Round 12

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Sentei nas escadas do ringue. Evitava encarar a plateia que rodeava nossa futura luta. Sempre que meus olhos resvalavam à face de alguém conseguia assistir certa repulsa ou comédia escapar dos rostos. Além dos cochichos que insinuavam piadas sobre a minha aparição. De fato. Surgir mascarado por uma calcinha não faria alguém ser aceito. — Exceto para deixar Yasmin risonha. Ouvi o chamado do meu nome atrás da multidão. Meus amigos ultrapassavam o círculo de piadas para me auxiliar.

— Você está bem? — Soluçou.

— Vou ficar...

— Presta atenção. Você precisa estender os rounds. Use nosso treinamento para esquivar das habilidades dele. — Um arroto.

— Beleza, bafo de cachaça, e qual é a magia dele?

O silêncio ficou pairado no ar. Como se a pergunta estivesse causado um desconforto a todos. Eles fingiam-se de desentendidos. Conversavam entre si sobre assuntos distintos ao boxe. Era como se eu não estivesse ali. Levantei irritado.

— Qual a magia dele!?

— A ma-ma-ma-ma-magia dele é pon-pontaria certeira. El Ju-ju-jubilado não e-e-e-erra golpes.

Segurei desesperado na gola da camisa do Zeca.

— Como eu vou desxviar de alguém que não erra soco!? — Estava assustado. Não irei mentir.

— O treino não era apenas para desviar. Era melhorar a defesa como um todo. — Zeca pontuou.

Baiano entregou a ele duas ataduras. Qual o treinador começou a enfaixar em meus punhos. Assim que as atou esticou a mão na direção do baiano outra vez, e pegou vaselina. Zeca começou a passar no meu rosto.

— Meu negão não deixa aquele mais velho que Dom Corno ganhar de tu não.

O linguajar do baiano sempre me relaxava nestes momentos. Mal ele sabia que se não fosse os insultos oriundos da terra dele eu não seria capaz de chegar tão longe. Além do mais, o X-Tudo Ultra Oriental Kung-Fu nos aguarda. Com o creme cheddar que escorre pelas beiras.

Olhamo-nos como um voto de confiança que estava sendo cedido. Não podia perder ali. Nem por ele, tão pouco por Yasmin. Tinha que me tornar um bom sparing para ela.

Socamos, num toque delicado, as mãos um do outro.

— Torce por mim, desxgraçado.

— Sempre, negão.

Assim que o Zeca pôs as luvas de boxe eu ultrapassei as cordas. Aguardei o soar do gongo no corner. El Jubilado estava lá, no outro canto. Esperava meu enfrentamento. Aliás, pouco falei dele. O veterano tinha pele parda na tonalidade de barro. O bigode parecia chifre de boi, e o cavanhaque como o de uma cabra. — Posso explicar falar desse jeito, mas era bonito. Os músculos do corpo ficavam escondidos sobre os pelos. Eram tão trabalhados e definidos que distanciava entre nós o tempo no ringue.

Um último detalhe. El Jubilado tinha o olho esquerdo vermelho. Como um ciborgue programado para me meter a porrada.

— Ninõ! — A voz melosa atiçava o grito erótico das mulheres na plateia. — Muéstrame do que é capaz.

Olha, não sei muito bem espanhol, mas tenho quase certeza que o dele não passava de um charlatão.

O gongo soou. O grito alvoroçado do público fez meu corpo se defender por impulso. Jubilado não se movia. Eu prestava atenção em tudo no corpo dele. De fato, tinha medo até da respiração. Ele parecia saber do meu temor. O sorriso na cara dizia isso.

Não havia problemas. Tinha que aguentar as porradas dele, e ficar distante o quanto podia. Essa era a minha estratégia. Não a dele.

Jubilado correu em direção. Sem reação foquei em proteger o rosto. Fui trouxa. Recebi um soco no centro da barriga. O golpe expeliu o ar de meus pulmões. A guarda na frente do rosto se abriu por instinto, e logo tomei um soco no meio do queixo.

A verdade que tentei fugir surgiu sem hesitar. Mal bateram trinta segundos no primeiro round, e eu já estava ajoelhado nas cordas. O cronometro contava o nocaute.

— Quédate no chão, ninõ. — Ele me alertou. Encarava-me com assustadora rispidez.

Não era apenas um alerta. O vi retornar ao corner. A distância dos nossos corpos também refletia a disparidade de força. Jubilado era sensacional em todos os quesitos. Tolo fui a acreditar que podia tirar três rounds do veterano.

O Nocaute do X-TudoOnde histórias criam vida. Descubra agora