O almoço fornecido tinha sido todo e completamente orgânico, nossas escolhas com a alimentação saudável dos novos funcionários era muito rígida e mesmo que se tratassem de uma forma terceirizada eu estava sempre por dentro dos cardápio flexíveis que eram trocados a cada semana na parede do refeitório. Hoje, por exemplo, deixei com que que tudo fosse mais gorduroso e receptivo aos candidatos que, afinal a primeira impressão é a que fica; macarrão ao molho branco, bife grelhado, arroz de algas e kimchi para quem quisesse. Troquei de roupa o mais rápido possível para que não perdesse os primeiros minutos da comida quente e recém saída do forno, como era meu gosto, mas alguns compromissos me chamaram antes que eu pudesse perceber que estava faminta e desde a manhã de hoje não comia nada.
Fui diretamente até minha sala fechando todas as persianas que haviam ali, deixando apenas a minha pronta para o mundo. Eu podia viajar a qualquer lugar apenas olhando a parede que vidro que só minha sala tinha e fazia questão de deixá-la brilhando o quanto podia para que qualquer pessoa sentisse a vertigem dos oito andares abaixo de seus pés, mas eu, apenas suspirava vendo a movimentação dos carros na avenida, mais ao fundo o rio e atrás dele o sol preguiçoso afirmando que nosso dia estava prestes a terminar. Bom, o meu ainda estava apenas no começo; um dia aonde eu não estou exatamente exausta, com as costas doendo e sem as lentes de contato por ter me irritado com o desconforto delas, não era um dia aonde Kim Yongsun tinha dado tudo de si. Virei-me para dentro da sala aonde seis pessoa sem olhavam com certa curiosidade e impaciência mesmo que o cronograma estivesse dentro do horário, talvez um pouco mais adiantado do que pensavam. Tinha certeza que sequer leram os que lhe foi enviado, com isso eu tinha sempre minha parede de avisos cheia de postites e meus afazeres profissionais cravados nela. Minha mesa me separava deles e possuía Wheein em seu meio que tinha acabado de colocar os resultados impressos a laser de todos os candidatos. O representante da área de publicidade tinha achado de chegar e como tudo se englobavam e teria que conversar, não poderia deixa-los de fora.
— Bom, senhores e senhoras. Analisei todos esses resultados com cautela. — Espalmei minhas mãos no vidro e olhei o rosto de cada um dos que estavam a minha frente. Eles não queriam saber de arte, muito menos de composição técnica fotográfica, queriam apenas nomes. — Estes são os cinco que sobraram. Devo dizer que todos os que trabalham aqui votaram em seus favoritos, nós computamos estes votos, avaliamos por cima deles e aqui está. — Separei os confirmados dos rejeitados e então, lhe espalhei os nomes que estavam esperando para que pudessem anunciar em suas redes sociais e afins. — Todo o processo está sendo filmado por nossa equipe, estamos fazendo live para os assinantes e destas gravações iram se derivar vídeos para nosso canal no YouTube. Também recolheremos depoimentos das celebridades convidadas para melhor experiência de nossos...-
Ouvi uma garganta sendo forçada e então parei meu discurso sentando-me em minha cadeira, ficando no mesmo nível que eles. Era Dong-hae, um jovem herdeiro de uma das maiores rádios de entretenimento do país no momento, tinha também boa parte do mercado da moda em formato de botiques, eu mesma tinha sido modelo de uma delas; tinha ganhado alguns prêmios como administrador, apresentador e outras coisas que mal me lembro, não costumo gastar meu tempo fuçando coisas idiotas que homens fazem. Cruzei minhas pernas e pus meus óculos novamente em meu rosto, suspirei após respirar profundamente.
— Sim? — O respondi minimamente voltando meu olhar ao dele que estava com os materiais em mãos.
— Desculpe-me, Sra. Kim. Mas observando suas escolhas, percebo que só existe um perfil masculino. — Recostei minhas costas na cadeira lançando um olhar até Wheein que já me respondia com um imperceptível balançar de pescoço. Ela queria dizer sei que ele é um babaca, mas seja gentil. Ela odiava escrever notas de esclarecimentos sobre brigas minhas com alguns certos acionistas. — E também vejo em um dos currículos que uma das candidatas está envolvida em movimentos imorais como direitos para a comunidade LGBTQIA+
Ao menos ele havia aprendido a soletrar.
— Não vejo aonde uma coisa se assemelha ou se encontra com a outra, meu caro. — Brinquei com minha caneta dourada em mãos que passava por meus dedos rapidamente, como se fosse uma moeda de ouro. Sorri torto levantando meu corpo com as mãos no bolso da minha calça jeans rasgada, encostei meu quadril a frente da plaquinha com meu nome me aproximando mais de quem me questionava. — Uma vez que todas as pessoas que estão aí, demostraram extrema capacidade de liderança, empatia, conhecimento e experiência de técnicas de fotografia. E ainda posso assegurar de que de agora em diante vamos nos posicionar sobre quaisquer questões sociais incluindo a que citou, já fazíamos isto antes mas agora, vamos contribuir para que pessoas continuem vivendo com o máximo de direitos possíveis.
Levantou do sofá rindo, jogou as fotos de volta em minha mesa e fechou o único botão que seu blazer tinha com apenas uma mão, pensei em como homens achavam que aquilo era charmoso assim como o patético e clichê preto e branco e ainda insultava a combinado colocando uma fragata slim azul marinho que desconversava com tudo ali. Quis rir de uma "elegância" mas agora, eu tinha que prestar atenção em todo o seu discurso de menino mimado rico e que tinha raízes formadas nos conceitos da antiga Coreia.
— Isto é cavar a própria cova, Yongsun. Os jovens coreanos não estão preparados para isso, não vai saber como lidar com essa sua investida estrangeira tão forte e marcada assim. — Estava travando uma batalha visual comigo, seus olhos se prenderam aos meus mas vai cair daqui a alguns segundos. — Eu me recuso a aceitar que meu dinheiro está sendo investido em algo que vai contra os meus princi..-
— Que bom que tocou no assunto, Dong-hae. — Virei minha cabeça até Wheein dando-lhe confiança para adentrar até a área em que estávamos. — Quanto o senhor aqui tem disponível em nossa revista?
— Trinta por cento. O que convertendo em dólares deve dar não mais do que dois milhões. — Checava as informações no tablet que vinha em seu rosto com uma luz digital azul, balancei a cabeça algumas vezes passando uma de minhas mãos por meus fios ainda platinados mudando-os de lugar.
— Ótimo, eu compro. — Ele pareceu não acreditar em minhas palavras e embora um sorriso tenha surgido em meu rosto na mesma hora em que desferi aquelas palavras, estava falando o mais sério possível. Eu não era burra, sabia que estaríamos entrando em uma grande e dissimulada blacklist, mas a sua linha de rádio não era a única interessada em me ter como MC. Ele pôs as mãos nos bolsos tentando conter sua surpresa. — Então, o senhor pode se retirar da minha sala, agora que não temos mais nenhum vínculo. Minha assistente irá fazer a transação dentro de alguns minutos, caso queira esperar, temos bife grelhado no refeitório.
Ele pegou sua pasta de couro marrom desbotada e antes de abrir a porta e passar pelo umbral, deixou suas últimas palavras estúpidas.
— Você nunca mais vai pôr seus pés imundos na minha rádio. Vai se arrepender disso, junto com sua espelunca.
Bateu a porta e então neguei com na cabeça fazendo sons de reprovação com minha língua vendo que a mais nova ao meu lado sorria radiante.
— Acho que ele se sente um pouco magoado por ter pego você com aquela modelo depois de negar jantar com ele. — Ela sussurrou desligando o aparelho em suas mãos e me fazendo rir.
— Bom, acho que estamos conversados, sim? Acredito que não existam mais objeções sobre isto. — Arrumei minha coluna ereta novamente assim que todos concordaram com minhas próximas ideias e logo apertei a mão de todos que com certeza, desceram alguns andares para aproveitar a bela comida que estávamos disponibilizando. — Puppy... Ainda tem muita coisa pra se fazer hoje? Eu estou um caco, olha só minhas olheiras.
— Você tem que dar a notícia aos candidatos após o almoço quase jantar deles. — Descansei minha cabeça em seu ombro revendendo um pequeno carinho em minhas bochechas e logo um aperto nas mesmas. — O dia foi difícil pra você desde que começou a seleção, mas está se saindo bem, Sun.
Se eram palavras de Jung Wheein eu acreditaria cegamente. As vezes pensava que a Solarsido era tão dela quanto minha; a pequena tinha me ajudado em basicamente tudo até aqui, desde o nome da marca e patentiação dela até a compra do prédio e a reforma do mesmo com mais alguns andares e mimos que deixariam todos felizes em trabalhar ali como realmente era. Se preocupava com cada detalhe seja comigo em nossa vida pessoal até coisas pequenas como tratar de uma transação bancária.
Devo muito mais do que posso pagar.
Saiu da posição e então voltei a realidade em que estávamos vivendo. Desci até o hall de entrada com a prancheta na mão com os nomes dos selecionados, observei todos descontraídos, muito diferente daquele time isolado e tímido que recebi pela manhã. Estavam cantando e alguns grupinhos tinham se formado inesperadamente, com tantas diferenças entre si a arte de cada um unia a todos. Eram realmente filhos da arte e isso era mais um motivo para que nós não desistíssemos dela. Byul-Yi vinha conversando animadamente com a que se não me engano era Seulgi, pareciam amigas de longa data o que era no mínimo estranho, dado ao fato de que estavam convivendo a apenas um dia, ou menos que isso. Todos pararam a minha frente num aglomerado que parecia perto de nada se os funcionários não estivessem no final do expediente, mas resolveu se apressar porque precisava realmente limpar sua cabeça e deitar.
— Hoje foi um dia realmente longo. E antes de mais nada eu quero agradecer por todos terem se disponibilizado a vir aqui e ter mostrado seus trabalhos. Muito obrigado. — Fiz uma pausa curta quando ouvi algumas palmas de quem estava ali vendo e gravando também, como nosso editor chefe que cuidada do canal no YouTube. — Os funcionários atuais da revista votaram, as modelos também, me incluindo e agora vem o veredito. — Passei algumas páginas da prancheta com rapidez, queria finalmente ver os rostinhos que iriam me acompanhar até outro dia mais longo ainda. — Quem fica conosco são: Kang Seulgi, Shin Ji-Min, Song Yuqi, Hwang Hyunjin e Moon Byul-Yi. Parabéns aos classificados e muito obrigado aos que nos deixam, continuem trabalhando duro e tenho certeza que verei os nomes de todos brilharem.
Os cinco me cumprimentaram de longe, sorri com a felicidade de todos pois não apreciam acreditar na notícia que eu tinha acabado de anunciar. Guardei a prancheta atrás da bancada das primeiras atendentes no hall já ouvindo algumas coisas como "nunca achei que conseguiria", "parabéns, unie", "vai dar tudo certo, não desista". Era satisfatório saber que ninguém estava magoado e que todos se esforçaram para dar o seu melhor. Como uma funcionária qualquer, coloquei minha máscara descartável e retirei minha bolsa de um dos armários aonde era permitido guardar bens, joguei em meu ombro e esperei que todos seguissem os seguranças até o lado de fora. Espreitei meus olhos até a mulher de cabelos coloridos e puxei seu braço de maneira suave, não queria parecer bruta e já não tinha forças para tal.
— Folgada. — Soltei uma risada curta em deboche tirando os óculos de seu rosto lentamente, tentando não machucar.
Ela apenas riu curvando-se a mim até passar pela porta, estava radiantemente sorridente o que por alguns segundos me contagiou tanto que quase esqueci que estava cansada demais para fazer qualquer coisa. Menos se separar com os letreiros coloridos piscantes da Fetish. Não era um será que eu ainda aguento? Eu sempre aguentaria mesmo que meu dia tivesse mais de vinte e quatro horas.
∆Moonbyul parecia estar flutuando por algum campo de flores inexistente na selva de pedras que era a avenida em que a sede da Solarsido estava localizada, deixou que aquela euforia em seu peito se transformasse em alguns gritos assim que dispensou a carona que Seulgi a ofereceu com sua moto. Encheu seu peito de ar e com um sorriso em sua expressão facial soltou alguns gritos sem se importar com as poucas pessoas que restavam nas calçadas enquanto andava. Recebeu alguns olhares reprovadores de outros jovens quando passou por uma praça mas não se importou, estava muito perto de realizar um de seus maiores sonhos desde que saira da casa de seus pais juntamente com o término das faculdade. Parou próximo a um poste e encostou-se no mesmo ainda sorrindo e um pouco ofegante por ter percorrido uma certa distância de onde estava. Tirou o celular do bolso da calça e tentou incessantemente ligar para Hyejin que não atendeu, mas mandara uma mensagem dizendo que não passaria a noite em casa, ficaria no trabalho por conta de alguns problemas que surgiram, mas iria dar um jeito de chegar em casa antes que ela saísse par a segunda fase da seleção.
Em áudio, pareciam compartilhar do único e último neurônio existente em seus cérebros, parabenizou a amiga mais velha com mais gritos que foram cortados pela voz de sei chefe ao fundo, mas nada que atrapalhasse a mini comemoração de ambas. A Moon sentiu-se um tanto triste por não poder compartilhar a grande notícias com as pessoas que mais amava, dado ao fato de que as horas tinham se passado rapidamente naquele dia e seus pais, provavelmente estariam dormindo. Suspirou não querendo deixar com que aquele detalhe lhe tirasse a vitória dessa luta e a proximidade mais e mais rápida de vender a guerra.
Ergueu seu olhar até a identificação da rua e também dos dois quarteirões mãos próximos e acabou percebendo que estava perto daquela se transformara em uma de suas boates favoritas a uma semana atrás.
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Fetiche
FanfictionQuando a dona de uma das mais conceituadas revistas da Coréia, volta a praticar seu antigo hobby: voyeurismo. O quão patético seria apaixonar-se por uma da pessoas que passava por sua cabine todas as noites, mesmo que não pudesse ver seu rosto? Até...