Capítulo 12: continuação

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Dois dias antes do Natal, chegaram os presentes, conforme o costume de, provavelmente, duas décadas. De uma década e meia eu podia falar com propriedade. Meu pai não era bom em escolher coisas para mim. Ou vinham coisas de machão como bolas ou chuteiras ou, quando alguém lhe dava um toque, ele mandava coisas sem noção como um short com lantejoulas. Dessa vez ele não foi tão mal: um par de botas pretas que me caiu razoavelmente bem. Liguei para agradecer.

Era isso, além das férias e da dificuldade para fazer compras, que fazia com que o Natal em nossa casa não fosse apenas mais uma data. Porém, quando se está iludido (vulgo apaixonado), datas comemorativas passam a ter importância. Nesse ano eu estava mais ligado na passagem do tempo, e o "espírito natalino" estava na cabeça. Um desejo repentino de comprar presentes e fazer coisas típicas da época. Só que eu ainda estava trabalhando e não tinha tempo para isso. Constatei, irritado, que eu deveria ter pensado nisso mais cedo.

Eu deveria ter gastado o horário do almoço do dia 24 comprando algo que eu sabia que mamãe queria, mas o desperdicei pensando no que poderia dar ao Álvaro sem parecer brega e inconveniente.

Quando eu pensava em Álvaro, se eu conseguisse me desprender das coisas do trabalho normalmente cercadas por desconforto, eu pensava em coisas calmas. Um riacho, um canteiro de flores, uma floresta de pinheiros. Não eram coisas que eu poderia comprar. Então decidi escrever. Meu lado poeta nunca existiu, mas eu pensei que seria capaz de digitar algumas linhas bonitas e comprar uma lembrancinha condizente com as palavras. Pensei nelas durante a noite, mas não anotei, é claro. Anotar é para pessoas prudentes.

Depois de várias voltas improdutivas pelas ruas mais movimentadas da cidade, acabei comprando um vaso grande com camomilas, um círculo enorme de ramos verdes e flores brancas e amarelas, cultivadas para serem as maiores e melhores do mercado. Tão exuberantes que mal lembravam a minúscula flor medicinal.

Não sei por que aquilo me pareceu legal. Talvez tenha sido a dificuldade em imaginar algo que combinasse com alguém tão autossuficiente em se tratando de objetos pessoais.

De volta ao escritório, Sandra informou a todos que Álvaro não iria voltar naquela tarde, pois tinha coisas a resolver no armazém antes de viajar. Ele iria viajar.

— Então esse ano não tem cestas de Natal... — Petrus comentou quando Sandra ainda estava no escritório.

— Pois é. Sem cestas.

— Estranho. Ele nunca saiu assim.

— E por pouco não ficamos sem a festa. Ele só se lembrou de reservar o clube no último momento.

— Alguém deveria ter dado um toque nele. Você! — Petrus apontou para mim.

— Eu o que?

— Dona Marta cuidava dessas coisas. Você deveria cuidar, ou pelo menos lembrar ao Álvaro. Ele ficou envolvido com a questão do campeonato e esqueceu todo o resto.

— Eu não sabia sobre isso.

— Mas perguntou?

— Não. Não tinha nada disso no meu último emprego e eu não sabia que tinha que perguntar.

— Nosso primeiro Natal sem dona Marta e como ficamos? Que ótimo.

— Ah, que pena — respondi calmamente. A viagem de Álvaro era o que ocupava minha mente, e as lamentações em forma de críticas pontiagudas feriam sem doer.

Ignorei também quando Petrus sorriu e disse que estava brincando. Que ele fosse brincar lá na esquina! Foquei em Sandra dizendo, com a testa franzida, que Álvaro tinha ido sem se despedir e sem dar o tradicional abraço de Feliz Natal. Ela tinha combinado algumas coisas com ele apenas um dia antes.

Não deixe para amanhã (Amostra de 14 capítulos)Onde histórias criam vida. Descubra agora