Capítulo 4 - Voluntária de última hora

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Voluntária de última hora


O homem parou o carro no trecho mais alto da ponte. Em seguida, fechou os olhos, deixando que algumas lágrimas rolassem pelo rosto. Ele usou o dorso da mão para secá-las e pousou a cabeça no encosto do banco. Durante alguns minutos, manteve-se assim, de olhos fechados. No banco traseiro, uma mulher de semblante austero lhe observava, enquanto Julianna, sentada ao seu lado no banco do carona, apertava os olhos e franzia a testa quase debruçada sobre ele.

- Eu não consigo capturar uma palavra sequer. – ela disse tapando os ouvidos com as mãos. – Tudo que me chega é um zumbido alto e palavras desconexas.

- Em primeiro lugar, – a mulher austera disse com voz firme. – destape os ouvidos porque isso não faz a menor diferença! Em segundo lugar, antes de deixá-la sob meus cuidados, sua Orientadora me disse que vocês haviam sido designadas para um planeta Nível 4 e que foi sua opção vir para um planeta Nível 2.

Sentindo-se ligeiramente constrangida pelo comportamento infantil, Julianna retirou as mãos dos ouvidos e as colocou sobre o colo.

- Vamos, concentre-se! – a mulher ordenou. – Conecte-se com a aura dele! Não importa o que ele está pensando, o que interessa é a energia que ele vibra. Se você capturar a energia dele, as palavras irão se revelar naturalmente.

Julianna fechou os olhos, respirou fundo e sacudiu os ombros e os braços. Instantes depois, a mulher começou a perceber que a aura do homem, que antes repelia a aura de Julianna, agora, fundia-se a ela. As cores começaram a se misturar e a luz ficou ligeiramente mais intensa. De repente, o homem se tremeu e abriu os olhos. Ele se virou para o banco do carona, mas não viu ninguém. Sentiu os pelos dos braços se eriçarem, então, soltou o cinto de segurança, abriu a porta do carro e saiu.

- Eu consegui! Eu consegui! – Julianna comemorou, ainda dentro do carro.

- Calma! – a mulher disse em um tom não tão austero. – Eu percebi. – ela completou com um meio sorriso. – E, então? O que você descobriu?

- Ele está triste porque perdeu o emprego e a mulher foi embora levando os filhos e todo seu dinheiro. – Julianna olhou para o homem fora do carro e voltou-se em seguida. – Ele está pensando em pular da ponte.

- Bem, todos temos o livre arbítrio e essa decisão é responsabilidade dele, mas, você pode dissuadi-lo, o que acha? Quer tentar?

- Eu? – Julianna perguntou surpresa. – Mas por que eu? Não sou qualificada para isso. Estou aqui apenas para aprender a me comunicar.

- Para se qualificar é preciso treinar, não acha? – a mulher disse com simplicidade. – Além do mais, ele não está pedindo ajuda espiritual, porque se estivesse aquela turma não estaria aqui.

Estranhando o comentário, Julianna olhou para fora novamente e assustou-se com o que viu. Três homens, com aparência de bêbados, descalços e trajando roupas sujas, estavam em volta do homem fazendo campanha para que ele pulasse da ponte.

- Quem são? – ela perguntou.

- São arruaceiros, nada mais do que isso. Espere aqui, vou falar com eles! – e mal terminou de dizer isso, a mulher saiu do carro em direção aos três homens maltrapilhos.

Julianna a observava atentamente. Aquela mulher tinha o melhor currículo da Colônia Provisória como instrutora de campo. Ao se aproximar dos homens, ela pediu rispidamente que saíssem dali, mas eles simplesmente trocaram olhares entre si e desataram a rir, imitando-a e debochando dela. Julianna imaginou o quanto de tolerância e paciência era necessário ter nessas situações, mas para sua surpresa, a instrutora retirou um pequeno aparelho do bolso e aplicou um violento choque no homem que lhe estava mais próximo. O sujeito caiu no chão em convulsão, estrebuchando e babando, enquanto os colegas recuavam assustados.

O Portal de Anaya - Livro 2 - Os mundosOnde histórias criam vida. Descubra agora