Correspondente da Fazenda | Capítulo bônus 2

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Olhando pela janela, vejo o salso chorão dançando no ritmo do vento, seus galhos que quase encostam no chão balançam lentamente encantando quem quer que o veja. Essa visão me lembra de quando me casei a dois anos atrás. O dia estava como hoje, um sol magnífico, a temperatura boa e o vento lento. O altar foi posto abaixo do salso, seus galhos não estavam tão compridos, foram podados especialmente para meu casamento, mas isso não o impediu de deixar para trás seu esplendor verde, ao contrário, ele estava muito mais lindo do que agora. Me lembro do quão nervosa estava ao vestir meu vestido neste mesmo quarto, tendo esta mesma vista, as montanhas azuladas ao fundo, o verde do jardim e dos galhos do salso, as duas fileiras com três cadeiras viradas para o altar, todas ocupadas pelos poucos convidados - fizemos um casamento discreto, com as pessoas mais importantes. O padre já estava em seu posto quando terminei de me vestir, isso significava que daqui a pouco teria que descer as escadas para ir em direção ao meu noivo - foi um momento tão esperado por nós! Passamos por muitas dificuldades e contratempos, porém, nada disso nos fez perder a fé de que em algum momento não seríamos mais só duas pessoas, tínhamos esperanças de que um dia, neste dia, viraríamos um só. Ao fim do casamento, quando o padre anunciou meu novo sobrenome, pude sentir e ouvir que as pessoas ficaram um pouco surpresas, porém não me importei e nem me importo com o que pensam, me importo em honrar minha família para sempre. Apartir do meu casamento passei a me chamar de Mayla Ohana Blaschke Kirschbaum.

Sinto algo se mexendo em meu colo e olho para baixo dando um sorriso cheio de amor. O ser pequeno em meu colo, parece estar sonhando tranquilamente. Ele teve um dia um pouco corrido, pois é seu aniversário. Hoje ele fez um aninho de vida. Parece que nasceu ontem, me lembro perfeitamente do desespero do Asher ao descobrir que minha bolsa estourou e que estava prestes a ser pai. Um momento eu tive que rir de sua expressão de tão exagerado que ele estava sendo. Não demorou muito para meu, nosso filho nascer. E quando vi meu marido com nosso filho nos braços vindo em minha direção para me entrega-lo, foi como uma explosão de amor e carinho, os olhos do Asher brilhavam e não duvido que os meus estavam do mesmo jeito. Ao pegar meu filho no colo, senti meu peito aquecer e o amor fluir por minhas veias, um pedaço de mim estava diante de meus olhos e isso é o mais impressionante. Eu não tinha dúvidas de qual nome dar quando escutei um choro alto e agudo e a parteira anunciou que era menino, já havia me descidido.

— Já sabe o nome dele, querida? – Asher perguntou passado um tempo que me entregou o bebê.

— Já – disse dando um sorriso e logo olhando para seu rosto — Vamos chamá-lo de Heinz, Heinz Blaschke Kirschbaum, é perfeito para ele. – Admiro a criança em meu colo. — O nome de um homem forte e carinhoso.

— Seu pai iria ficar orgulhoso.

"Sei que ia", penso apertando levemente o bebê em meu colo.

Depois daquele dia foram muitas descobertas, risadas e amor, quase todos envolviam este pequeno ser. Infelizmente a lembrança do seu nascimento, também me lembra o falecimento da mãe do Asher. No dia em que Heinz ia completar meio ano, Jezabel passou mal, tentamos chamar um médico, mas ele não chegou a tempo. Asher passou dias triste, quase nunca ria, nem para nosso filho, o que é raro. Antes dela morrer já morávamos na sua casa, mas pretendíamos comprar outra só para nós, porém com essa infelicidade, Asher e eu decidimos nos estabelecer fixamente aqui. Essa casa pertence a família dele por gerações e não seria justo sair daqui e vender a casa. Com base nessa afirmação tomamos nossa decisão, mais uma geração dos Kirshbaum viverá nesta casa e, se for o destino, muitas outras viverão também.

Sei que aos poucos, dia após dia, estamos criando novas lembranças nessa casa, criando marcas, traçando nossa vida finalmente em paz. Passar a guerra afastada de meu pai, sem poder enterrar seu corpo, e depois passar um tempo afastada de Asher, me mostrou que sou muito mais forte do que pensava, principalmente quando vim para a Polônia. Enfrentei fronteiras guardadas por homens cruéis que não se importam se eu era de seu mesmo país ou não, homens que simplesmente matavam quem pegassem tentando atravessar a fronteira. Foram duros aqueles tempos, mas, felizmente, são passado agora. Muita agonia passei por causa da guerra, tive medo, medo de perder o Asher, medo de morrer... Tenho rezado dia após dia para não ocorrerem outras guerras como essa, seria difícil enfrentar mais outra, e não digo só por mim,  todas as pessoas que conheço não querem que isso ocorra novamente, esse é o pior extermínio que o homem pode fazer consigo mesmo.

Saio de meus pensamentos ao ouvir a porta do quarto abrir rangendo, ouço passos vindo até mim e olho para trás, dou um sorriso quando vejo Asher parado atrás de mim admirando nosso filho em meu colo. Nosso filho! Volto meu olhar para o bebê, ele sorri, provavelmente sonhando seus sonhos mais doces. Queria que esse momento de paz e alegria não acabasse, com Asher ao meu lado, Heinz em meu colo e nós três envoltos em uma bolha de amor que é a nossa vida. Claro, há muito o que vir, mas as vezes me pego ficando ansiosa para saber, como que nós estaríamos no futuro? Nosso filho crescido, correndo pelos campos e nós dois sentados na cadeira de balanço da varanda admirando o por do sol e esperando o próximo dia chegar.

Correspondente De GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora