Capítulo 14 - Os quatro guardiões

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Os quatro guardiões

Do alto da colina, sentados lado a lado, Prie e Moghes observavam a aldeia. Com o passar dos anos, dragões e fadas aprenderam a conviver e transformaram suas diferenças em aprendizado. O local permanecia seguro e impenetrável, tornando-se um oásis em meio ao turbilhão de ataques e chacinas frequentes em Wicnion. Como líderes, governavam juntos e jamais tomavam decisões sem que houvesse um consenso entre eles. Essa harmonia refletia-se no grupo e na prosperidade da aldeia. O alimento e a água eram abundantes e os pequenos cresciam distante da maldade que havia fora dali.

- Tempos difíceis estão por vir. – Prie comentou com tristeza.

- Sim. – Moghes concordou conformado. – Eu não sei se devemos alertá-los sobre a mensagem que recebemos de nossos deuses...

- ... ou se os deixamos usufruir do pouco tempo que ainda nos resta. – Prie completou.

- Há outra coisa que me preocupa. – Moghes falou com a voz tensa.

- E o que é?

- A localização da nossa aldeia nunca foi revelada. – ele disse com orgulho. – E mesmo os dragões que foram banidos tiveram essa lembrança apagada. – Moghes olhou para o céu e percebeu nuvens que anunciavam chuva para as próximas horas. – Esse é um de nossos dons e fazemos isso tão bem, que a informação jamais foi extraída de nenhum membro desertor ou exilado.

- Você acha que não devemos trazê-los aqui? – Prie perguntou já sabendo qual seria a resposta.

- Tenho certeza que não. – ele disse com segurança.

- E como faremos? – a sacerdotisa perguntou curiosa. – A deusa Aminah e o deus Dracon nos alertaram sobre o nascimento do Salvador. – Prie lançou seu olhar para o horizonte. – Devemos apoiar as outras aldeias, pois em breve aqui deixará de ser um local seguro também.

- Mas enquanto esse dia não chegar, devemos encontrá-los fora do vale. – ele sugeriu. – O que acha?

- Você sabe que sempre estou de acordo com suas opiniões. – Prie disse sorrindo. – Admiro sua sabedoria.

- Não seja tão modesta, fada. – Moghes se esticou, preparando-se para voar. – Eu já percebi que muitas vezes você me faz acreditar que a decisão foi minha, mas depois eu percebo que não foi.

Moghes piscou um olho para Prie e bateu suas enormes asas. Ele iria sobrevoar a aldeia para checar se tudo estava em ordem. Esse era um hábito do qual ele não abria mão, apesar das sentinelas estrategicamente posicionadas.

Prie ficou sozinha. Ela era profundamente grata por aquela aliança. Se os dragões não as tivessem ajudado quando sofreram o ataque do exército dos lobos, sua espécie teria sido extinta, como tantas outras em Wicnion. Infelizmente, as lembranças daquela noite embluada jamais saíram da memória das fadas. As imagens de tantas companheiras dilaceradas e mortas ainda as visitavam em pesadelos sem fim. A sacerdotisa tentava ajudá-las e as aconselhava a não compartilharem essa história com as novas fadas, mas os festejos da primeira noite de Blu costumavam estar sempre acompanhados de algumas lágrimas mal disfarçadas.

Lá embaixo, Erminea passeava com a filha Delwyn e a neta Calina por um dos jardins da aldeia. Depois da morte de Kathiah, a primeira auxiliar da sacerdotisa acreditava que jamais teria uma alegria sincera em sua vida novamente, até que a pequenina nasceu. Não havia espécimes machos entre as fadas, mas algumas delas nasciam especiais, eram maiores e mais robustas, assim como Ermínea, e carregavam a semente que dava continuidade à espécie. Delwyn também nascera assim, diferente da filha, que era bem delicada.

- Nós podemos sair daqui? – Calina perguntou incomodada.

- Minha querida, as flores são lindas e perfumadas, porque você não gosta delas? – Delwyn indagou à filha.

O Portal de Anaya - Livro 2 - Os mundosOnde histórias criam vida. Descubra agora