Estou sozinho, largado neste mundo terrível.

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Os médicos deram o horário das mortes entre 00:01h e 00:30h.

Ligaram para meus pais que voltaram imediatamente quase que já esperando algo acontecer. Mas não isso.

Após saberem a causa da morte olharam para mim apenas uma vez, e eu vi, vi ódio, vi dor, vi a alma e o desespero dos pais que acabaram de perder a filha mais nova e era tudo culpa minha.

Eu já não conseguia mais chorar, porque estava desistrado de tanto que já havia feito isso ao lado do corpo da Kathe enquanto esperava pelos bombeiros chegarem. Mas me recusava a beber água.

Os pais dos meus amigos foram chegando ao hospital aos poucos. Médicos pediram para eu ficar em um corredor vazio para evitar conflitos entre os pais. Eu simplesmente balancei a cabeça e o acompanhei até o corredor. Sentei-me no banco e fiquei lá.

Chorei mais um pouco, mas chorei em silêncio. Não queria atenção, não queria consolo, tudo que queria era um tempo. Eu merecia a dor que estava sentindo, merecia muito mais. Eu deveria ter ido não eles.

Se eu tivesse me recusado a ir, Kathe não entraria na água e eles não teriam mergulhado para ajudá-la.

É tudo culpa minha. Eu sou um monstro. Porque não morri também? Eu deveria ter morrido nao eles. Não meus amigos, não Kathe.

Um médico veio me examinar, perguntou se estava bem eu disse que sim. Eu queria ser atendido, não queria que me notassem aqui. Eu só queria.. queria eles de volta.

***

Após algumas horas meus pais apareceram no corredor e eu já soube que era para ir-mos embora.

Esperava uma bronca ou coisa do tipo, mas nada aconteceu. Eles não falavam, não me olhavam, e eu entendi a porque.

Saímos do hospital e fomos para casa. Ainda sem nenhuma palavra ou olhar. Isso me assustava, mas eu compreendia, e merecia.

O cansaço me forçou a dormir aquela noite.

De manhã tudo estava quieto. Passei pelo quarto de Kathe e não aguentei. Chorei silenciosamente mais uma vez. Tinha café mas eu não queria. Não merecia comer. E meus pais ainda não olhavam para mim.

Tomei um banho e vesti-me de preto.

Fomos ao velório e enterro de todos aqueles que morreram por minha causa. Fiquei num canto. Sei que se chegasse mais perto dos caixões os parentes não gostariam, então sofri por eles sozinho num canto. Largado.

O caixão de Kathe era o mais lindo. Era pequeno e pintado de rosa. Tinha uma fita branca que formava um laço e lembrava um presente.

Kathe queria ser um anjo, e agora ela era um. Não me orgulhava disso. Mas desejava que fosse feliz onde estivesse.

***

Após os enterros as familias de todos se reuniram em um almoço na casa dos pais de Henry. Eu não fui, aquilo não era pra mim.

Meus pais deixaram almoço pra mim e eu fui obrigado a comer , por mais que não quisesse eu não poderia morrer de fome.

Passei todo o fim de semana no quarto. Chorando, olhando pro teto, sentindo falta de Kathe me pedindo uma história, e dos meus amigos me chamando pra sair. Mas nada disso voltaria a acontecer.

Eu estava sozinho, largado neste mundo terrível. Sem amigos, sem família, sem qualquer vestígio de felicidade. Talvez nunca mais voltasse a ter.

A Cura Está Na Morte.Onde histórias criam vida. Descubra agora