Fui direto para os quartos na expectativa de achar as meninas lá, contudo não obtive sucesso.
— Onde elas estão? — pensei em voz alta enquanto andava em direção à casa.
Chegando lá, descobri que o pessoal tinha ido para à quase-cachoeira numa decisão de última hora, por isso eu não sabia. Apenas umas duas pessoas não foram, sendo assim, fiquei por ali, roendo as unhas enquanto esperava.
Soraia me chamou, acho que percebeu minha impaciência, e acabei passando o tempo ajudando as mulheres a preparar as coisas para a noite. Percebi que era muito legal passar tempo com elas, nunca tinha parado para pensar no quanto aquelas mulheres poderiam me ensinar e estava gostando da nova experiência.
Mais ou menos uma hora depois o grupo voltou e logo avistei minhas amigas. Elas passaram direto pelo lugar que eu estava e foram para os fundos da casa, local que nos reuníamos com frequência para conversar, ler ou fazer algum estudo juntas.
— Acho que elas não te viram. — Soraia se aproximou ao ver meu olhar fixo.
— Ou me ignoraram. — Sorri triste. — Nem posso culpá-las.
— Se elas são vingativas assim, vamos precisar ter uma conversa séria. — A mulher balançou a cabeça. — Realmente acredito que não te viram, vai lá.
Suspirei e assenti, não era nada bom ficar especulando, precisava agir.
Andei pelo gramado da casa em direção às árvores nos fundos do terreno, as mãos suaram de nervoso ao avistar as três sentadas por ali em uma conversa que provavelmente me tinha como tema.
Quase dei meia volta quando minha presença foi notada por elas, porém estava determinada a corrigir as coisas.
— Oi. — Parei próximo ao grupo, sentindo meu rosto esquentar, e recebi um cumprimento sem jeito. — Eu vou ser direta, quero pedir desculpas por ter agido mal com vocês, agora sei que estavam certas e só queriam o meu bem. O que vocês dizem?
— Bom... — Fabi fez uma expressão pensativa e trocou um olhar cúmplice com as outras. — O que acham, meninas?
— É claro que te perdoamos, Tinie. — Sophia sorriu enquanto as demais concordavam com ela.
— Tem certeza? Eu vou entender se quiserem se afastar de mim. — Desviei o olhar para meus pés.
— Clementine, todo mundo erra, estamos aqui para aprender juntas, amizade é assim. Não é porque tu agiu errado uma vez que vamos deixar de ser suas amigas. — Fabi segurou meu braço e me puxou para baixo.
— Obrigada, de verdade. — Sentei junto a elas sentindo a leveza que o perdão trazia. — Nem sei o que dizer depois daquele surto no quarto, fui tão boba.
— A gente até te procurou, mas descobrimos que saiu com a Soraia — Leti explicou.
— Ah, sim. Nós fomos ao mercado e na volta tivemos uma conversa que clareou minha mente por completo. — Dei de ombros com um sorriso. — Às vezes eu me surpreendo com o quanto posso agir mal. Nos enganamos em relaxar e achar que estamos fazendo tudo certo, que somos bons e nada vai dar errado, nesses últimos dias eu descobri que o único que me impede de cair é Deus. Se eu depender dos meus próprios desejos vou ladeira à baixo.
— É, nosso coração foi corrompido e a partir disso precisamos lutar contra os impulsos da carne, se a gente deixar de lado essa verdade por um instante e ouvirmos a voz do nosso coração, o fim pode ser terrível — Leti comentou e concordamos com ela.
— Eu estava tão certa que não tinha pecado algum em dar corda aos meus sentimentos que foi como levar um soco quando fui exposta. — Olhei para frente, onde as pessoas se movimentavam, e vi certo rapaz conversando. — É, as coisas saíram do controle e viraram uma bagunça de erros atrás de erros, desde deixar meu coração se envolver até sentir raiva de uma irmã em Cristo apenas por meus sentimentos bobos.
— Ai, Jesus, volta logo pra gente ficar livre do pecado e viver em paz com o Senhor pra sempre! — Letícia se jogou na grama com uma expressão sonhadora.
Demos risada da cena que ela fez, mas foi impossível não compartilhar da mesma vontade.
— Me sinto grata por Deus ser muito paciente e não me abandonar em momento algum, apesar das minhas falhas. Fico constrangida com o cuidado dEle em sempre mostrar o caminho certo, como a Helena me disse, é bom saber que Deus nos perdoa.
— Quem é Helena? — Leti e Fabi perguntaram juntas.
— Eita, esqueci que não contei sobre ela. — Dei risada.
Fiz um breve resumo sobre quando conheci a Helena e o reencontro naquele dia.
— Uma coisa maravilhosa dessas e tu esquece de contar? — Sophia balançou a cabeça, desacreditada.
— Foi mal, galera. — Levantei as mãos sob os olhares acusadores, porém acabei sorrindo. — Tenho orado para Deus transformar a vida da Helena e que ela tenha uma jornada cristã de verdade agora.
— Vamos colocar ela em nossas orações. — Fabi sorriu e as outras concordaram.
Ficamos conversando por um tempão e tudo que conseguia sentir era alívio por não ter perdido amizades tão preciosas como aquelas.
***
Quando a noite chegou o real significado de bagunça foi visto nos quartos femininos daquele retiro.
Eu me sentia uma esquisita naquele meio, pois demorar para se arrumar não era meu estilo. Em quinze minutos já tinha arrumado o cabelo — o que na realidade era apenas colocar uma presilha pois tinha lavado no dia anterior e estava no auge da beleza —, feito uma maquiagem que consistia em batom e máscara de cílios, e colocado um vestidinho florido com uma rasteirinha. Só choraminguei um pouco por não poder usar meu querido par de coturnos, graças ao machucado no pé.
Entretanto, as demais garotas estavam brigando entre si pelo espelho do quarto e perdidas em um mar de roupas, acessórios e cosméticos.
— Deus te agraciou com agilidade, Tinie.
Tomei um susto com a voz de Soraia, estava na porta do quarto observando as meninas e nem percebi sua chegada.
— Olhando esse tumulto, eu também acho isso. — Ri ao ouvir uma das garotas perguntando por seu outro par de sapato.
— Já que está livre, pode vir me dar uma ajudinha?
— Claro!
Segui a mulher para a casa, onde havia uma movimentação de pessoas arrumando os últimos detalhes da festa de encerramento. Alguns reorganizavam as mesas para que formassem uma peça maior e assim todos ficassem juntos e outros decoravam o espaço, que já ganhava uma vida a mais.
Prestativo como era, é claro que o Gustavo estava lá ajudando. E eu precisei de bastante ajuda divina para não ficar olhando para ele, porque o rapaz estava a poucos passos de mim.
Soraia me passou a tarefa de cortar alguns papéis que seriam usados para uma brincadeira e eu obedeci, depositando minha atenção na tesoura e nas folhas brancas.
Me peguei pensando no que aconteceria depois daquele retiro, quando eu voltasse para casa e para minha rotina, que envolvia a temida escola nova e o ensino médio. Queria saber se tudo ficaria bem como ficou naquelas duas semanas, se faria amigos, se finalmente pararia de reclamar tanto e me concentraria em ser contente em tudo.
Estava tão distraída, criando hipóteses na minha mente, que a atenção dirigida à tarefa foi para os ares e ao invés de cortar o papel acabei cortando meu dedo.
Será que quando pesquisavam "desastrada" no dicionário, aparecia minha foto?
Resmunguei baixinho, tentando não chamar a atenção das pessoas ao meu redor. Contudo, eu estava em um vale de tentação e consegui o olhar logo de quem menos queria.
— Tudo bem? — Gustavo se dividiu entre o que fazia e eu.
— Foi só um cortezinho bobo — respondi envergonhada por ser a segunda vez que ele me via naquela situação.
— Tu é um imã pra acidentes, Tinie. — Se virou para mim. — Precisa de ajuda?
Fiquei parada, em silêncio. Meu coração queria dizer uma coisa e minha consciência outra, a quem eu ouvia?
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Tinie e o retiro de verão (LIVRO 1)
SpiritualVocê já teve medo? Clementine tem 15 anos e sente isso com frequência, principalmente depois de se mudar com os pais para Serra Brilhante - BA. Tudo piora quando sua mãe faz o favor de mandá-la ao retiro de verão da nova igreja - onde ela não conh...