Capítulo três

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Vinícius

— Já disse que eu não quero ir!

Ela já tinha mesmo dito. Centenas de vezes. Passara os últimos dias repetindo aquilo como um mantra. Até que chegou o momento da viagem e Cecília se jogou sentada no sofá da sala, cruzando os braços e fazendo sua melhor expressão emburrada.

E olha que ela era profissional nisso.

— E eu já disse que não existe essa opção. Estamos indo passar alguns dias na casa da sua avó, e isso já está decidido.

Peguei a mala dela no chão e levei até o carro, colocando no porta-malas.

Não estávamos levando muitas coisas, já que o plano era realmente passar apenas alguns dias, menos de uma semana. Eu tinha tentado contato com a minha mãe para contar sobre a nossa ida para lá, mas não consegui, já que, para variar, o telefone da casa dela parecia ainda estar com defeito, o que era bem comum naquela fazenda. O conserto sempre demorava dias.

E situações como aquela realmente representavam o maior dos motivos para a minha filha não estar nada animada com aquela viagem. O local não tinha wi-fi, o que significava nada de streaming, nada de plataformas de música, nada de jogos ou videoconferências com as amigas. A casa muito mal tinha um telefone fixo, que nem sempre funcionava muito bem, mas Cecília provavelmente mal sabia o que era isso. Ao menos, costumava ter sinal de telefonia celular, o que me salvaria para conseguir usar o 4G para manter contato com a empresa.

Voltei para dentro da casa, encontrando minha filha ainda na mesma posição, com a mesma expressão emburrada no rosto.

— Cecília, temos que ir. São quase seis horas de viagem até lá.

— O que vou fazer durante seis horas dentro de um carro com você?

— Podemos ouvir músicas juntos, conversar...

Ele me analisou em silêncio por alguns instantes, até que, vencida, bufou e se levantou, pegando sua mochila que estava ao seu lado no sofá e anunciando enquanto seguia em direção à porta:

— Pelo menos eu tenho o meu celular.

Era sério aquilo? A ideia de encontrar músicas em comum que nós dois gostássemos e de conversar comigo era tão ruim?

Eu definitivamente odiava aquele celular dela.

Porém, pelo menos ela tinha aceitado ir para o carro.

Quando cheguei ao veículo, ela já estava no banco de trás, com o cinto de segurança colocado e, claro, os olhos grudados na tela do maldito smartfone.

Então iniciamos a viagem. Já eram três horas da tarde, já que nesse dia eu precisei ir à empresa para checar se estava tudo em ordem e se eu poderia realmente me dar ao luxo de me ausentar por alguns dias. Mesmo sendo o dono da empresa, eu fazia questão de manter tudo sob o mais absoluto controle.

Logo nos primeiros minutos de viagem eu percebi que Cecília tinha seus motivos para estar preocupada com o que fazer durante a viagem. Rapidamente um silêncio incômodo se instalou entre nós, e tentei revertê-lo puxando algum assunto.

— Então... como foi o ano escolar?

— Bom.

— Vi que você passou de série com boas notas.

— É.

— Seus amigos vão se manter na mesma turma que você no ano que vem?

— Vão.

Travei, sem saber mais o que poderia perguntar, já que as respostas secas e desinteressadas dela não me davam margem para mais assunto. Mesmo assim, insisti.

Seguindo o Coração [DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora