1 | Indo para Não Sei Aonde

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Você já teve medo? Aquele sentimento que faz sua barriga gelar, leva os batimentos do coração à loucura e enche a mente de desejos de fuga?

Pois então, senti exatamente isso ao ouvir minha mãe revelar que havia me inscrito no retiro de verão da igreja. Você pode estar se perguntando: Oxe, e o que tem de mais nisso? Ah! Seria algo bom, se não tivéssemos acabado de nos mudar para aquela cidade. Não tinha nem uma semana que estávamos na igreja nova, mas dona Laura tinha que enfiar na cabeça que eu iria me enturmar lá.

É, eu estava em uma fria, não, em um iceberg!

Naquela manhã de sexta-feira eu iria ser jogada entre um monte de gente desconhecida e só tinha um pensamento em mente: Que Deus me ajude.

— Clementine! Vem logo! — a voz da minha mãe soou em um grito, o que me fez apressar os passos.

Joguei mais algumas coisas aleatórias dentro da mala, só para enrolar minha saída, não queria mesmo ir. 

Sentei na cama e encarei a estante repleta de livros, seria tão bom se pudesse passar as férias mergulhada em mundos paralelos, longe da realidade. Por que não podia ser assim?

Suspirei, abraçando a mochila em meus braços e olhando com melancolia para as fotos no meu mural. Fotos da minha antiga vida, aquela que tinha ficado para trás. Escutei mais um grito impaciente de mainha e soltei o ar com força.

— Tô indo! — gritei de volta, colocando mais um livro dentro da mala na esperança de que meus dias no tal retiro de verão não fossem tão deprimentes.

Saí do quarto puxando a mala até a sala, onde minha mãe brilhava de empolgação por, segundo ela, todas as maravilhosas possibilidades que me aguardavam no evento.

— Vamos, não quero que perca o ônibus. — Me arrastou pelo braço para fora de casa e colocou a bagagem no carro com rapidez.

Ela sentou no banco do passageiro e eu no banco de trás, quando estávamos acomodadas, papai começou o trajeto.

Quase de modo automático, abri a mochila que tinha em meu colo e procurei por meus fones, objeto que quase era parte de mim, de tanto que os usava. Música sempre melhorava meu humor. 

Mas, para meu completo desespero, eles não estavam lá.

— Pai, para esse carro agora!

— O que aconteceu? — O homem me olhou pelo retrovisor, preocupado. 

— Meus fones, eu esqueci, preciso deles.

— Pelo amor de Deus, menina, você vai sobreviver sem isso. — Mainha balançou a cabeça em desaprovação pelo meu escândalo.

— Por favor, eu vou entrar em estado de abstinência sem minhas playlists, elas estavam cuidadosamente organizadas pra essa chatice de viagem…

— Pra essa o quê? — Dona Laura me fuzilou com seus olhos escuros.

— Ah, eu quis dizer pra esse retiro. — Meu rosto queimou pelo deslize.

— Olha, não tem problema, a gente compra um pra você rapidinho e assim não tem atrasos. — Papai, que também era conhecido como a pessoa mais compreensível do meu mundinho, sorriu com tranquilidade.

Paramos na primeira loja de eletrônicos que vimos e desci na companhia dele para comprar os fones.

— Filha — ele começou o sermão que eu já esperava, enquanto andávamos rápido pelo corredor, procurando o acessório —, tenta dar uma chance pra isso, vai ser bom.

— Eu tenho escolha? Não decidi se viria pra cá e nem se queria ou não ir nesse evento. 

Seu Ricardo deixou escapar um suspiro, mas não disse nada por um tempo. Peguei os fones e segui para o caixa.

Tinie e o retiro de verão (LIVRO 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora