Capítulo 14 - Danielle Souza

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O som do vazio

Abro os olhos e vejo a imensidão. Por um momento, penso que estou flutuando no infinito, e consigo ver as partículas minúsculas de poeira flutuarem sob o nada. Minha mente está turva e uma penumbra se apossa dela repentinamente. Sinto meus braços caídos, as pernas dormentes e o corpo submerso. Sinto a água subir e cobrir cada vez mais o meu corpo; está tudo tão leve.

Minha mente, então mergulha em lembranças. Lembranças dolorosas e distantes, mas que ao mesmo tempo parecem tão perto. Uma jovem sentada num banco, solitária. Ela está imóvel. Seus olhos são caídos e sua expressão é de vazio. Vejo outra imagem, uma mais recente. Vejo alguém sentado numa mesa com muitas outras pessoas conversando e comemorando. Todos estão sorrindo e felizes; ela também está sorrindo. E para os presentes que a vêem sorrindo, nem ao menos se lembram dos inúmeros problemas que ela passou, apenas sorriem de volta.

- Ela está sorrindo, então deve estar feliz. Está tudo bem! – é o que dizem.

Está tudo bem. Tudo vai ficar bem. É o que minha mãe costumava dizer, que tudo ficaria bem, desde que eu erguesse a cabeça e mantivesse as aparências.

- Não seja negativa. Você precisa ter iniciativa na sua vida, você precisa se levantar e fazer algo da vida. Olhe para todos, se eles conseguem, você também.

Eu sei que no fundo, ela apenas deseja o meu bem, mas essas palavras não se tornam motivadoras, apenas me derrubam cada vez mais e me deixam com o peito apertado. É muito doloroso. De repente, memórias do passado me invadem, e eu não consigo suportá-las. Vejo as meninas da escola, populares em seus uniformes e lindas, chamam a atenção. Contudo, eu chamo a atenção delas, pois não sou relativamente magra como elas.

- Por que você tem de ser assim? – uma delas pergunta.Por que? Por que? Por que eu tenho de ser assim? Me sinto um monstro horrível, nojento e asqueroso, como se ninguém conseguisse me encarar e me suportar. As lágrimas me vem aos olhos e caio num choro silencioso. Meus soluços são inaudíveis, estou sozinha.

Vejo um rosto conhecido. É minha irmã. Ela acaricia meu rosto e deita minha cabeça em seu colo, me conta suas histórias fantásticas e eu me sinto vivendo em outro mundo. Ela me acalma, me escuta, me entende, me respeita.

- Quer conversar? – ela me pergunta.

- Hoje não.

- Está bem, quando estiver bem e precisar, eu estou aqui.

- Eu sei.

E voltamos a conversar sobre programas de tv, música e muitas coisas engraçadas. Ela me faz rir e poderia passar o tempo todo conversando com ela. Ligo para ela todos os dias e ouvir sua voz me alivia a alma, uma pena ela morar longe. Perto, mas longe para mim. Ela me estende a mão e eu tento segurá-la. Não consigo. Meu corpo se retrai. Eu quero segurá-la, mas não consigo.

- Não vale a pena. – diz minha mente.

A água cobre meu rosto e fico por inteira submersa. Não há ar, não há conforto, não há esperança. A escuridão me alcança e tudo fica escuro. Não consigo ouvir meus gritos, há apenas... o vazio. Fico quieta e tudo fica quieto.

Silêncio. Minha alma se apaga, meu coração enfraquece. Vazio. Dor. Silêncio.Quero partir agora, e nunca mais voltar. Nunca mais despertar nesse mundo. E assim vou.Tudo está calmo e escuro. Fecho os olhos. Acabou.

- Vai doer no início, mas depois você ficará bem. – diz minha mente.

Tudo vai ficar bem. Meu corpo flutua no vazio, e quando estou partindo, algo acontece.Sinto um puxão, e o ar volta a entrar em meus pulmões. Sinto uma dor terrível e lancinante, e minha mente se embaça com a confusão do mundo.

Abro os olhos. Vejo minha irmã sobre mim, chorando e em desespero. Ela me envolve em toalhas e ao invés de me fazer perguntas ou me censurar, ela beija minha testa.

- Vai ficar tudo bem. Eu estou aqui.E eu a abraço com força e em lágrimas.

Eu a amo.

Texto escrito por:

User: DonneLettori

Danielle Souza

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