PRIMEIRO ATO - A CIDADE DOS ESQUECIDOS

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A estrada pela qual íamos estava cheia de buracos, tantos que por duas vezes quase caí do caminhão. Os outros sete que estavam ali comigo pareciam não notar o balançar intenso do veículo:

— Onde estamos indo? — me atrevi à pergunta.

— A cidade. — respondeu o Imediato, curto e grosso.

— O que vamos fazer lá?

— Você já vai descobrir.

Trocamos aquela estrada esburacada por um asfalto liso e ganhamos velocidade. Pouco tempo depois já estávamos andando pelas ruas desertas da cidade. Por causa da guerra muitas cidades havia decretado toque de recolher, o que de acordo com um dos rapazes, facilitaria o nosso serviço essa noite.

Entramos a direita em uma rua e depois a esquerda em uma viela, seguimos reto por uns duzentos metros até pararmos atrás de um prédio feito de tijolos vermelhos. O Imediato e os seis rapazes saltaram da carroceria e começaram a afastar uma pilha de caixotes que estava encostada na parede. Com a ação concluída, revelou-se uma porta de metal que após alguns puxões, abriu-se com um rangido doentio:

— Fique aqui! — ordenou o Imediato para mim.

Assenti.

Os sete atravessaram a porta e logo o ambiente foi tomado pelo silêncio noturno, um silêncio que fedia a medo.

Depois do que para mim foi uma eternidade os seis rapazes apareceram acompanhados por três jovens bastante machucados. Os ajudei a subir.

Foi então que pareceu o Imediato trazendo no ombro um menino. O ajudamos a subir, e ele então repousou o corpo do menino no chão da carroceria. Estava inconsciente, seu rosto estava bem machucado e seu braço direito parecia quebrado. Por ordem do Imediato o motorista do caminhão deu partida e nos colocou em movimento:

— Quem são eles? — perguntei.

— Pessoas como nós!

— O que aconteceu com eles?

— Foram pegos roubando para comer.

Meus olhos repousaram no garoto, devia ter entre dez e onze anos. Passei a viagem de volta inteira observando aquele menino, estava tão imerso em meus pensamentos que não notei o chacoalhar do caminhão ao entrar na estrada esburacada. Só percebi que tínhamos chegado por que os rapazes começaram a descer do caminhão. Fui o último a descer.

Fiquei observando os rapazes e o Imediato levarem os quatro meninos para o navio. Escutei o motor do caminhão ligar e vi que o motorista o estava guardado novamente no galpão. Olhei para o interior da estrutura por extinto, e vi os sete carros e os dois caminhões. Levantei meus olhos e vi a silhueta do Capitão no passadiço do navio.

A CIDADE DOS ESQUECIDOSOnde histórias criam vida. Descubra agora