Capítulo 5: Segunda Chance

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Trabalhando na mesma sala e passando boa parte do dia próximo, eu não só ouvia as ligações de Álvaro como via o que ele estava fazendo em seu computador. Depois de alguns trechos de conversa e de avaliar mudanças no comportamento dele, eu me dei conta de que ele estava saindo com alguém. Talvez não estivesse comprometido, mas estava começando algo. Ele usava aplicativos de mensagens mais vezes, dava risinhos ao telefone, falava de compromissos à noite. Ele estava diferente de quando eu tinha chegado.

Eu fiquei triste por isso. Eu não tinha ideia de que iria ficar tão triste, tão decepcionado, tão sem fome e tão sem vontade de viver por causa disso. Eu não sabia que estava tão iludido. Às vezes eu ainda o pegava olhando para mim, o olhar perdido, e ele me tratava bem, mas ele estava empenhado em deixar claro que eu não tinha a menor chance. Digo que ele fazia de propósito porque ele sabia melhor do que ninguém que nada que se fazia naquela sala era segredo para mim. Eu via e ouvia tudo. Se ele trocava mensagens e fazias ligações ali era porque queria que eu visse. Ou ele não tinha nenhuma consideração pelos meus sentimentos ou estava querendo me punir pela audácia. As duas coisas eram ruins.

Os demais funcionários demoraram a captar os movimentos. Aparentemente, Álvaro não estava sendo explícito como na vez que todos se lembravam — o garçom — quando ele demonstrava sua paixão por todos os lados. Era o que me consolava. Mesmo os que comentavam, não o faziam com tanto entusiasmo. Seu Antônio não fez nenhum comentário, só parou de me cobrar pela aposta que eu não tinha feito.

Em poucos meses, o senhor Álvaro não era o que eu tinha conhecido ao chegar: esse malhava, saía e tinha 'alguém'. Pelo menos, era o que ele dava a entender. Estava até mais bonito.

Eu passei a me concentrar no trabalho, tentando ignorar Álvaro e suas gentilezas. Ele ainda era gentil. Levava chá com menos frequência e raramente colocava a mão no meu ombro, mas ainda era ele. E, claro, ainda pegava no meu pé.

A Magda chegou ao escritório. Era uma mulher simples e eficiente, de pouca conversa. Ela passou a dividir o serviço comigo e com Marcela, que ia tirar férias em breve. Naqueles dias nasceu o filho de Petrus, ele ficou uma semana sem trabalhar e várias coisas acabaram ficando na minha responsabilidade, afinal, eu não era mais o novato. Por cinco dias inteiros eu tive que me virar com uma infinidade de coisas, algumas das quais eu não dominava. Se aquilo estava sendo um teste, eu estava me saindo muito mal. Nervoso, cometia erros idiotas e não dava conta do montante que se acumulava.

Eu estava a ponto de atirar coisas pela janela e sair correndo daquela sala quando Álvaro chegou depois de horas de ausência. Ao invés de ir para sua mesa, ele parou na minha frente e ficou me olhando.

— Randrew, está tudo bem?

Eu ia dizer que estava, mas mudei de ideia ao ver a expressão em seu rosto. Ele estava sério, preocupado.

— O que foi?

— Recebi ligações de reclamação agora há pouco. Duas reclamações. Você enviou pedidos com erros.

— Não, eu não enviei.

— Enviou sim, Randrew, sou eu quem está dizendo. Olha aqui. — E ele me mostrou a prova do crime. Nomes parecidos trocados. — Vai dizer que não enviou?

— Ai, meu Deus! — Fiquei em choque. Passei a mão trêmula pelo rosto. — Droga! Eu não aguento mais isso!

— Por que não aguenta? — A voz dele soou calma, mas transparecia um leve sarcasmo. — Não era o que você queria?

Não respondi. Abaixei a cabeça e fiquei olhando para o monte de coisas que havia na minha mesa. Cerrei os punhos para não socar alguma coisa. Aquele homem me deixava muito nervoso e me fazia agir como um idiota.

Não deixe para amanhã (Amostra de 14 capítulos)Onde histórias criam vida. Descubra agora