Continuação Capítulo 18

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Respirei fundo, tentando manter a calma.

_ Você está bem? _ Doutora Rose perguntou preocupada.

_ Preciso resolver uma coisa e tem que ser agora.

_ Tudo bem... Podemos deixar para outro dia...

Coloquei os sapatos e saí a deixando falando sozinha.

***

_ Ele está logo ali. _ a enfermeira apontou para um senhor, sentado à mesa, solitário perto da janela.

Eu me tremia por inteiro, mas nós precisávamos ter aquela conversa.

Me sentei em uma cadeira de frente para ele.

_ Pai?

Ele desviou o olhar da janela, olhou pra mim e sorriu.

_ Ravi... Você veio me visitar. Sua mãe me falou que uma hora ou outra você viria.

_ Ela ainda fala com você?

_ Todos os dias.

_ Como você está?

_ Agora estou feliz. Você é o único que não vem me visitar, até seu irmão aparece de vez em quando.

_ Você tem tomado seus remédios direito?

_ Todos os dias. Elas são pontuais, não esquecem um dia e nem perdem a hora. Elas são muito chatas.

_ Elas só estão fazendo o trabalho delas.

_ Quando você vai me tirar daqui?

_ Eu não tenho esse poder, pai.

_ Como não? Você é médico, não é?

_ Sim, mas não sou psiquiatra. Não posso te dar alta.

_ Por que me colocou aqui? Todo mundo foi contra! Inclusive sua mãe e seu irmão.

Eu ri.

_ Era necessário.

_ Você é ingrato demais!

_ Pai...

_ Fala logo o que você veio fazer aqui porque eu não quero ficar perdendo meu tempo com você!

Respirei fundo.

_ Naquele dia, que eu cheguei da casa da tia Jacira, o senhor tentou me impedir de subir, porque o senhor sabia o que estava acontecendo. Por que o senhor não queria que eu descobrisse? Por que encobriu eles?

_ Eles estavam apaixonados.

_ Como assim pai? Eu estava apaixonado por ela! Eu fazia planos com ela! Eu era o namorado dela!

_ Você estava terminando a residência, focado em terminar a sua pós, com vários planos, com um futuro promissor pela frente.

_ O meu futuro promissor era mais importante do que a minha felicidade?

_ Você não é feliz?

_ Feliz? Minha vida é um fiasco! Eu passei os últimos oito anos da minha vida me julgando, me culpando, me martirizando, me condenando! Felicidade não existe no meu dicionário.

_ Eu sinto muito por isso.

_ Sente pelos socos que me deu também? Sente por tudo o que o senhor fez comigo? Sente por ter desgraçado a minha vida ao invés de ficar ao meu lado e me apoiar? Um diploma de doutor na mão foi o suficiente para me garantir um futuro feliz pai!

_ Sinto muito meu filho.

_ Não sente nada! O senhor é um hipócrita!

_ Tudo o que eu fiz foi para o seu bem. Eu queria que você tivesse futuro, realizasse o seu sonho.

_ Mentindo pra mim! Encobrindo o caso da minha mulher com outro! Debaixo do mesmo teto que eu, na minha cara! Não dá para entender essa lógica!

_ Me perdoa meu filho.

_ Teríamos que voltar em pelo menos 10 vidas para eu conseguir perdoar o que o senhor fez.

Ele abaixou o olhar e eu me levantei.

_ Desde quando eles tinham um caso?

_ Eu não sei.

Coloquei minhas mãos sobre a mesa e me inclinei.

_ O senhor sabe sim! Me diz? Desde quando eles tinham um caso, porra! _ me exaltei e todos olharam para mim.

_ Eles se apaixonaram no dia em que se viram pela primeira vez.

_ Filho da puta! _ bati na mesa _ E vocês me enganaram durante todo aquele tempo por quê?

_ Eu já te disse os meus motivos.

_ E ele? Por que não tomou iniciativa de me contar que estava apaixonado pela minha namorada?

_ Porque eu não deixei.

_ E por que ela não terminou comigo?

_ Porque ela não prestava! Porque ela fazia a cabeça dele! Talvez ela gostasse de você também. Não sei os motivos dela!

Eu o segurei pela camisa fazendo ele levantar da cadeira.

_ O senhor desgraçou a minha vida! Eu te odeio.

Dois enfermeiros me puxaram para trás, um de cada lado.

_ Eu odeio o senhor com todas as minhas forças! _ gritei enquanto eles me tiravam dali.

***

Entrei em casa e subi as escadas correndo.

Abri a porta do meu quarto e olhei ao redor.

Estava tudo exatamente igual a oito anos atrás.

Meus pôsteres do Linkin Park presos na parede, meus livros de medicina sujos de poeiras na estante e minha bola de futebol jogada no canto do quarto.

Era impossível controlar as lágrimas que insistiam em escorrer pelo meu rosto.

Com calma, andei até a minha cama e me sentei.

Abri a gaveta do criado mudo e tirei de dentro uma caixinha.

Minhas mãos tremiam, mesmo assim eu consegui abrir.

As alianças que ali estavam não pareciam ter sofrido com o passar do tempo. Elas ainda brilhavam.

Passei alguns segundos olhando para elas e tentando digerir tudo o que tinha acontecido.

Comecei a questionar se eu estava fazendo o certo, deixando vir à tona todos esses sentimentos que eu me esforcei tanto para guardar dentro de mim.

Talvez minha vida tivesse sido um grande pesadelo e se eu acordasse agora, tudo estaria normal e eu voltaria a ser feliz ao lado dela.

Deitei em minha cama com a caixinha na minha mão e fechei os olhos.

Senti quando minha mãe se aproximou e se deitou ao meu lado me abraçando e eu aproveitei para me aninhar. 

Dr. RaviOnde histórias criam vida. Descubra agora