Capítulo 04

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Enquanto dirijo, paro em um semáforo, e aproveito para olhar na minha carteira e ver se tenho algum dinheiro para concertar o meu carro, e talvez o daquele garoto também. Felizmente tenho dinheiro suficiente, ao menos o meu trabalho na loja Lótus, tem tido resultados. Lótus é uma loja de roupas de grife aqui em Corning, muito frequentada por adolescentes mimados e adultos procurando onde gastar sua fortuna. É um bom trabalho, ganho bem e o lugar é agradável; não poderia pedir por mais.

Já são meio dia, passei por uma praça e parei para apreciar as pessoas e sua vida não tão interessante. Já parei em uma sorveteria e pedi apenas uma água, pois não estava afim de tomar nada. Passo por um posto de gasolina e abasteço. Penso em passar na casa de Lana, mas me lembro que ainda faltam duas horas para que ela saia da escola, então volto pra casa.

Chegando em casa, decido entrar no quarto da minha mãe, isso pode doer, mas uma hora iria acontecer, e eu não gosto muito de adiar o sofrimento, melhor machucar agora é seguir a minha vida do que viver com uma cicatriz aberta. Giro a maçaneta e entro. A cama está impecável, de certo, David arrumou; no criado, há uma foto dos dois, rindo, um casal perfeito. Abro o mini closet, e lá estão, as suas roupas, algumas das coisas que a tornavam ela. Toco em um casaco azul de algodão, era seu preferido; era simples, mas confortável e aconchegante, basicamente a sua definição de felicidade pra uma vida.

Solto a respiração, que eu nem havia percebido que estava prendendo. Pego o casaco, e mais algumas peças de roupas, levo até meu quarto e guardo junto as minhas roupas. Acho que ela não se importaria.

Algumas horas depois, já estou dentro do carro, indo para o cemitério. Jamais pensei que faria isso antes dos quarenta anos de idade. Chegando, encontro Stella, Lana, é até mesmo Jorge; vejo também alguns amigos da minha mãe, alguns em prantos. Após assistir a alguns discursos, espero me chamarem para falar algumas palavras.

-Minha mãe -mal começo e já desabo em lágrimas, é inevitável. Tento recomeçar- Minha mãe era tudo pra mim, a barreira que me protegia do mundo. Mas agora ela se foi, e eu tenho que dar um jeito de seguir minha vida, e eu vou conseguir, custe o tempo que custar, eu vou conseguir; eu sou forte, porque eu tenho a força que ela me deu pra vencer qualquer desafio. Eu a amava, e sei que ela também me amava, e por mais que ela não esteja mais entre nós, eu ainda sinto seu amor em mim.- falo mais algumas coisas e finalizo.

Desço as escadas, em lágrimas. Achei que estava começando a aceitar tudo isso, mas me enganei. Lana vem até mim para me abraçar.

-Lana, por que ela? Por que não eu? Ela era tudo, e eu apenas sou o que sou por causa dela.

-Talvez, era pra ser assim, ou talvez não, quem sabe? Não podemos fazer mais nada Ali.

-Eu sei Lana! E é isso que me consome, saber que eu não posso fazer mais nada!

David diz algumas palavras, não sei se eram sinceras, mas pareciam. Por mais que eu não goste dele, sinto que ele e minha mãe realmente se amavam, mas não cabe a mim julgar isso. O enterro acabou, todos já foram para sua casas, exceto eu, Lana e David.

-Lana, pode ir pra casa, está tudo bem.

Ela me olha desconfiada, analisando os meus olhos inchados.

-Ok -desisto- não tão bem assim.

-Alina,vamos pra casa juntas, e você não tem outra opção!

Chegando em casa, a única coisa que quero fazer é comer alguma coisa; realmente, a tristeza tem um grande apetite. Pedimos comida tailandesa e comemos no meu quarto. David parece desolado, assim que entrou em casa foi direto para seu quarto, ele não comeu nada. Mexo nos hashis da minha caixinha de comida, e minha cabeça voa para os braços da minha mãe. Começo a chorar, quando finalmente vou conseguir pensar nela sem me sentir assim?

-Oh, Alina, vem cá. -diz Lana, abrindo os braços.

Subo na cama, e me aconchego em meios aos seus braços. Sinto seus dedos acariciarem minha cabeça.

-Lana, quando vai parar de doer assim?

-Eu não sei, mas saiba que sempre que doer, eu vou estar aqui para tentar aliviá-la.

-E se doer pra sempre?

-Então eu estarei aqui para todo sempre, em todo o tempo, terá um espaço para você entre os meus braços.

-Ah, se você soubesse o quanto eu te amo!

-Eu sei Alina -fecho os meus olhos para sentir aquelas palavras- pode ter certeza de que eu sei.

Lana é o meu maior bem, talvez o meu único bem. Após alguns angustiantes momentos de lágrimas e silêncio, tomo um banho e me deito.

-Você trouxe roupas para passar a noite?

-Sim, vou me lavar e já volto.

Enquanto Lana toma banho, desembaraço o meu cabelo, passo um creme de pele e ligo o ar condicionado. Me jogo debaixo das cobertas. Logo, Lana chega.

-Estou indo para o quarto de hóspedes, e se precisar de algo, pode me chamar. -ela da um beijo em minha testa e sai pelo corredor.

Sozinha, quero chorar, mas meu corpo já esgotou todas as lágrimas. Então o que sai é apenas um baixo som de aflição. Desligo o abajur e fecho os olhos, estou tão exausta que tenho certeza que se houvesse um incêndio na casa, eu morreria queimada.

Não tão doce liberdade Onde histórias criam vida. Descubra agora