Tropicália II

12 0 0
                                    

O Jônatas falou pra sapatona trazer mais uma cerveja. Nisso a mocinha de voz doce começou a cantar de novo, dessa vez Calypso, aquela música que fala que pro cara conquistar ele tem que dançar e balançar e rebolar.

Alguém ligou pro Jônatas.

Ele pediu licença e me deixou sozinho na mesa.

Daqui a pouco vem a sapatona com a nossa Bhrama.

Ela encheu nossos copos e eu disse: obrigado, meu bem. Ela: nada! Falei: será que cê podia trazer de novo o catálogo? Ela: claro, num minuto eu trago. Mas deu tempo de eu fumar um cigarro quase inteiro antes de ela se lembrar do que me prometera. Não podia culpá-la, coitada, o boteco estava lotado.

Revirei aquelas folhas plastificadas em busca de algo que pudesse cantar junto com o Jônatas, porque o efeito da bebida já começara a enfraquecer e com isso a coragem de cantar sozinho foi-se totalmente.

Voltou o Jônatas e eu falei: canta comigo? Ele: canto, querido. Eu: pode ser Gusttavo Lima? Ele: qual? Eu: Nossa Preferida Sertaneja. Ele: aí sim, hein?

E lá fomos nós desafinar no videokê.

Ao retornarmos à mesa, perguntei quem era no telefone. Ele:

— Carlinha enchendo o saco de novo.

Balançou a cabeça, bebericou a cerveja, ficou pensativo. Então repetiu a pergunta de vinte minutos atrás:

— Será que o Orlando ainda vai demorar muito?

Dei a mesma resposta:

— Não sei.

O Jônatas:

— Vai ver parou pra tirar foto com a galera, né?

Falei:

— É. Pode ser.

Ele bebeu mais. Bebi também, um gole generoso.

Avisei que ia mijar, levantei e fui, passando pela mulher da voz melosa que agora cantava uma música dum tal vaqueiro peão que lhe tinha roubado o coração ou qualquer coisa assim.

No banheiro, olhei no espelho e vi que estava até bonito apesar da cara de bêbado. O chapéu country cor-de-rosa fora uma escolha certeira de furto: fazia com que eu me sentisse menos hétero com meu novo cabelo raspado na máquina quatro.

Aproveitando a quietude ou quase isso que imperava no cubículo, liguei pro Abel dizendo que o churrasco de aniversário do Silas ainda ia demorar um pouquinho, que era melhor eles pedirem uma pizza, pois não teria como eu chegar a tempo de fazer janta. Ele só disse: tá.

Voltei pra mesa.

O Jônatas:

— Cê tem certeza que foi nesse bar que ele combinou contigo?

Falei:

— Lógico. Tá vendo outro bar por aí?

— Num sei. Vai ver ele foi pra alguma rua mais pra lá.

— Não. Era esse. Eu tenho certeza. — E passado um tempo: — Olha, Jônatas, se você quiser, você pode ir pra casa. Eu não ligo de esperar ele aqui sozinho.

Balançando a cabeça, ele:

— Não. Não vou te deixar aqui sozinho. Mó risca faca essa festa.

Eu:

— Ah, para. Foi até maneira.

Ele fez um sinal de que tinha sido mediana, no máximo.

Acendi outro cigarro, dizendo:

INCUBUSOnde histórias criam vida. Descubra agora