II - Lobo Assustado

194 10 30
                                    


Estava paralisado, olhando para o espelho. Meu coração palpitava como louco, e demorei minutos para conseguir me acalmar. Com as mãos trêmulas, vou em direção às orelhas felinas, tentando não ter uma crise dessa vez.

Com o toque, outro arrepio sobe pela espinha. Era incrível, conseguia sentir detalhadamente a pelugem com os dedos, a sensibilidade, a sensação do músculo se movendo no reflexo ao toque. Era tudo tão... Real. Bem, ou era real, ou tinha pirado de vez.

- Caralho, eu pirei de vez - Saio do banheiro com pressa, evitando me olhar no espelho e quase tropeçando no pequeno degrau do corredor. Minha cabeça tentava entender que maluquice estava acontecendo enquanto ia até a cozinha, desesperado por um copo de café.

- Eu provavelmente ainda tô dormindo. - Digo, indo tremendo até o armário, pegando uma caneca e uma cápsula de café expresso, coçando os olhos. Eu estava com sono, apenas! "Faz tempo que eu não dormo tão bem assim, deve ser só meu cérebro acordando, confundindo as coisas, e..."

Paro com o dedo pressionando no botão de iniciar da máquina de café, sentindo minhas orelhas retesarem para cima. Finalmente tinha entendido: Era tudo alucinação! Deve ser uma reação do comprimido que tomei ontem a noite! Tinha que ser isso.

Enfiei esse pensamento com força na cabeça, tentando me acalmar. Uma caneca de café vai ajudar nesse problema.

Esperei parado, observando a máquina enquanto ela fazia sua engenharia maravilhosa. Após um tempo o líquido começa a despejar na caneca e o cheiro de café se alastra pela cozinha. Eu suspiro, e respiro um pouco. A calmaria foi breve, pois logo senti as orelhas se abaixarem um pouco, relaxando comigo.

Pego a caneca rapidamente e dou três goles, esquentando os dedos e quase queimando a garganta. O gosto era uma delícia, como sempre, e dei um tempinho para a cafeína entrar direito no meu corpo. Agora, um pouco mais calmo e acordado, vou até a sala com a caneca em mãos, sentando no computador e olhando para a tela preta, preocupado.

Ainda estavam lá. As orelhas se mexiam de vez em quando, mas em boa parte se mantinham eretas. Por que o café não estava funcionando!? Eu pirei de vez? Isso não é uma alucinação minha? O que eu realmente tomei ontem à noite!?

Estava ofegante, e sentia uma dor familiar no peito. Mesmo se as orelhas fossem reais ou não, as duas situações eram péssimas. Só de pensar em sair de casa para fazer qualquer coisa me gerava pânico.

- Não, eu não quero, não dá pra lidar com isso agora. - Tomo mais um gole da caneca e ligo o computador. Precisava parar de pensar, me distrair com qualquer coisa.

Meu trabalho. Além de ser uma distração, era também produtivo! Eu tinha que terminar o pedido de qualquer forma, ficar tendo uma crise não iria me ajudar em nada.

"Não tem como uma maluquice dessas ser real, isso com certeza é efeito do remédio. As orelhas vão sumir mais tarde, é só ignorar."

Entro no meu perfil do computador e abro o projeto de ontem, colocando meus fones nos ouvidos humanos, pronto para analisar minha composição do início. Eu aperto espaço, e...

Nada. Na verdade, conseguia ouvir a música tocando bem baixinho, mas era estranho, quase como se a fonte da minha audição estivesse vindo de outro lugar...

- Eu uso o alto-falante, então! - Digo em voz alta, desplugando rapidamente o fone do computador, tirando-o das minhas orelhas e dando play na música.

Demorou um certo tempo até eu me acalmar. Depois de ouvir a composição pela segunda vez, identifico os mesmos problemas de ontem: Falta de variedade nos acordes, uma repetição na melodia principal que ficava cansativa lá pela metade da música, e algo novo: A música estava alta, muito alta. Só consegui trabalhar direito colocando o volume do computador em 5%.

Instintos felinosOnde histórias criam vida. Descubra agora