Capítulo cinco

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Vinícius

Se minha mãe pareceu realmente feliz ao me ver, eu nem saberia como descrever como ela parecia ao encontrar a neta pela primeira vez. O primeiro encontro aconteceu na cozinha. Cecília costumava ser carrancuda e mal-humorada pela manhã, mas pude ver um sorriso, embora discreto, sincero em seu rosto quando abraçou a avó pela primeira vez.

A mesa retangular da cozinha estava preparada com o que minha mãe chamou de 'café simples', mas que me deixava envergonhado pela tonelada de industrializados que eu andava servindo à minha filha. Tinha pães, torradas, biscoitos amanteigados, ovos fritos, manteiga, requeijão, leite e suco de frutas... tudo feito por ela e com a maior parte das matérias primas vindas da sua própria fazenda.

Foi impossível para mim deixar de lembrar de Luana, que também era tão adepta à alimentação mais natural. Apesar de nascida e criada na cidade grande, os olhos dela sempre brilhavam quando eu falava sobre a fazenda, e sabia que ela ia gostar de conhecer o lugar.

Mesmo com todos os problemas que eu tinha com o meu pai, ela me convenceu de que eu deveria tentar resolver aquilo e apresentá-lo à neta. Eu não aprovei muito a ideia, mas por fim concordei. Tinha prometido a ela que a levaria lá, e planejávamos uma viagem para quando chegassem as férias escolares de Cecília. Se meu pai não me aceitasse lá – como eu imaginava que iria acontecer – ficaria com minha esposa e filha em algum hotel da região e, de qualquer maneira, iríamos curtir juntos aquela viagem em família.

Infelizmente, nossos planos foram mudados drasticamente com a partida dela.

E eu não tive mais coragem para voltar ali sem ela.

— Pena que esses pães são de ontem — minha mãe lamentou, quando nos sentamos à mesa. — Se eu soubesse que vocês viriam, teria acordado mais cedo para preparar alguns fresquinhos para vocês.

— Não precisa se incomodar, mãe. Vamos ficar apenas alguns dias e não queremos que tenha trabalho.

Ela segurou a minha mão por cima da mesa.

— Estou tão feliz por vocês estarem aqui, meu filho. Foi a melhor surpresa que eu poderia receber. Mas eu acredito que, para você ter decidido vir assim, de um momento para outro, deve existir algum motivo em especial.

De fato existia. Mas recordei-me das palavras ditas pela tal Patrícia, sobre minha mãe não querer ouvir a respeito da venda da fazenda e decidi que eu deveria ter mais calma naquilo. Talvez eu devesse primeiramente mostrar a ela, no decorrer dos dias que passaria lá, o quanto aquele local tinha se tornado unicamente uma fonte de prejuízos para ela. Depois mostraria o contrato e o valor milionário oferecido por aquelas terras. Ela seria louca se não concordasse.

Antes de ir para lá, passei para Arthur Tavares todos os dados dos documentos necessários – meus e da minha mãe – e ele havia me enviado, pelo correio, as cópias do contrato. Eu tinha lido tudo e ainda mostrado ao advogado da empresa, e ambos concordamos que as condições eram extremamente vantajosas. Eu já havia assinado, e agora precisava apenas da assinatura da minha mãe. Meu propósito com aquela visita era conseguir aquilo.

— Eu sempre convido a senhora para ir nos visitar. Como nunca vai, decidi vir e trazer Cecília. Ela acabaria se tornando uma adolescente sem conhecer a avó, isso é um absurdo.

E de fato era. Eu sempre quis que minha mãe fosse nos visitar, mas isso era difícil para ela... talvez tanto quanto era para mim voltar àquele lugar onde eu prometi nunca mais colocar os meus pés. Mesmo que o motivo para isso, a princípio, fosse a relação tumultuada que eu sempre tive com o meu pai e que ele há anos não estivesse mais ali.

A tal Patrícia chegou à cozinha nesse momento e não pude ignorar o fato de que não estava sozinha. Ela trazia um bebê diante do corpo, carregado por um suporte tipo canguru.

Seguindo o Coração [DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora