar meus saltou e mesmo querendo crava-los nos miolos daquela mulher, seria um desperdício de talento

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.


FeticheOnde histórias criam vida. Descubra agora