Capítulo 12

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As palavras sublinhadas são palavras riscadas.

TW: pensamentos suicidas, automutilação, tentativa de suicídio 

-º-



20 de Dezembro de 1995

Querido Diário.

Queria desabafar algo que aconteceu quando eu tinha 10 anos. Eu tentei cometer suicídio. Não pense que eu sou fraco, porque não sou! É só que minha vida estava tão merda naquele momento que pensei que nunca iria melhorar. Eu perdi as esperanças. De qualquer forma, eu havia acabado de ter aula com Daniel, e depois disso eu me tranquei no quarto e chorei como nunca havia chorado antes. Não conseguia fazer nada além de sufocar-me em meu travesseiro, tentando conter os soluços involuntários que me subiam a garganta.

Não estava mais aguentando. Era doloroso demais ter toda aquela pressão me afogando e ter que guardar toda aquela mágoa. Estava difícil até mesmo respirar. Pior era quando eu me consolava em minhas lágrimas e meu pai aparecia com seu olhar raivoso e me batia para eu virar homem ser mais forte, ou, então, quando estava muito estressado e sacava sua varinha para lançar um feitiço que na época não conseguia compreender, mas que me fazia sentir como se todos os meus ossos estivessem se quebrando, minhas veias estivessem estourando e minha pele estivesse em chamas. Era tamanha tortura que não conseguia me mover por alguns dias por causa disso. Mas meu pai nunca se importou.

Tentava engolir meu pranto toda vez que Daniel aparecia em casa e me "ensinava" algo novo. Era suportável aguentar duas agonia em um só dia, porém, nesse dia foi demais para mim. E, após meu pai sair do meu quarto com um sorriso de alívio nos lábios, eu me olhei no espelho, odiando a imagem que vi. Retirei minha blusa brutalmente, reparando nas marcas arroxeadas espalhadas pelo meu corpo e senti um grotesco nojo subindo-me a garganta. Nunca melhoraria. Jamais seria feliz...

E foi nesse pensamento que soquei o espelho com a repulsa me dominando. A adrenalina percorria meu corpo e vi o sangue escorrendo de meu punho, sem ao menos ter nenhum tipo de dor. Mas, se não percebo a dor, como posso saber que estou vivo? Alguns cacos presos em minha pele e eu nem ao menos me importei em retira-los. Eu queria sentir algo, eu queria sobrepor qualquer coisa sobre minha aflição. Eu ansiava por algo que me fizesse esquecer de todo o sofrimento por que estava passando...

Foi então que eu peguei um pedaço do espelho jogado no chão e cravei na minha pele, no meu pulso. Não sentia nada que igualasse ao meu emocional quebrado. Retirei-o, enfiando em meu outro pulso. Nada. Nada poderia me anestesiar do mundo. E repeti o processo diversas vezes, observando o líquido vermelho manchar minha pele e o cheiro de ferro dissipar no ar que respirava com dificuldade. E foi quando meus olhos se transbordaram que eu me senti em paz... Sentei-me no chão, ouvindo o silêncio me enlaçando e confortando. Depois de tanto gritar no abismo de meu interior, finalmente estava feliz. E foi me afogando no mar de calmarias que encontrei o mais pleno nirvana, e pude desfalecer em sua presença.

Porém, eu abri meus olhos. Eu estava vivo. Eu estava limpo e com a melancolia me fazendo companhia novamente. Não me lembro muito bem da minha estadia no hospital, acho que eles me drogaram para eu estar tão desvalido a ponto de não reconhecer minha própria existência.

Em casa, com meus pulsos ainda enfaixados, meu pai apareceu em meu quarto, gritando, enquanto minha mãe o segurava, tentando acalmá-lo. Você é muito fraco e problemático! Mais uma dessas loucuras nojentas suas e você não será meu filho. Porém, desvencilhou-se de minha mãe e saiu, não antes de eu ver desapontamento em seu olhar. Eu não queria sentir aquele aperto no peito e tampouco as lágrimas escapando-me dos olhos, mas não podia evitar. Apesar de tudo, eu ainda amava meu pai e queria que ele tivesse motivos para se orgulhar de ser meu pai, mas aparentemente, este era mais de um dos meus sonhos utópicos...

Minha mãe, quando viu minhas silenciosas lágrimas correrem livremente pelo meu rosto, apenas me abraçou carinhosamente, e eu a abracei tentando me livrar de toda a tormenta que guardei enquanto ela sussurrava para eu não escutar meu pai, porque ele me amava, só não sabia demonstrar, porque ele queria que eu fosse um bom homem e não sabia como fazer isso... Minha querida mãe achou que eu tinha chorado por causa disso. Fico feliz que ela não tivesse que arcar com a cruel verdade.

E no dia seguinte minha rotina havia continuado... Daniel apareceu em casa, preocupado e me abraçando, dizendo que não sabia como seria a vida dele sem mim enquanto me beijava apaixonadamente. Meu pai ignorava-me e minha mãe permaneceu em seu mundo, fingindo que nada de mau acontecia em sua família. Depois desse dia, foi como se algo tivesse, de fato, morrido, só não saberia dizer o quê. Somente sei que estou apenas sobrevivendo, com curtos lapsos de ilusão de felicidade e com uma pequena esperança vivendo em mim.

Porém, se eu aprendi alguma coisa com esse acontecimento, foi que meu pai não tem sentimentos para expressar... Até a próxima, querido diário.

-º-

Harry sentia seu olho arder. Talvez fosse pena, compaixão, mas ele nunca se sentiu tão mal assim por alguém. Tudo por que o escritor tinha passado fazia seu peito arder e seu estômago queimar. Esfregou seus olhos, retirando as lágrimas que queriam sair, e fechou o diário, abraçando-o logo em seguida.

Potter perguntou-se como ele tinha aguentado tudo aquilo sem nunca contar a alguém; ele próprio nunca poderia fazer isso... Suspirou com pesar. "Como qualquer pessoa consegue guardar tanta tristeza para si?" perguntou-se intrigado. E, ao mesmo tempo que gostaria de curá-lo, não sabia se era apto para consertar sua alma tão despedaçada. No entanto, com certeza, ele faria seu máximo e o impossível para fazer isso. Tendo esse pensamento em mente, Harry levantou-se e foi procurar por Hermione para ver se a amiga o ajudaria, mas não sem antes segurar fervorosamente o diário e sussurrar, como se o dono pudesse escutar: "Você é muito forte, sabia? Aguente firme que eu vou te ajudar..."

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