Eros e Psique por Paula Dunguel

Eros e Psique - cap XV

Zeus convocou Têmis, deusa da justiça, e a fez sentar-se em seu trono. Um julgamento no Olimpo estava por vir. Algo que não acontecia há muito tempo. O soberano dos deuses se postou ao lado direito dela e sua esposa Hera ao esquerdo, no aguardo dos demais.
Os deuses foram chegando um a um e surpreendem-se com a recuperação de Eros e a presença de Têmis. Até sua mãe:

- Mas o que significa isso? O que Têmis faz aqui? E tu, Eros? Deverias estar de cama...

- Ora e por quê? Ele me parece muito bem! - desdenha Atena aproximando-se. - Quer aprisionar teu filho para sempre, Afrodite querida?

- Ora! Cuide da tua vida que do meu filho cuido eu, mal-amada!

- Ora, sua desfrutável, como ousas?

- Calem-se as duas! - grimpa Zeus. - Respeitem a presença de Têmis. - Trovões ribombam no firmamento e as deusas se calam.

- Hermes, meu fiel mensageiro, quero que faças uma coisa por mim - fala o rei do Olimpo.

- Ordenai, senhor, pois de pronto hei de obedecer-vos.

- Traga a mortal Psique até aqui.

Os deuses espantam-se. Nunca à uma criatura mortal, foi permitido pisar, com seus pés, uma reunião vespertina no monte Olimpo.

- Isto é um absurdo! - protesta Afrodite.

- Quem manda aqui, acaso, vós ou eu? - retruca-lhe Zeus.

Hermes cumpre a ordem dada e rapidamente, traz Psique até a presença dos deuses. Zeus acolhe a moça com um sorriso amistoso. Logo um burburinho faz-se ouvir entre todos eles; alguns perguntavam-se o que ela havia feito de tão nobre para merecer estar ali. Entretanto, os que a auxiliaram de alguma forma, sorriam.
Psique consegue visualizar cada um deles. Seus olhos se encontram com os de Deméter, Pã e todos os outros que a ajudaram a trilhar o seu caminho.

O crepúsculo se avizinhava e um mar de nuvens brilhantes, vermelhas e alaranjadas, cobre a todos. Cúmulos se juntam para formar assento aos deuses. Psique e Eros se colocam à frente de Têmis e dá-se início ao julgamento.

****

O casal expôs diante da deusa da justiça todas as suas queixas. Afrodite também teve direito à palavra no seu momento. Outros deuses que testemunharam o amor dos dois, foram também ouvidos como Apolo, Pã, Deméter, Zéfiro e Aquelau. Todos estes se manifestaram a favor daquela união. Afrodite, àquela altura, já se roía de ódio. Seria realmente humilhada daquela maneira?

Têmis toma a palavra enfim:

- Eros e Psique, o amor de ambos de fato é lindo! Mas em um ponto, tua mãe tem razão, Eros. És imortal, o tempo nunca irá apagar-lhe o viço, a juventude. Já Psique, o tempo irá cobrar-lhe sua conta. Marcas vincarão seu rosto, seus dias de vida estão pré-determinados. Insistes em amá-la mesmo assim?

- Deusa Têmis, eu tenho ciência de tudo isso. Ainda assim, prefiro viver com Psique o tempo que me for permitido, mesmo que breve. Minha vida imortal de nada me vale, se não for ao lado dela.

- E tu, Psique? O que dizes a respeito?

Psique que até então, em respeito à deusa, mantinha os olhos fixos ao chão, ergue seu rosto e ajoelhando-se diante do trono, responde:

- Deusa Têmis. Sei que errei por não confiar em Eros, pôr em dúvida o seu amor por mim. Mas sou humana, sou falha e como relatado aqui, arrependi-me do mal-feito e busquei por ele dia e noite, cumpri três provas a mim impostas. Eu sei que minha vida é breve. Um dia, Tânatos virá buscar-me. Sei que Eros permanecerá depois de finda minha existência porque é um deus; contudo, oh, senhora! Não me negue o direito da companhia dele até minha derradeira hora. O dia que me for, quero poder ter a dádiva de olhar em seus olhos e segurar-lhe a mão no momento do meu último suspiro nessa vida.
Seus olhos enchem-se de lágrimas e os do seu esposo, de igual modo. A sorte deles estava nas mãos de Têmis. O que a deusa da justiça decidisse, teria que ser cumprido.
Os demais deuses também ficaram emocionados e começaram a interceder a favor do casal.

Têmis ergue-se do trono e dá a sua esperada sentença:

- Era tudo que eu precisava ouvir. Zeus... um deus não pode tornar-se mortal, mas o mortal pode tornar-se um deus.

Afrodite ainda tenta contestar, mas Zeus ordena que se cale. A sentença estava dada. Ele manda Hebe trazer para a jovem uma taça e leva-a até Psique, ainda ajoelhada no chão.

- Beba isto, Psique, e sê imortal. Tornar-se-á a deusa da alma a partir de então. Eros não romperá nunca o laço que atou convosco e estas núpcias serão perpétuas - promete-lhe o soberano dos deuses.

Psique olha para Eros e sorri animada e o deus, faz-lhe um sinal para encorajá-la a tomar do líquido. A deusa vencida fica possessa, mas diante da decisão da deusa da justiça e a complacência do deus supremo, nada poderia fazer.

A esposa de Eros obedece e logo, diante dos olhos surpresos de todos os olímpicos, dá-se uma poderosa metamorfose: ela foi envolvida por uma luz dourada que assumiu a forma de uma crisálida.

Os deuses protegeram os olhos diante daquele brilho intenso e quando finalmente acostumaram-se com ele, viram a pupa mágica romper-se e de seu interior renascer uma nova mulher com asas de borboleta e de tal beleza incomum, nunca antes vista em todo Olimpo. Uma formosura de causar inveja às deusas mais belas de todas as eras mitológicas.

- Bem, ela terá que voar para poder acompanhá-lo... - justifica-se Zeus ao perceber que os deuses o olhavam espantados.

Os deuses riram e concordaram.

- Oh, Eros! - exclama Psique feliz e estende-lhe os braços.

- Alma Minha!

Eros abraça sua amada, mergulhados em prantos de felicidade e não mais de tristeza. Cada deus presenteou Psique com um dom, exceto Afrodite que estava vermelha e se roendo de ódio para tanto. Restou-lhe apenas sair do Olimpo e admitir sua derrota.

Hera, esposa de Zeus e deusa da fertilidade e dos matrimônios, abençoou-lhes a união.
Eros e Psique deram-se as mãos e ganharam os céus. Amor e Alma passaram a voar entrelaçados, servindo de inspiração a muitos poetas que, em alusão ao divino casal - que após tantas adversidades, conseguiram vencer todos os obstáculos -, cantam muitas odes em honra de seus nomes, pelos séculos e séculos sem fim.

FIM

E com esse último capítulo, encerro a saga de Eros e Psique.
Amei escrevê-la e agora, tá dando aquele aperto no peito. Sentirei saudade desses personagens que, há semanas, vinha convivendo com eles, contando-lhes sua história. Tentei trazer uma visão diferente, acrescentando mais detalhes à lenda e ela ficar com a minha cara.
Então, pessoinhas amadas? Gostaram? Espero que sim.

Além desta existem muitas mais. Umas com final trágico e outras com desfecho feliz, mas cada uma com sua particularidade e povoaram durante muito tempo a cultura e o imaginário dos povos antigos.

Beijos e nos vemos em breve.