XII - Primeiro Passo

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Estava sentado na cama, olhando para a estante à minha frente. Mexia uma das pernas, batendo a sola do meu pé descalço no chão de mármore. Revisava o plano todo pela quinta vez em minha cabeça. Quando comecei a ouvir murmúrios distantes vindo do corredor, soube que estava amanhecendo.

Se fosse chutar o horário pela luz artificial do corredor, que como toda a prisão, além dos nossos quartos, tentava replicar o brilho e a cor de uma luz natural, tinha acordado lá pelas sete da manhã. Eu fiquei mais ou menos duas horas esperando para esse momento. Andava pelo cômodo, me olhava no espelho do banheiro, voltava para a cama, várias vezes checando se a toalha que tinha colocado na maçaneta cobria toda a área da suposta câmera, reavaliando o plano dos dutos, e tentando criar alguma ideia louca para conseguir pegar o antídoto, o que não ia nada bem.

Minha cauda não parava quieta. Naquele ponto, simplesmente não conseguia mais controlá-la, ela negava meus comandos e persistia em continuar indo de um lado para o outro, dando pequenos espasmos ocasionalmente. Minhas orelhas sobem por instinto ao ouvir uma conversa vindo do corredor. Pareciam ser três pessoas, e ao focar consegui reconhecer uma das vozes: André. 

- Camila, você já tentou isso duas vezes, lembra? Não vale a pena. - Ele diz. Seus passos, junto com as vozes, chegavam cada vez mais perto.

- Eu preciso aprender a me controlar, não dá pra ficar assim. Quanto mais cedo eu começar a treinar, melhor. - Responde uma voz feminina, reconhecendo de imediato a pantera negra.

- Você realmente quer passar por isso de novo? - Diz uma terceira voz, reconhecendo o Eliel. - ver você daquele jeito, comendo no chão... Foi perturbador. - no momento em que ele termina a frase, levo um susto com duas batidas na porta, me fazendo pular da cama, levantando imediatamente.

- Não acho uma ideia viável você começar isso justo no dia em que mais precisamos de você estável, Camila. - Responde André, em um tom calmo. - Vamos.

- tá, ok. - Digo baixinho, coçando o cabelo e as orelhas felinas, respirando fundo com um frio na barriga. Eram só mais dez minutos. Começo a contar o tempo mentalmente, para ter certeza de que não acabaria queimando a largada. Até que foi um bom exercício, pois consegui me acalmar um pouco com a contagem.

Eu parei nos nove minutos, percebendo o som distante de pratos e talheres batendo no refeitório. Nenhum barulho nos corredores. A mudança era clara, nem precisava ter contado.

Eu levanto, olhando para a estante à minha frente. Ela parecia bem pesada, mas ao colocar minhas patas na parte lateral e fazer força, percebi que era apenas impressão. A estante tinha praticamente o mesmo peso que minha geladeira antiga sem rodinhas, e não foi muito difícil arrastá-la para o lado da porta. Tentei não fazer muito barulho no processo mas foi inútil, a madeira riscava o mármore e fazia um som agoniante.

Arrastei o suficiente para conseguir enxergar o que Eliel mencionou: Havia um duto quadrado de um metro e meio de largura, fechado por uma porta de inspeção feita de várias barras cilíndricas de metal. Me agacho para ver melhor, procurando onde ficavam os parafusos, mas percebi que não havia nada do tipo. A porta de inspeção tinha sido soldada ali. Conseguia ver pelas fendas que o duto tinha o mesmo comprimento que a abertura, e que conseguia entrar ali sem muita dificuldade.

O problema era conseguir abrir aquilo. Minhas garras eram afiadas, mas elas não cortavam puro metal! Sento no chão, tenso, porém começo a duvidar de minha afirmação. Me lembro de quando machuquei César, de quando estilhaçei o cortador de unhas. Eu tinha perfurado o pulso daquele homem como se não fosse nada, quase chegando a sentir seus ossos... Balanço minha cabeça tendo um arrepio forte, sentindo minhas mãos sujas por um momento. Bem, não custava tentar.

Instintos felinosOnde histórias criam vida. Descubra agora