Capítulo 11: Sr. Frio

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Estar de bem com Álvaro me fazia ignorar qualquer coisa que não fosse linda e feliz, incluindo o fato de que ele continuava a manter aquela "distância" entre nós não importava quão gostosos fossem os nossos encontros "casuais". Aspas porque fisicamente nós estávamos sempre próximos, a um dedo do encontro, mas havia algo, um impedimento, eu sabia o que era, mas não conseguia explicitar, não conseguia resolver. Eu nem achava que ele estava errado em manter essa barreira, mas eu pensava que as coisas podiam ser bem melhores se ele simplesmente deixasse acontecer.

Nós conversávamos algumas vezes na semana, sempre à noite; eu ligava, ele ligava, e saímos algumas vezes para "ficar", o que consistia em ir a algum lugar aleatório e depois dar uns beijos no carro mesmo. Não fomos para a melhor parte porque ele dizia que não tínhamos um lugar decente para isso. Motéis não eram adequados para mim, nossas casas estavam fora de cogitação porque não morávamos sozinhos, e mais e mais desculpas. Mas a vontade ia se acumulando.

Enquanto isso, começou o campeonato das empresas. Jogos curtos, cercados de muita festa, em dois finais de semana de dezembro. Inesperadamente, nosso time foi muito bem. Os rapazes levaram o treino a sério e chegaram às semifinais. No primeiro fim de semana eu não fui, pois ainda tinha que me livrar da faculdade. No segundo, já devidamente garantido no semestre seguinte, eu fui para assistir aos colegas e ver o que poderia rolar.

O sábado foi chato. Álvaro estava de boné e óculos escuros, camisa branca de botão e mangas compridas, muito gato, mas ele era o patrão, e patrões vivem cercados por outros patrões e por seus tradicionais puxa-sacos. Ele ficou a maior parte do tempo acompanhado e eu fiquei sozinho do outro lado do estádio tomando sorvete.

Nosso time teria dois jogos no domingo, último dia da festa, um pela manhã, outro à tarde. Ainda pela manhã, Álvaro veio até mim e falou comigo, mas manteve uma discrição irritante. Voltou para seu lugar privilegiado cercado por seus conhecidos ricos.

Era um dia extremamente quente, e a decoração de Natal não fazia nenhum sentido, como, aliás, nunca faz. No canteiro central da cidade as árvores tinham luzes e papais-noéis infláveis, e um boneco de neve dava as boas-vindas no estádio municipal. A neve de mentira me inspirava a gastar boa parte do meu salário com casquinhas e milkshakes.

Os jogos da manhã eram as semifinais e os nossos rapazes acabaram perdendo numa sofrida disputa de pênaltis. Até eu sofri, agora junto a uns colegas que encontrei, mas visível o suficiente para que ninguém me acusasse de não ter ido lá. Nosso time ainda teria outro jogo, e eu estava pensando em ir para casa ao invés de ficar para as atrações do longo intervalo quando recebi uma mensagem de Álvaro. Ele estava pedindo que eu fosse com ele buscar as lembrancinhas que ele tinha encomendado para os nossos jogadores. Ele tinha planejado entregar à tarde, mas depois daquela derrota doída, quando eles quase chegaram a ganhar, ele decidiu antecipar para que os jogadores ficassem felizes independente do resultado do último jogo.

Álvaro tinha avisado que talvez fosse precisar de mim, então a chamada não foi tão inesperada. Eu saí pelo portão principal e me dirigi até o local onde o carro dele estava estacionado. Ele usava uma saída mais exclusiva, então chegou lá antes de mim.

— Te interrompi em algo divertido? — Ele estava sorridente, tentando ser simpático.

— Você sabe que não. Para onde vamos?

— Alguém está zangado... — Álvaro disse para si mesmo sorrindo.

— Não, eu tô bem. Dia quente.

— Pois é. Dezembro. Sempre quente. Vamos buscar umas caixas, é aqui por perto mesmo.

Ele parou num local que eu não conhecia e dois rapazes colocaram caixas no porta-malas. Eu não sabia e não perguntei do que se tratava. Álvaro tinha fama de ser generoso.

Não deixe para amanhã (Amostra de 14 capítulos)Onde histórias criam vida. Descubra agora