Incubus

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e tudo terminou em chamas.

Eu fiz uma viagem...

Meses depois, encontrei o Humano Ideal. Iluminado de sol, ele caminhava tranquilo por uma rua qualquer de uma cidadezinha sem importância. Sua aparência era perfeita e a princípio o que me atraiu foi simplesmente isso. Então eu cheguei perto dele e pude escutar o seguinte pensamento — será que eu deveria traí-lo?

Foi aí que eu percebi que minha busca chegara ao fim. Ele era um homem, era um adulto, tinha um físico impecável e um conflito interior que poderia servir de porta para que eu entrasse... Decidi segui-lo. Nas semanas posteriores, observei tudo o que ele fazia, de modo a tentar descobrir o máximo possível a seu respeito. Eu ficava num canto do cômodo, olhando. Ouvia suas conversas, acompanhava-o durante os sonhos. Em pouco tempo entendi tudo o que precisaria fazer para dar início ao processo de possessão.

Meu Humano Ideal atendia pelo nome de Giovanni, ele morava numa rua de paralelepípedos chamada Rua das Flores, e sua casa, localizada no ângulo do quarteirão, era espaçosa e tinha dois andares. O muro em volta dela era coberto de plantas trepadeiras. No quintal, Giovanni cultivava roseiras e árvores frutíferas variadas.

Aparentemente, havia duas pessoas importantes na sua vida, Glauco e Guilherme. Glauco, aos vinte e nove anos, pedira-lhe em casamento e uma década havia se passado desde então. Eles moravam no andar de baixo da casa, enquanto Guilherme ocupava o andar de cima, pagando-lhes uma certa quantia por mês para ali permanecer. Ele viera à cidade para cursar medicina; agora, tinha a idade que Giovanni tivera ao se casar — dezenove anos.

Glauco ficava sempre em casa. Giovanni, por sua vez, trabalhava numa fábrica de iogurte chamada Gulodice. Quando retornava ao lar, às onze da noite, tentava obter algum carinho da parte de Glauco, porém normalmente se frustrava. Já acostumado a essa constante rejeição, embora jamais conformado por completo, ele assistia a filmes de romance sozinho na sala (e quase sempre chorava).

Quando estava de folga era bom, pois Guilherme lhe dava atenção, e a vida, portanto, deixava de ser tão solitária. Um belo dia, ao voltar do trabalho, Giovanni disse ao marido:

— Você se lembra daquela vez na praia quando você me disse para ser sempre sincero contigo?

— Sim, é claro que eu me lembro — Glauco respondeu. — Para mim a sinceridade é de suma importância. Você sabe disso.

— Às vezes eu escondo certas coisas por medo de te magoar.

— É melhor sofrer por conta de uma verdade dolorosa do que ser feliz na ilusão, você não acha?

— Não sei...

— Pode se abrir comigo. Eu juro que vou tentar entender.

— Eu ando sentindo desejos por outra pessoa.

— Tudo bem. Isso é normal. Mesmo a gente amando alguém, outros chamarão nossa atenção. Tem tanta gente bonita e interessante nesse mundo. Não é um crime sentir desejo por outra pessoa além de mim. O que você não pode é alimentar esse desejo.

— É... você tem razão. Então você não se importa? Algumas vezes eu me sinto culpado de estar com você e estar pensando em outro.

— Não precisa sentir essa culpa. Você vai superar isso. Com o tempo vai passar... Você me ama, não é?

— Sim, eu te amo mais que tudo.

— Então continue agindo dessa forma e me terá sempre por perto. De você eu só peço que por favor não me engane.

— Eu sentia como se eu estivesse te enganando...

— Mas não está. Você teve coragem de vir até mim e me contar isso. Eu te respeito por essa atitude.

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